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terça-feira, 28 de março de 2017

"Compram-se leis e governos" ... / José Casado

José Casado: 

Compram-se leis e governos

Marcelo Odebrecht pagou R$ 50 milhões pelo ‘Refis da Crise’, obra de Lula. Quatro anos depois, repassou a propina à campanha da chapa Dilma-Temer

Publicado no Globo
Na manhã de segunda-feira 31 de março de 2014, o empresário Marcelo Odebrecht recebeu uma planilha financeira organizada por Hilberto da Silva, chefe do Departamento de Operações Estruturadas da empreiteira.
Calvo, dono de um sorriso que lhe repuxa o olho direito, Hilberto era o terceiro a comandar um dos mais antigos núcleos operacionais da construtora, o de pagamento de propinas. Norberto, fundador e avô de Marcelo, tivera a assessoria de Benedito da Luz. Emílio, o pai, nomeara Antonio Ferreira. Marcelo, o herdeiro, assumiu em 2006, escolheu Hilberto e pôs a unidade no organograma do grupo, disfarçada como “Operações Estruturadas”. Conferiu a planilha: restavam R$ 50 milhões na conta, desde 2010. Só ele sabia a origem e o destino daquele dinheiro. Depois de quatro anos adormecido no caixa paralelo, chegara a hora de repassá-lo à campanha de reeleição da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer.
“O que eu acho que contamina a campanha de 2014 é esse dinheiro do Refis”, ele disse em depoimento no Tribunal Superior Eleitoral, no último 1º de março. “Esse, sim, foi uma contrapartida específica”, acrescentou.
Por trás da propina de R$ 50 milhões à campanha Dilma-Temer, segundo Marcelo, está a história da compra de uma medida provisória (nº 470, ou “Refis da Crise”) no fim do governo Lula.
Era 2009. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, negociava com empresas devedoras da Receita e da Previdência Social. “Eu sei que, no meio dessa discussão de 2009, aí, sim, nesse caso específico, o Guido me fez uma solicitação, de que tinha uma expectativa de 50 milhões para a campanha de 2010 dela, tá?” — relatou Marcelo, em juízo. “Foi o único pedido, digamos assim, de contrapartida específica que o Guido me fez, no contexto de uma negociação, tá?” A MP chegou ao Congresso com 61 artigos. De lá saiu com 140. O juiz quis saber se a expectativa fora atendida já na medida provisória ou, depois, no Congresso. Marcelo explicou: “As coisas nunca são atendidas prontamente. Na verdade, uma parte se consegue via governo. Depois você tenta incluir algumas emendas, aí, a Fazenda acaba vetando algumas, então, é o que se consegue. A gente conseguiu algo que era pelo menos razoável para a gente”. Lula sancionou o “Refis da Crise” em janeiro de 2010. Reduziu em até 75% nas dívidas acumuladas com a Receita e o INSS, deu 15 anos para pagamento do saldo e anistiou as multas. Premiou os devedores, tradicionais financiadores de campanhas. Puniu quem pagava em dia seus tributos.
A “contrapartida específica” de R$ 50 milhões não foi usada na eleição de 2010. Ficou na “conta-corrente do governo” — definições do próprio Marcelo —, no setor de propinas. Em março de 2014, quando acabava o mensalão, e começava a Lava Jato, ele resolveu aumentar a aposta: aos R$ 50 milhões pelo “Refis da Crise”, acrescentou R$ 100 milhões. Megalômano, passou a se achar “o inventor” da reeleição de Dilma-Temer, como disse em juízo.
Habituara-se a comprar leis e governantes, transferindo os custos aos contratos da Odebrecht com o setor público — os brasileiros pagaram várias vezes a mesma conta. Até hoje, ninguém se preocupou em construir mecanismos institucionais para impedir a captura do Executivo e do Legislativo pela iniciativa privada, como Marcelo e outros fizeram.

O Brasil está na UTI e a junta médica não quer revelar a doença...


