Postagem em destaque

"O MAL sempre esteve a serviço do BEM "

Rasgando o Verbo. Todos de uma certa forma foram avisados sobre o Apocalipse e que ele não representaria o fim do mundo, mas o fim de uma Er...

Mostrando postagens com marcador J R Guzzo. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador J R Guzzo. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 22 de abril de 2016

“Por que, no fim de todas as contas, deu nisso?” ? J R Guzzo / Veja


2/04/2016
 às 13:10 \ Opinião

J. R. Guzzo: Troca de baralho

Publicado na versão impressa de VEJA
Uma das perguntas preferidas, entre tantas que são feitas em momentos de desastre, é: “Por que, no fim de todas as contas, deu nisso?”. Há pelo menos umas boas 25 opções de resposta para explicar a liquidação da presidente Dilma Rousseff e seu governo, colocados agora na reta final com a decisão da Câmara dos Deputados. De todas as respostas possíveis, uma das mais acertadas está provavelmente entre as mais simples: ao longo de toda a sua agonia, Dilma jamais conseguiu se defender com coerência das acusações que recebeu. Em vez de buscar ajuda nos fatos para fazer sua defesa, foi procurar salvação numa frase de palanque: “Impeachment é golpe”. O resultado concreto desse esforço foi a derrota que acaba de sofrer no plenário da Câmara. Seu grito de combate convenceu os que não precisavam ser convencidos de nada, e que são os mesmos de sempre ─ intelectuais etc., mais os “movimentos sociais” que vivem de dinheiro público e movimentam basicamente a si próprios. Mas não convenceu a única plateia que interessava, por ser a única capaz de resolver o seu problema: os deputados federais brasileiros. Fim da conversa.
Parece claro, em todo caso, que nunca existiu dentro dos limites da força humana nenhuma possibilidade de fornecer a Dilma uma defesa minimamente razoável. A presidente está sendo deposta, do ponto de vista técnico, por fraude nas contas públicas, e por nada mais. É rigorosamente fora de propósito, ao mesmo tempo, esperar que na hora do julgamento alguém consiga esquecer o monumento histórico à corrupção, à incompetência e à insensatez que foram os seus cinco anos e tanto de governo. Dilma não praticou todos os erros, é claro ─ aliás, ninguém tem tempo para errar tanto, e além do mais a desgraceira geral começou nos governo do seu antecessor. Mas ela é a responsável, sim, pelos erros cometidos. Quem esteve no comando do barco durante todo esse tempo? Foi ela, e mais ninguém. Não dá para dizer, agora, “eu não sabia”, ou “não era isso que eu queria”, ou “não fui eu” quem roubou, quem arruinou a Petrobras, quem criou 10 milhões de desempregados, quem levou a indústria brasileira a seu estágio de setenta anos atrás, quem transformou os fundos de pensão das estatais em atividade criminosa, e por aí afora. Defender-se como, desse jeito?
O que lhe ocorreu, a ela e sua tropa, foi ficar dizendo “não vai ter golpe”. Fora isso, o governo limitou-se a praticar truques. Mandou ministros se licenciarem para votar contra o impeachment na Câmara. Tentou-se colocar Lula na Casa Civil. A um certo momento pensaram em baixar o preço da gasolina. Cargos públicos foram postos em venda aberta em troca de votos. Quiseram jogar a culpa de tudo em Michel Temer e Eduardo Cunha, esquecidos de que o vice, ainda faz pouco tempo, era o grande “coordenador político” do governo ─ chegou-se a garantir que ele ia “liquidar a fatura” em favor de Dilma. E Cunha? Jamais se menciona que foi nos governo do PT, e não durante o reinado de dom Pedro II, que o deputado praticou todos os delitos de que é acusado. A cada dois ou três desses espasmos, anunciavam que a situação estava “virando”. Virava, virava ─ e voltava ao ponto de partida. Também não funcionou, pelo jeito, a genialidade política que se atribui a Lula, e que iria “mudar tudo” no fim do jogo. O ex-presidente bem que tentou. Deu, e deu, e deu na chave de partida ─ só que o motor não pegou. Lula já foi capaz de eleger postes como Dilma Rousseff, mas não é curandeiro de pacientes desenganados. Dizem que consegue dar nó em pingo de água ─ poder ser, mas precisa de água. Além disso está ocupado, acima de tudo, em salvar a si próprio.
Hora de trocar o baralho.

domingo, 13 de março de 2016

"Dilma, por si só, é a responsável por um prodígio sem precedentes nos registros da economia mundial: sua passagem pela presidência da República já custou 1,6 trilhão de reais de prejuízo ao patrimônio geral do Brasil e dos brasileiros..."


