POLÍTICA
Inteligência que dá medo
Condenado a mais de 15 anos de cadeia, o ex-deputado Eduardo Cunha volta a assustar. Não porque tenha poder de fogo – é carta fora do baralho, teria dificuldades até mesmo para firmar um acordo de delação premiada --, mas pelo teor da sentença que o condenou. A peça confronta a sofisticação dos crimes cometidos com os avançados padrões de inteligência para rastreá-los, com indiscutível vitória da investigação.
A leitura da sentença é didática. Em 536 tópicos, 109 páginas, o juiz Sérgio Moro resume as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, realizadas com apoio da Suíça, indicando cada um dos documentos comprobatórios da acusação.
A remessa para Cunha de dinheiro originário da compra, pela Petrobras, de um campo de exploração em Benin, na África, feita em parceria com uma empresa sem qualquer expertise no setor e muito menos fundos, e que não produziu uma única gota de óleo. O cruzamento entre contas bancárias oficiais e não declaradas mantidas no exterior com cartões de crédito e de compras, de depoimentos, telefonemas, contas de terceiros citados pela defesa do ex-deputado, dados da Receita Federal. Tudo ali unido, pontos e pontas.
Provas fartas, difíceis de serem rebatidas. Desmoronamento de falsos álibis e das teses de nulidade pretendidas pela defesa, a maior parte delas, como Moro faz questão de citar, negada pelo então relator da Lava-Jato no Supremo, ministro Teori Zavascki, morto há pouco mais de dois meses.
A sentença mete medo porque não há acusação sem prova. Nem mesmo apoio na tese de domínio de fato, tão contestada na época do mensalão. Não se embasa em relatos de delatores (embora os use para corroborar os delitos), mas em documentos, extratos, assinaturas.
E como os investigadores e a origem dos delitos são os mesmos, fica claro que também será assim no Supremo para aqueles que gozam de privilégio de foro.
Ainda que já tivessem sido alertados para o requinte que as investigações adquiriram, políticos enrolados com a Lava-Jato aparentemente continuavam sem crer nisso. Especialmente os que passaram ao largo do mensalão, processo restrito à instâncias superiores, sem a montagem de uma equipe especial de primeiro grau para as apurações. Na época, também não se viu colaboração internacional do porte da que se tem hoje.
Tanto é assim que a roubalheira não cessou pós-mensalão. Como as penas mais severas recaíram para os operadores do esquema e não para os políticos, imaginava-se que mesmo diante de um escândalo de maiores proporções valeriam as regras da impunidade e da incapacidade de a investigação produzir provas.