José Nêumanne: Golpes em marcha 

Lista na eleição evita que cidadão puna políticos e autoanistia os deixa livres para cometer crimes 

Publicado no Estadão
Ninguém ouviu, mas ao longo de todo o domingo passado um grande suspiro de alívio percorreu o Brasil do Oiapoque ao Chuí, com uma parada significativa em Brasília, capital federal. Todos os políticos com algum mandato no Legislativo ou no Executivo, federal, estadual ou municipal, comemoraram secretamente, sem ousar sequer aparentar felicidade nem na intimidade da alcova, à hora de se recolher ao tálamo, a outonal ausência da cidadania nas ruas mais importantes das maiores cidades brasileiras. Para evitar os mais descarados golpes da História desde a Independência ─ a manutenção da prerrogativa de foro, a autoanistia no uso de caixa 2 e, acima de tudo e de todos, a lista fechada dos candidatos nas eleições – o povo não se mobilizou, como o fizera antes para protestar contra o Brasil oficial em 2013 e pelo impeachment de Dilma em 2015 e 2016.
Em 2013, assim que o povo voltou pra casa e os black blocs pararam de depredar o patrimônio alheio, público ou privado, Dilma Rousseff anunciou as decisões com que fingiu atender ao clamor das ruas roucas: Assembleia Constituinte exclusiva para a reforma política e financiamento público de campanhas eleitorais. Nunca a estupidez pessoal de um ser humano (o que ela pelo menos aparenta ser) desserviu a tantos semelhantes de uma vez só. Em 2016 o Congresso Nacional a depôs por outros crimes, fingindo atender ao mesmo clamor. Mentira! Os congressistas depuseram a “presidenta” porque não suportavam o desprezo e a indiferença com que ela os maltratava, usando o poder para humilhá-los, mesmo ao custo de perdê-lo. Isso ficou claro quando foi revelada a senha do movimento tido como golpista pelos depostos com ela: “Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria”. A sentença consagrou o autor como o frasista preferencial de todos os governos, Romero Jucá, pernambucano, senador por Roraima, militante do PMDB e serviçal de todos os presidentes – de Fernando Henrique, do PSDB, a Lula e Dilma, do PT.
O ilustre prócer, atualmente na presidência do maior partido do País, o PMDB, posseiro dos maiores postos do Legislativo e do Executivo da República, o nominado Caju da lista de propinas da Odebrecht, também não teve pejo de reclamar quando tentaram limitar o foro privilegiado. Definiu o privilégio como “suruba seletiva” e exigiu que dela todos participassem. Todos os políticos, os mandatários, os poderosos do regime, naturalmente. Como a anistia reclamada pela oposição para avalizar a abertura democrática da ditadura de Geisel e Figueiredo: “ampla, geral e irrestrita”. A metáfora indecorosa da República indecente, contudo, nunca será mais pornográfica do que a prática republicana da venda por facilidades financeiras para ultrapassar as dificuldades do decoro político.
As extraordinárias circunstâncias que permitiram, primeiro, a Ação Penal 470, vulgo mensalão, e, depois, a Operação Lava Jato, dita petrolão, terminaram por quebrar um ancestral paradigma do Brasil dos coronéis e dos titãs populistas, aquele segundo o qual só iam para a cadeia pretos, pobres e prostitutas. Frequentam os cárceres da “república de Curitiba” vários dos mais ricos empreiteiros pátrios, inclusive o maioral de todos, Marcelo Odebrecht, e alguns “heróis do povo brasileiro”, que assaltaram bancos para financiar a guerrilha e, depois, saquearam o Estado inteiro, sem exceção de cofre, por poder, fortuna e conforto. No entanto, ainda não foi quebrada a barreira estabelecida por Artur Bernardes na Primeira República: “aos amigos, tudo; aos inimigos, o rigor da lei”. Com uma adaptação: “aos mandatários, tudo; aos sem-mandato, a lei mais rigorosa”. Preso, Marcelo Odebrecht contou que comprou Lula e Dilma e deles obteve tudo o que precisava para prosperar mais do que os outros, aceitando, é claro, a companhia do cartel. Mas, pelo menos até agora, nenhum detentor de mandato de poder republicano paga por seus delitos. A exceção à regra é, claro, Eduardo Cunha, que ousou cuspir na cruz.