12/03/2016
 às 21:00 \ Opinião

J. R. Guzzo: Um prodígio inédito

Publicado na revista EXAME
Não é possível, pela lógica comum, esperar nada de bom no futuro próximo de um país que caminha para completar 15 meses sem governo. Dá para esperar menos ainda quando se considera que, por exigência da lei, alguém tem obrigatoriamente de ocupar o cargo de presidente da República — o que lhe dá a oportunidade diária de tomar decisões erradas, sem que haja a menor chance de fazer alguma coisa certa, mesmo sem querer. Não dá: para profundo azar do Brasil como um todo, quem está na presidência é uma pessoa que erra com obsessão inédita há cinco anos seguidos, não consegue dizer nada que faça o menor nexo quando fala em público e perdeu, claramente, o equilíbrio mental mais rudimentar que se exige para a tarefa de governar seja lá o que for. Ainda pior, enfim, sempre pela mesma lógica, o comandante político que a colocou na cadeira mais elevada do poder público nacional, e sem o qual a atual presidente da República continuaria sendo uma cidadã perfeitamente desconhecida e provavelmente inofensiva, está, ele próprio, destruído moralmente. Enrolado de corpo, alma e cabeça com a Justiça penal, o ex-presidente Lula torna-se a cada dia um sério candidato a acabar sendo considerado o responsável pelo governo mais corrupto que o Brasil sofreu em toda a sua história. Muito bem, deu a lógica: está oficialmente confirmado que o país teve uma queda de 3,8% no PIB de 2015, a pior desde 1990. Mais que isso, com a recessão já contratada de 2016, os governos Lula, Dilma Rousseff e PT terão dado ao Brasil a mais longa série anual de retrocesso econômico de toda a sua existência como nação independente.
Dilma, por si só, é a responsável por um prodígio sem precedentes nos registros da economia mundial: sua passagem pela presidência da República já custou 1,6 trilhão de reais de prejuízo ao patrimônio geral do Brasil e dos brasileiros. É isso mesmo. O número chegou e passou a casa do trilhão, um tipo de cifra que só se consegue imaginar nas abstrações da matemática. Trata-se do que os economistas chamam de “prejuízo bruto”, ou a perda pura, simples e direta de riqueza e renda. A conta é simples. O PIB real do país no fim de 2015 deveria estar acima de 7 trilhões de reais, se tivesse havido um crescimento modestíssimo da economia nos cinco anos Dilma. Ficou abaixo do que era no final de 2013, às vésperas de sua segunda vitória na disputa pelo Palácio do Planalto. O Brasil está caminhando para inteirar oito trimestres seguidos de recessão, limite a partir do qual o vocabulário econômico começa a utilizar a palavra “depressão”. Nunca antes, na história deste país, alguém conseguiu algo parecido. A dívida pública criada por Lula e Dilma é a maior de todos os tempos, e está aumentando. Em 2015 o governo tirou dos impostos pagos pelos brasileiros mais de 500 bilhões de reais para pagar juros de sua dívida — e pagar aos “rentistas” tão odiados no palavrório oficial. Chama o que está devendo de “programa social”; na vida prática é apenas a mais espetacular transferência de renda que o Brasil já conheceu. A inflação chegou perto dos 11% ao ano. O desemprego, pelas contas de janeiro, estava rolando na base dos 100.000 demitidos por mês. Aí já é extermínio — ou, talvez, mais corretamente, anarquia, como mencionado no início da página. Dobramos a meta.
Os últimos acontecimentos políticos tornam tudo isso ainda mais funesto. O ex-presidente Lula, depois de ser levado pela polícia para um interrogatório, parece ter desistido de enfrentar seus atuais e crescentes infortúnios valendo-se da lei, como têm feito todos os acusados de corrupção pela Operação Lava Jato. Resolveu, pelo menos de boca, declarar guerra à democracia ao se recusar a obedecer as decisões da Justiça brasileira, chamar suas milícias para a violência na rua e ofender, com o linguajar de sarjeta mais agressivo que jamais tinha utilizado em público até hoje, autoridades legais, adversários e qualquer brasileiro que não se submeta a ele. A lógica disso tudo é muito ruim.

sábado, 5 de março de 2016

Lula, um homem com muitos endereços que não pode frequentar 'porque não são seus'...


