Laranja do hotel que emprega Dirceu foi ‘sócio’ do irmão de Rafael Correa
Josias de Souza
Até a noite passada, imaginava-se que o empregador do presidiário José Dirceu fosse Paulo Masci de Abreu. Era ele quem aparecia no noticiário como proprietário do hotel Saint Peter, que contratou o condenado mais ilustre do mensalão como gerente administrativo, com salário mensal de R$ 20 mil. Em notícia veiculada na TV Globo, o repórter Vladimir Netto mostrou que a coisa não é bem assim.
Descobriu-se que, no papel, Paulo de Abreu é sócio minoritário do negócio. Possui uma mísera cota, no valor de R$ 1. Todas as cotas restantes, num total de R$ 499 mil, pertencem à empresa panamenha Truston International Inc.. É presidida por um ‘laranja’: José Eugenio Silva Ritter. O repórter localizou-o na cidade do Panamá. Mora num bairro pobre. Trabalha como auxiliar de um escritório de advocacia.
O blog descobriu que o ‘laranja’ José Eugenio Silva Ritter é personagem de outro caso rumoroso ocorrido no Equador. Envolve Fabricio Correa, irmão mais velho do presidente equatoriano Rafael Correa. Dono de uma construtora, ele foi acusado em 2009 de firmar com o governo contratos de mais de US$ 150 milhões. Algo que a lei o proibia de fazer, em função do seu parentesco com o presidente.
Acossado pelo notíciario, o presidente Rafael Correa mandou cancelar os contratos, tomou distância do irmão e abriu guerra contra o pedaço da imprensa que o acusava de ter conhecimento prévio dos negócios de Fabricio. A construtora que firmou os contratos suspeitos chama-se Cosurca. O nome de Fabricio Correa não aparecia como sócio. A Procuradoria do Equador esquadrinhou a composição societária.
Descobriu que a Cosurca tinha como acionista majoritário a firma panamenha International Energy Overseas Corporation (IEOC). A exemplo do que sucedeu com a Truston International Inc., dona do Hotel Saint Peter, também a IEOC está inscrita no Registro Público do Panamá em nome de José Eugenio Silva Ritter.
Ao lado do “laranja” José Ritter, aparece na papelada da IEOC o nome de Dianeth Isabel Matos de Ospino. Na inscrição panamenha da Truston, pseudocontroladora do hotel que empregou Dirceu, também está anotado o nome de uma Dianeth Ospino, identificada como “secretária”.
As conclusões da Procuradoria do Equador foram expostas numa reportagem de junho de 2010, veiculada no diário El Comercio. Verificou-se que a IEOC tinha como verdadeiro acionista majoritário outra firma panamenha chamada Megamaq, que por sua vez era controlada pela equatoriana Helptec, de propriedade de Fabricio Correa. Para os investigadores, o irmão do presidente promovera uma simulação societária para burlar a lei que o proibia de firmar contratos com o governo.
No caso do hotel companheiro de Brasília, ainda não há clareza quanto às razões que levaram o amigo do PT Paulo Masci Abreu a usar o “laranja” panamenho José Ritter. De concreto, por ora, apenas a impressão de que José Dirceu desenvolveu uma estranha vocação para meter-se em episódios esquisitos.
Após manusear o contrato social no qual Paulo Abreu figura como dono de uma cota de R$ 1, o repórter Vladimir Netto o procurou. Foi atendido pelo telefone. Eis o extrato da conversa:
— Quem é o seu sócio majoritário?
— É a Truston. É uma empresa que investe em hotéis.
— Quem é o dono da Truston?
— Ah, tem vários acionistas. Precisa ver, até porque as ações são vendidas constantemente, né?.
— Quem é José Eugenio Silva Ritter?
— É o presidente.
— Mas vocês o conhecem?
— Uma vez nós já estivemos em reunião.
— Ele veio ao Brasil, Dr. Paulo?
— Não, eu estive lá em Miami.
— Isso foi quando? Foi quando os senhores resolveram fazer uma sociedade para administrar o St. Peter?
— É, quando formalizamos a parceria. De lá pra cá, a gente manda as informações para lá e ele se dá por satisfeito, enfim, ou pergunta alguma coisa, mas houve essa reunião em Miami quando da formalização do entendimento.
O repórter viajou à Cidade do Panamá. Encontrou Jose Eugenio Silva Ritter, o pseudopresidente da empresa que controla o Saint Peter, numa residência simples de um bairro da periferia da capital panamenha. Ele estava na frente do imóvel, lavando o carro. Sem saber que estava sendo filmado, trocou um dedo de prosa com o visitante.
— Você é José Eugenio Silva Ritter?
— Correto.
Ele contou que trabalha há trinta anos num escritório de advocacia chamado Morgan y Morgan. Admitiu ser “sócio” de muitas empresas (mais de mil, segundo a notícia da Globo).
— Sim, sim, de várias empresas, correto.
— Várias empresas. Por que isso?
— Porque eu trabalho na Morgan y Morgan e eles se dedicam a isso.
O repórter pergunta sobre a Truston International Inc, a suposta dona do Hotel Saint Peter.
— Eu sequer sei se é o nome de uma sociedade de várias pessoas. Você, por favor, vá lá na Morgan y Morgan, com um advogado, aí eu posso lhe dar a informação de que você precisa. Se me autorizarem, se puder falar, lhe dar as respostas. Porque pode botar em perigo meu emprego.
O entrevistador tenta engatar novas indagações. Espremido, o “laranja” dá a conversa por encerrada: “Você não está entendendo, eu quis ser amável. É melhor lá no escritório. Tudo que você quiser é lá no escritório. Procurada, a Morgan y Morgan, firma que se dedica a abrir empresas no Panamá, não se dispôs a receber o jornalista.
Encerrada a reportagem, o apresentador Willian Bonner informou que Rosane Ribeiro, advogada de Paulo Masci de Abreu, contactara a emissora para fazer duas revelações: 1) a sócia majoritária da Truston International Inc é a nora dele, a empresária Lara Severino Vargas. 2) nesta segunda-feira, véspera da exibição da notícia, a nora vendera o controle acionário do Saint Peter para o sogro Paulo Masci Abreu.
Preso na Penitenciária da Papuda, José Dirceu depende de autorização da Vara de Execuções Penais de Brasília para deixar a cadeia durante o dia e bater ponto no Saint Peter. Resta saber se, diante de tantas e surpreendentes novidades, a Justiça se animará a submeter o detento a um ambiente de trabalho tão, digamos, insalubre
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