No impeachment de Dilma Rousseff, o verdadeiro golpe foi dado, cinicamente, por Renan Calheiros e Ricardo Lewandowski: o fatiamento do artigo constitucional que a privaria de direitos políticos para que pudesse ser merendeira de escola. O que, aliás, representaria grave risco para a saúde da infância e da juventude do Brasil. Depois do “só se for a pau, Juvenal”, miríades de golpes se sucederam contra a Carta que, de tão vilipendiada, pode ser chamada de minima minimorum, em vez de Máxima. Foi o caso da permissão para Renan Calheiros delinquir presidindo o Senado desde que saísse da “linha sucessória”, que, aliás, nem existe, pois não há sucessor definido do vice que assumiu a Presidência. Quem quer que o substitua terá de convocar eleição indireta para ocupar o lugar. E também foi permitido ao vassalo Rodrigo Maia reeleger-se presidente da Câmara no meio da legislatura. Mais um escárnio na conta!
Tudo, porém, é café pequeno para o que se anuncia nesta algaravia de todo dia. Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), já deu a deixa para a cassação da chapa Dilma-Temer sem criar atropelos à gestão federal. Cassa-se a chapa, decreta-se a inelegibilidade da titular e permite-se ao reserva que fique em campo. Ou seja, autorizar-se-lo-á (mesóclise dupla em homenagem a sua volúpia pelo fracionamento de verbos) a disputar (e vencer) a indireta para suceder-se a si mesmo no Congresso Nacional, que tantas alegrias lhe tem propiciado.
Isso ainda é lana caprina comparado ao que os parlamentares se reservam em matéria de prêmio de consolação por terem sido delatados. Conseguiram beneplácito dos “datas vênias” da STF (Suprema Tolerância Federal) para desprezar a igualdade de todos perante a lei e decretar que caixa 2 é crime para empresários, mas não para políticos.
Ressuscitaram o projeto de Dilma do financiamento público de campanhas eleitorais para mantê-las com seus custos proibitivos, o que, definitivamente, não é uma tradição da República, por mais insana que ela já tenha sido antes. E, para completar, escolheram dois capitães do mato do Conselheiro de Caetés para levantar muros da vergonha no “parlamanto”. Wadih Damous (PT-RJ), jurisconsulto particular do ex-deus, batalha para excluir os presos da possibilidade de serem premiados ao delatar, desfigurando norma legal adotada pelo Brasil oficial no rastro do resto do mundo. E Vicente Cândido (PT-SP), relator da tal “reforma política”, apareceu com a teoria de que lista fechada de candidatos a cargos no Legislativo em eleições proporcionais (não distritais) é usada em “80%” (o cálculo é dele) dos países democráticos do mundo.
Lembro-me bem – se me lembro!  de ter acompanhado eleições com listas em que os maiorais da elite política compunham o congresso do país a seu bel prazer e proveito. O social-democrata AD de Rómulo Gallegos dividia o butim com a democracia cristã da Copei de Rafael Caldera. O pobre povo amontoado nas favelas de Caracas a caminho do aeroporto de Maiquetia pisou na balança e dessa divisão subiram Hugo Chávez e seu sucessor Nicolás Maduro. A lista fechada foi a ditadura da elite política a caminho da tirania metida a socialista dos bolivarianos da Venezuela.