05/03/2016
 às 12:14 \ Opinião

J. R. Guzzo: Agonia moral

Publicado na versão impressa de VEJA
O ex-presidente Lula perdeu a batalha mais importante de sua vida. Tem pela frente, ainda, um demorado tiroteio nas altas, médias e baixas cortes da Justiça Penal brasileira. Mas não tem mais esperanças de sobreviver a uma doença para a qual não existe cura conhecida: a destruição de sua força moral. Trata-se do conjunto de atributos que realmente separa os homens, e mesmo as nações, em matéria de sucesso ou fracasso, e ao qual se costuma dar o nome genérico de caráter. Sabe-se desde sempre o que entra nesse conjunto. Entram aí o valor da palavra dada, a reputação, o respeito aos outros e a si próprio, a capacidade de transmitir confiança. É a força que faz uma pessoa falar e ser naturalmente acreditada. É a coragem para assumir responsabilidades, enfrentar momentos adversos, não abandonar os amigos em dificuldade. É o exercício da honestidade e da integridade comuns. Em suma, é o que na linguagem do dia a dia se chama de “vergonha na cara” ─ ou honra pessoal. Muito mais que fama, força ou riqueza, é o que realmente faz a diferença. Fará toda a diferença para Lula. Sua batalha está perdida porque ele perdeu o bem mais precioso que poderia ter ─ a força moral decisiva para tornar-se alguém que valha a pena como pessoa e como homem público.
Hoje, vivendo acuado num prédio de escritórios do bairro paulistano do Ipiranga, com suas despesas pagas por magnatas, cercado não pela massa dos pobres que diz ter salvado, mas por negociantes de “marketing”, burocratas do PT, parasitas variados e uma armada de advogados que pouquíssimos brasileiros poderiam pagar, Lula está só. Do povo, nem sinal. O homem que tanto menosprezou os adversários falando de sua popularidade de 100% não pode ir a um campo de futebol ─ nem ao estádio do Corinthians, em Itaquera, cuja construção impôs para a Copa do Mundo de 2014, da qual não conseguiu assistir a um único jogo. Não pode ir jantar um frango com polenta em São Bernardo. Não pode ir a uma loja, comer um pastel de feira ou andar sem a proteção de um regimento de seguranças. Não pode ir ao infeliz sítio de Atibaia que tanto frequentou até faz pouco, e no qual empreiteiros amigos socaram uma fortuna em reformas ─ nem, menos ainda, a esse amaldiçoado tríplex do Guarujá. Não pode, no fim das contas, sair à rua ─ e, como se fosse um castigo, não pode gastar livremente no próprio país os milhões de reais que ganhou fazendo palestras para construtoras de obras públicas e outros colossos da elite empresarial brasileira. Que líder de massas é esse? Aos 70 anos de idade, Lula veio acabar metido na situação contrária à que Guimarães Rosa descreve num conto particularmente genial de sua vasta coleção de contos geniais, o Burrinho Pedrês. Como se lembram os leitores da história, o modesto burrinho sabia uma coisa mais importante que todas as outras, para quem, como ele, tinha sido sorteado com uma vida difícil ─ jamais entrava em lugar algum de onde não soubesse como sair depois. O ex-presidente entrou com tudo. Agora precisa sair, mas não sabe onde está a saída.
