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sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

História de Amor e Ódio, mais Inveja... os eternos protagonistas da História...!



GERAL

Por que Wirsung foi assassinado?

por ALFREDO GUARISCHI
Operação (Foto: Alfredo Guarischi)
Acabo de operar um grande amigo. Foram muitas horas para retirar um grande tumor da cabeça do pâncreas e junto remover todo o duodeno, parte do estômago e do canal biliar, religando todos no final, “quase” como eram antes... A junção do pâncreas ao intestino é a mais complexa de todas. É como juntar um cano de cobre a um de plástico.
Meu amigo já está em casa, sem drenos e comendo bem.
Realizo muitas dessas cirurgias, mas não posso negar meus pensamentos nas longas horas em silêncio e meditação, entre os ruídos dos monitores e trabalho em equipe, nessa especial cirurgia.
Durante a junção do canal principal do pâncreas - canal de Wirsung - ao intestino, me veio a lembrança dos meus anos como professor de anatomia na UFRJ.
O canal leva o nome de seu descobridor, Johann Georg Wirsung, nascido na Bavária, Alemanha, em 1589. Esse irrequieto alemão especializou-se em anatomia com Jean Riolan, em Paris. Posteriormente, foi para Pádua, Itália, onde se formou em medicina em 1630, sendo logo convidado para trabalhar como dissector de cadáveres com o professor Johannes Wesling, vivendo uma relação conflituosa com seu famoso chefe.
Em 2 de março de 1642, uma segunda-feira, dissecando o cadáver de Zuane Badia, um criminoso de 30 anos de idade que havia sido enforcado no dia anterior, Wirsung se deparou com um canal que atravessava o pâncreas de um extremo ao outro (da cabeça à cauda) e que não havia sido descrito anteriormente. Assistiam a dissecção realizada no Hospital San Francesco dois estudantes: Thomas Bartholin e Moritz Hoffman.
Percebeu ter feito uma importante descoberta, mas, sem saber a função do canal pancreático, talvez por isso hesitasse publicar o fato em uma revista científica. Esculpiu secretamente o pâncreas com seu canal dissecado com detalhes técnicos em uma placa de cobre, que ainda pode ser vista no Palácio de Bo, em Pádua. Esse modelo serviu para imprimir sete desenhos que enviou a eminentes anatomistas da França, da Dinamarca, da Itália e da Alemanha, pedindo opinião sobre o significado de seu achado e assegurando, dessa forma, seu pioneirismo. Nunca recebeu o merecido reconhecimento em vida, talvez por não ter sido um professor, porém, com habilidade, por 14 anos dissecou e preparou cadáveres para serem utilizados em aulas administradas por professores eminentes.
Na noite de 22 de agosto de 1643, um sábado, na tradicional hora de cantar “Ave Maria”, Wirsung conversava amistosamente com outros vizinhos, no alojamento onde viviam próximo à Basílica de Santo Antônio, quando foi perseguido por três agressores e atingido por um tiro de escopeta disparado com requintes de ódio pelo médico belga Jacobus Cambier, que estava em companhia de Nicaise Cambier e um estudante de medicina nunca identificado. Morreu sangrando, denunciando o nome de seu assassino. Os agressores fugiram de Pádua.
A cirurgia do pâncreas continua sendo um grande desafio, e a história de Wirsung, um grande mistério.

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