Humor de Chico Caruso... / "Até aqui tudo bem !

A charge de Chico Caruso

Charge (Foto: Chico Caruso)

segunda-feira, 27 de março de 2017

UM DISCURSO TÃO BREVE QUANTO MEMORÁVEL NA FORMA E NO CONTEÚDO


https://youtu.be/Y3iASt0p6SU

"Bombeiro salva cachorro em incêndio com respiração boca a boca"

http://www.caesonline.com/bombeiro-salva-cachorro-em-incendio-com-respiracao-boa-boca/




Bombeiro salva cachorro em incêndio com respiração boca a boca

Manobras cardíacas também foram feitas por um bombeiro, fundamentais para salvar a vida de Marley.


Andrew Klein, um bombeiro de Santa Mônica nos EUA, já pode ser chamado de herói. Graças a ele, o cãozinho Marley está vivo.
O fato ocorreu no dia 21/03/17. O prédio que Marley morava com sua família começou a pegar fogo. Billy Fernando, fotógrafo, estava passando de carro pelo local quando se defrontou com a cena. O homem, então, passou a registrar os acontecimentos com sua câmera fotográfica.
Billy conta que de repente viu Andrew correndo em direção à calçada trazendo algo nos braços. No início ele não se deu conta do que era, até perceber ser um cãozinho. Marley estava inconsciente, mole e sem se mover.
O quadro era aterrador.
Andrew não perdeu tempo e colocou uma máscara de oxigênio especial para cães para tentar salvá-lo. Porém, isto não foi suficiente e o bombeiro passou a realizar manobras cardíacas e até mesmo fazer respiração boca a boca para tentar salvar Marley.
A dona do cão assistia a tudo, apavorada, pois todas as tentativas se mostravam inúteis. Andrew, contudo, apesar do cansaço, não estava nem um pouco disposto a desistir.
Foram vinte minutos de uma luta exaustiva pela vida de Marley. Até que, surpreendentemente, o cãozinho começou a se mexer.
Billy, o fotógrafo, conta que o alívio foi grande para todos. Marley ressuscitou justo no momento em que todos esperavam pelo pior. O cão foi se recuperando devagar, meio desorientado, mas aparentando estar bem.
A dona de Marley chorou bastante de emoção, diz Billy, e agradeceu muito a Andrew. O fotógrafo acrescenta que os bombeiros, que já eram um modelo para ele, agora também são objeto de admiração profunda.
Marley foi encaminhado a uma clínica veterinária para maiores cuidados. Ainda não se sabe o motivo do incêndio.  Ninguém se feriu.
O cãozinho, depois de recuperado, foi levado ao Corpo de Bombeiros para um agradecimento muito especial a Andrew e seus colegas.

domingo, 26 de março de 2017

Fugindo de sua realidade. / El País..

Lanchas abarrotadas: As novas cruzadas dos imigrantes da América Central rumo aos EUA http://flip.it/-Skxoj

Lanchas abarrotadas: As novas cruzadas dos imigrantes da América Central rumo aos EUA

Todos os dias dezenas de migrantes e refugiados se lançam na costa do México em lanchas diante da pressão na rota migratória por terra


Barcos em Barra de San José, Mazatán, Chiapas. ENCARNI PINDADO
Ocós (Guatemala) 
“Que paguem os 8.000 pesos (400 dólares) e pronto”, determina o atravessador através de uma mensagem de áudio no WhatsApp.
“E se eles tiverem medo (...), que paguem para você. Se não, manda eles rodeando (por terra) e vai ser melhor para você”, sentencia, em uma segunda mensagem.


A primeira conclusão é que, pelo tom utilizado, está claro quem é que manda. A segunda é que no negócio do tráfico de pessoas, não se barganha. Os preços são determinados pelo atravessador. Ponto final.
A cada ano transitam pelo México 400.000 migrantes e refugiados, principalmente da América Central, com menos de 60 dólares no bolso, que participam de um êxodo silencioso em direção aos Estados Unidos.
Uma parte utiliza o trem de carga conhecido como La Bestia. No entanto, há cada vez menos migrantes que se arriscam a subir no trem desde que o Governo mexicano, em uma peculiar medida humanitária, obrigou a aumentar a velocidade de 30 para 60 km/h, o que aumenta o risco de sofrer uma mutilação quando se tenta saltar sobre o trem.
Centenas deles encontraram uma alternativa na nova Bestia do mar. Lanchas abarrotadas de gente que passam diariamente ao longo da costa de Chiapas rumo ao norte.
O perigoso município de Ocós, na Guatemala, e a paradisíaca Mazatán, na costa de Chiapas, são os epicentros de uma indústria de migrantes que sai da Guatemala, passa pelo Istmo de Tehuantepec em direção a Veracruz e termina como mercadoria amedrontada em Tamaulipas, na fronteira com os Estados Unidos.


Pescadores em uma praia fronteiriça entre o México e a Guatemala
Pescadores em uma praia fronteiriça entre o México e a Guatemala ENCARNI PINDADO


“Por aqui saem ou passam umas três ou quatro lanchas por dia, com 15 ou 20 pollos [gíria para definir os migrantes] cada uma”, confirma Gabriel Ortega, vereador e mão direita do prefeito de Mazatán.
Salvadorenhos, hondurenhos e guatemaltecos fogem da pobreza e da violência das gangues por uma das tradicionais rotas do narcotráfico utilizando as velhas lanchas de pesca, agora com novos motores Yamaha.
Sentado em uma rede junto ao píer de San José, a poucos quilômetros de Mazatán (Chiapas), outro atravessador, hoje aposentado, faz uma pausa, ajusta o boné de beisebol, e recorda aquele dia de 2000, quando El Pelón, um conhecido seu, deixou se afogarem no mar 14 pessoas porque não queriam pagar, em uma das maiores tragédias de que se tem memória na região.
“Aqui são muitos os que vivem disso e já há alguns pescadores presos”, explica, enquanto balança na rede. O pescador sem dentes que durante tantos anos se dedicou a transportar os imigrantes da América Central, diz que o tráfico de pessoas é uma alternativa à pesca de mariscos ou camarão “porque o mar já não dá”.
Há nove meses, em frente ao mesmo cais onde bebe uma cerveja Victoria depois da outra, três crianças morreram quando uma lancha que levava 20 pessoas virou.