É certo que Lula não será ajudado, nessa procura por um caminho capaz de tirá-lo do buraco, por nenhuma das manobras que vem utilizando há trinta anos para dar a volta em seus problemas. A causa verdadeira do colapso que vive hoje é o fato de ter entrado em estado de coma moral ─ e isso não se resolve chamando um gerente de propaganda para bolar comerciais de TV, da mesma forma que “imagem”, por mais esperteza que se empregue em sua criação, não substitui caráter. Também não adianta gastar dinheiro com advogados que passam o tempo armando chicanas processuais e outros truques destinados a impedir que se julgue o mérito real dos fatos alegados contra ele; isso pode funcionar como estratégia de fuga, mas não cria valores em cima dos quais se consiga construir uma reputação. Não é possível sair do lugar em que o ex-presidente se enfiou distribuindo camisetas vermelhas, fretando ônibus e pagando diárias, sempre com dinheiro público, a milícias que se apresentam como “movimentos sociais”. Dá errado, cada vez mais, continuar atirando em Fernando Henrique Cardoso ─ isso para ficar apenas no alvo que se tornou sua ideia fixa ─ na esperança de provar que “todo mundo é igual”; quanto mais tentam fazer a comparação, mais chocantes ficam as diferenças de conduta entre os dois. Enfim: tem-se tentado de tudo, e nada dá certo. Continuará assim, pois nada altera a pane central que existe nessa história: Lula não é o homem que diz ser. Também não é o que seus admiradores, de boa-fé ou por interesse, acham que seja.
A desmontagem da estrutura ética do ex-presidente está sendo feita unicamente através de fatos, não de alegações; e são fatos que não precisam mais ser provados, pois todas as provas já foram exibidas e confirmadas. Mais: nenhum deles, até agora, foi apresentado ao público brasileiro pela oposição, que se limita a acompanhar sua divulgação na imprensa e fazer o mínimo possível de comentários.
A derrota, enfim, não veio por causa de nenhuma batalha dessas que fazem tremer a terra ─ nada de Waterloo, ou de invasão da Normandia no Dia D. Tudo veio acabar em mesquinharia e pequenez, nas miudezas miseráveis da reforma de um sítio de segunda linha, nas 200 caixas de mudança da “transportadora Cinco Estrelas”, nos desvãos de uma arapuca imobiliária que lesou 3 000 famílias com um golpe na praça. Não houve a discutir, nessa demolição, uma única questão de princípio, filosofia política ou consciência ─ ficou tudo exclusivamente numa conversa de fim de feira sobre quem é o dono do tríplex na cooperativa falida, quem pagou a cozinha Kitchens, quem mora de graça na casa de quem. Mais que qualquer outra coisa, ficou uma palavra-guia, a palavra que não pode mais calar na biografia de Lula: empreiteira, empreiteira, empreiteira. É aí, na hora da verdade, que ele encontrou de fato sua perdição.
Nada destruiu tanto a autoridade moral de Lula quanto seu convívio com as empreiteiras de obras brasileiras, durante e depois de seus dois mandatos. Nunca antes, em toda a história do Brasil, houve um presidente da República com tantos e tão íntimos amigos entre os empreiteiros. Alguém é capaz de citar outro? Em apenas quatro anos, de 2011 a 2014, momento em que a casa começou enfim a cair, Lula recebeu 27 milhões de reais para fazer palestras encomendadas pelos gigantes da construção pesada no país. Foi presenteado, também, com contribuições milionárias para sustentar as despesas do seu Instituto Lula ─ isso e mais viagens de jatinho, uma antena de celular a 100 metros do sítio que utiliza em Atibaia, e as obras de reforma nesse mesmo e malfadado sítio, que agora atormentam sua vida. Os presentes não vieram apenas das empreiteiras, certo, mas isso não melhora sua situação em nada ─ vieram de fontes mais sombrias ainda, como um consórcio de estaleiros que vivem de contratos com a Petrobras, o Banco BTG Pactual, um “centro de estudos” de Angola. Através da francesa GDF Suez, há traços até da inesquecível Astra Oil, que vendeu à Petrobras o ferro-velho da refinaria americana de Pasadena, algo tão parecido com uma negociata em estado puro, mas tão parecido, que até hoje não foi possível descobrir a diferença. Ganhar dinheiro fazendo palestras para essa gente está dentro da lei? Está. Está dentro da moral comum? Não está, e é aí que começa e acaba o problema. Um ex-presidente da República não pode, simplesmente não pode, aceitar dinheiro de empresas que dependem do Tesouro para sobreviver. É isso, e ponto final.
Como seria possível confiar na imparcialidade, na palavra e na integridade de valores de alguém que anda em tais companhias, ainda mais quando se sabe da influência que exerce no governo que está aí? Lula recebeu dinheiro das empreiteiras porque foi presidente do Brasil por oito anos, e não por seus conhecimentos em matéria de viadutos, ferrovias e usinas hidrelétricas; ninguém lhe daria um tostão furado se tivesse sido apenas presidente de sindicato. Lula diz o tempo todo que só chegou ao comando da nação porque os pobres votaram nele. Mas não vê nenhum problema no ato de transformar em dinheiro vivo, agora, o apoio que recebeu dos humildes ─ a quem deve tudo, inclusive sua transformação em milionário. O ex-presidente, de tempos em tempos, diz que tem o direito de ser rico. Tem, mas não tem. Não pode botar no bolso, sem se desmoralizar, 27 milhões de reais de empreiteiros ─ nem ser seu amigo íntimo, prestar-lhes serviços, permitir que lhe paguem despesas, aceitar que sejam sócios de um dos seus filhos e sabe-se lá ainda o que mais. Um homem público como ele não pode, nessas coisas, ser igual aos demais cidadãos. Tem de abrir mão de uma porção de confortos; é o preço a pagar para manter inteira a sua moral. Se achar injusto, bastará deixar a vida pública; ninguém é obrigado a ser presidente da República.
Lula acostumou-se a achar que tem direito a tudo, e não está sujeito a nada. Imaginou que pudesse ser o mais querido entre as empreiteiras ─ e que isso não iria lhe trazer problema algum. Achou que seus dois filhos pudessem ganhar milhões fazendo negócios com empresas que dependem do governo. Não viu nada de mais em meter-se com uma quadrilha que vendeu apartamentos na planta a bancários, roubou o dinheiro que recebeu deles e foi à falência sem entregar os prédios. Com exceção, claro, de um ou outro que foi concluído por uma empreiteira, mais uma, e reservado aos amigos ─ entre eles o que abriga o tríplex do Guarujá. O que Lula, que nem bancário é, estava fazendo no meio dessa gente? As histórias vão adiante e adiante; o que apareceu escrito aqui está muito longe de ser tudo. Mas é o suficiente. Este é um combate que claramente chegou ao fim.