Lanchas abarrotadas: As novas cruzadas dos imigrantes da América Central rumo aos EUA
EL PAÍS


Apesar de não haver números de vítimas ou de migrantes que viajam clandestinamente à noite por mar, trata-se de uma rota cada vez mais frequente diante da pressão em terra e o aumento das detenções e deportações. No ano passado, os Estados Unidos deportaram 96.000 desses migrantes, em comparação aos 147.000 do México, segundo dados oficiais.
“A rota permanecia oculta e era usada para o tráfico de drogas, mas nos últimos meses, se sistematizou como uma rota para transportar pessoas”, explica José Luis González, sacerdote jesuíta que trabalha com refugiados em Frontera Comalapa.
Por uma quantidade que varia entre 400 e 800 dólares – para os cubanos pode ser o dobro – essa rota permite aos imigrantes da América Central avançar da Guatemala até Salina Cruz ou Huatulco, em Oaxaca.
Assim evitam os seis controles migratórios mais duros do país, parte do cinturão policial que o Governo mexicano mobilizou no sul do país como parte do Plano Fronteira Sul, parcialmente financiado pelos Estados Unidos.

Ocós, território Zeta

Depois de várias voltas intimidadoras com a moto, finalmente o jovem com uma camiseta do Barcelona se aproxima. “Querem lancha para o norte”, pergunta. “Procurem por dona Beti. Ali, ela arruma lugar para vocês”, responde, apontando para um hotel miserável no fim da rua.
Ocós, na Guatemala, onde começa a indústria marítima do tráfico de migrantes, é um município limpo de 40.000 habitantes no Departamento de San Marcos.
Aparentemente é um aprazível destino de férias com uma rua principal que desemboca em uma praia espetacular.
É também um dos pontos estratégicos do cartel dos Zetas para a saída de drogas da América Central e para o abastecimento de embarcações com cocaína da Colômbia, um dos corredores mais importantes do narcotráfico mundial.


Embarcações em Barra de San José, Mazatán, Chiapas
Embarcações em Barra de San José, Mazatán, Chiapas JACOBO GARCÍA


Os Zetas não deixaram escapar um de seus negócios mais rentáveis, o tráfico de pessoas, e controlam uma cadeia completa de uma rota que começa nestas praias.
Mas não. A orgulhosa mulher não é fácil. Olha os jornalistas, desconfia e responde de novo: “Eu já disse, nós não fazemos isso”.
Três pessoas diferentes nos mandaram para ela para fazer a viagem por mar, mas ela está desconfiada. “Meu irmão é pescador e não se mete nessas coisas”. “E neste hotel nem sequer permito que se hospede quem não seja do México ou da Guatemala”, afirma, apontando para uma placa. Mas as pessoas de sua cidade acham outra coisa.
Nesta espelunca os migrantes da América Central – e também aqueles conhecidos como “exóticos”, asiáticos e africanos – esperam vários dias até que se formem os grupos de 15 para empreender a rota.
A travessia dura de seis a oito horas.
Na popa há dois motores de 120 cavalos. Na proa, 500 litros de gasolina em galões, e sobre os bancos, 20 migrantes atemorizados e curvados sobre um pneu semivazio que poderia servir de boia, cruzando o Pacífico à noite sobre enormes ondas prateadas.
“Essa gente sofre”, diz o miserável atravessador sem dentes e sem escrúpulos, olhando para o ponto na água onde as três crianças se afogaram em junho.
Os jornais daquele dia lembram que quando a polícia chegou ao local, encontrou um pai ajoelhado, chorando junto aos corpos de seus filhos. O resto da tripulação escapou por um matagal quando pisou a terra firme, e seguiu caminho para os Estados Unidos. Pobres traficados por pobres no sul de Chiapas.