sábado, 27 de fevereiro de 2016

Lula tem faltado às provas orais de sua vida pública e pode, com isso, 'tirar' nota zero e ... prejudicar seu currículo político

27/02/2016
 às 13:44 \ Opinião

J. R. Guzzo: No alvo errado

Publicado na versão impressa de VEJA

Já virou um procedimento de rotina para o ex-presidente Lula e todo o seu sistema de apoio, nessa miserável cachoeira de suspeitas que não para de jorrar em torno dele. Em vez de apresentar um mínimo de fatos capazes de atestar que é um homem decente, e afastar pelo menos o grosso das desconfianças que construiu em torno de si próprio, o principal líder político do Brasil se escondeu de novo. Deveria responder a algumas perguntas num fórum criminal de bairro em São Paulo — coisa que qualquer cidadão com a vida em ordem seria capaz de fazer sem o menor problema. Mas não. De tudo o que podia fazer de ruim, escolheu o pior: simplesmente não foi ao interrogatório, aproveitando-se de um desses truques burocráticos que a Justiça brasileira oferece a toda pessoa que tem dinheiro, influência e advogados suficientes para impedir que a lei se aplique a ela. Por que não foi? Pelo mesmo motivo, exatamente, que o manteve de boca fechada, até agora, em relação a tudo o que vem sendo dito sobre sua conduta: não consegue dar, nem com a assistência dos mais distintos criminalistas do país, uma única resposta que possa ser levada a sério sobre os benefícios pessoais inexplicáveis que vem recebendo de empreiteiras de obras públicas.
Resolve alguma coisa? Não resolve. As perguntas só irão embora no dia em que forem respondidas. Lula, o PT e o seu mundo ganharam mais algum tempo; em compensação, o ex-presidente vai tomando cada vez mais indiscutível sua reputação como homem que foge da raia. Parece que estão tentando botar de pé, na sua usina de marketing, a imagem de Lula como um novo “Cassius Clay”, o boxeador que passou nas cordas toda uma de suas lutas mais célebres — até reagir e mandar o seu adversário para a lona. Há um problema complicado com essa comparação: Cassius Clay só ganhou porque compareceu ao ringue no dia marcado para a disputa. Mas a regra número 1 para Lula é sumir: em vez disso, acusa os adversários. Neste último episódio, sua tropa falou de “linchamento”, tentativa de “impedir” sua candidatura à Presidência em 2018, guerra da elite ao seu “legado” e o resto da ladainha de sempre. É como se Clay, em vez de subir no tablado, ficasse xingando George Foreman lá no meio da plateia. Parecem ter esquecido que não estão numa campanha eleitoral, e sim diante da Justiça penal — não adianta enganarem o eleitorado, pois quem precisa acreditar no que dizem é o juiz. Estão atirando no alvo errado.
A fuga permanente de Lula não chega a piorar sua imagem junto aos milhões de brasileiros que, já faz muito tempo, desistiram de acreditar nele. Seu problema, a partir de agora, parece ser com os outros milhões que são seus eleitores, simpatizantes e irmãos de fé — essa multidão de gente sem rosto, sem nome e sem triplex que vota nele, briga por sua reputação e não ganha nada com isso. Lula sempre achou que esse povo engole tudo; tem uma credulidade e uma paciência sem limites. Vai continuar assim para sempre? Diante das perguntas a que seu líder não responde, talvez comece a perder o interesse em ouvir Lula falando pela milésima vez no “legado”, no “operário” que cuida dos pobres, na boa fortuna que trouxe a eles. Pode estar se enchendo com as histórias de que Lula é importante para “o futuro do mundo”, ou que a “elite” inventa todas as acusações contra ele. Tudo bem, mas não é isso que essas pessoas estão perguntando hoje, nas viagens de três horas até o trabalho ou na procura do emprego que perderam. Querem saber a troco de que empresas pagam reformas caríssimas no sítio que Lula “frequenta” — um lugarzinho meia-boca, segundo diz agora o seu estado-maior, mas que para 99% dos brasileiros é um sonho que não vai se realizar até o fim da sua vida. Por que manda para um sítio que não é dele uma mudança com 200 caixas? Por que lhe pagam uma cozinha de 130 000 reais, mais do que vale uma casa inteira no Brasil real? Por que a empresa de telecomunicações que ganhou do ex-presidente um favor “top de linha” instalou uma torre de celular ao lado do bendito sítio? Por que seus filhos moram de graça? Por que sua vida é cercada pelos quatro cantos por empreiteiras de obras públicas — e estaria certo Lula receber tanto dinheiro delas?
Lula vem fracassando dia após dia na batalha para mostrar que não está escondendo nada, como acaba de comprovar mais uma vez com sua recusa em responder a perguntas do promotor público. O que pretenderia, então? Passar assim o resto da vida?

sábado, 30 de janeiro de 2016

Um manifesto chamado 'chicana' / O retrocesso / J R Guzzo


0/01/2016
 às 11:48 \ Opinião

J. R. Guzzo: O retrocesso 

Publicado na versão impressa de VEJA
O manifesto que há pouco foi colocado em circulação por um círculo de 100 advogados, incluindo defensores de réus processados por corrupção e outros crimes na Operação Lava Jato, com a intenção de denunciar o que os seus autores descrevem como uma série de agressões ao direito de defesa, não é, nem nunca chegará a ser, o que parece. Pelo que está escrito ali, com o amparo de assinaturas ilustres, o documento parece um protesto contra a arbitrariedade do Poder Judiciário e um grito em favor das liberdades individuais do cidadão brasileiro ─ ou, pelo menos, foi isso que pretendeu parecer. O que acabou realmente sendo foi outra coisa: uma declaração de guerra contra a aplicação da Justiça no Brasil de hoje. Os advogados em questão acusam os condutores dos processos penais da Lava Jato de parcialidade contra os réus, violação dos códigos legais, desrespeito ao exercício do direito de defesa ─ e sustentam que esses delitos são uma ameaça para o país e para “o Estado de direito”. Não funcionou. Só conseguiram deixar claro que seu único interesse era fazer pressão em favor dos próprios clientes.
O que chama atenção neste caso, à primeira vista, é a baixa qualidade do texto levado a público. Não é citado ali nenhum fato concreto de arbitrariedade por parte do juiz Sergio Moro, titular da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, ou do Ministério Público. Não há nenhuma menção a uma realidade fundamental: a de que os advogados da Lava Jato já apresentaram cerca de 300 recursos contra as decisões do juiz e quase todos foram negados pelos três diferentes tribunais superiores que julgam os seus despachos. Não há o mais remoto sinal de que exista algo parecido com uma ideia naquilo tudo que escreveram. Mas o que há de pior no documento é algo que não está escrito ─ é a sua tentativa desesperada de empurrar o Brasil de volta a um estilo de Justiça que começa a morrer. É a Justiça que está aí desde sempre, desenhada peça por peça para garantir a impunidade de réus com influência, posição social e, sobretudo, muito dinheiro para gastar em suas defesas. Sua essência é impedir a apreciação do mérito real dos fatos no julgamento dos processos criminais ─ e obrigar, em vez disso, a que todas as decisões dos juízes obedeçam a uma complicadíssima malha de normas descritas como “técnicas”, que nada têm a ver com aquilo que efetivamente aconteceu e se interessam apenas em criar obstáculos artificiais para possíveis condenações. É a Justiça dos prazos, das formalidades, da burocracia, das regrinhas, das minúcias extremas dos códigos e leis processuais, das possibilidades praticamente sem limites de adiar decisões e ir empurrando tudo com a barriga até o Dia do Juízo Universal. É o triunfo do que os juristas chamam de “chicana”.
Advogados experientes e atentos às realidades do Brasil de hoje vêm observando há bom tempo, desde o início da Operação Lava Jato (e até mesmo antes, a partir das condenações do mensalão), que mudanças importantes estavam começando a aparecer na Justiça Penal brasileira. Estava ficando mais difícil para os réus, advertiam eles, confiar cegamente nos confortos da Justiça velha. As causas, cada vez mais, passavam a se interessar por provas e fatos, em vez de truques processuais. A Justiça começava a exigir que as defesas apresentassem argumentos verossímeis e baseados na lógica, em vez de alegar qualquer disparate e desafiar a acusação a apresentar “prova em contrário”. Foi aparecendo a necessidade de se defender com argumentos em vez de discursos; foi se esvaziando a importância do palavrório, do latinório, do jogo para a plateia. Os advogados do manifesto, ao que parece, não prestaram atenção a nada disso. Agora, diante das dificuldades que a nova Justiça vem colocando para os réus nos processos de corrupção, querem salvar seus clientes pregando a volta a um sistema em fase de demolição.
Tudo o que conseguiram até agora foi tornar ainda mais forte a posição do juiz Sergio Moro. É natural: quem pode levar a sério um documento em que se escreve que a Justiça no Brasil de hoje é pior que a do regime militar? Isso não é argumento; é uma falsificação maligna dos fatos, ao ignorar que na verdadeira Justiça da época 400 pessoas foram mortas sem passar por nenhum processo, segundo as estimativas mais citadas, e que o governo podia demitir juízes, fechar tribunais e cassar ministros. Os advogados do protesto dizem que as ações penais contra a corrupção são um “retrocesso de vários séculos”. Confundem tudo. Quem quer o retrocesso são eles.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2016

"Paraíso perdido" ... / J R Guzzo // Veja

domingo, janeiro 10, 2016

Paraiso perdido - J. R. GUZZO


Onde foi parar neste começo de 2016 o "carrinho novo" que, segundo o ex-presidente Lula, o operário brasileiro finalmente teve dinheiro e crédito para comprar, por conta das virtudes de seu governo? Onde andariam todos os trabalhadores humildes que deixaram "a elite inconformada" por começarem a viajar de avião, pela primeira vez na história deste país? Onde poderia estar circulando neste momento o "Trem-Bala" que, segundo Lula garantiu mais de uma vez, seria inaugurado dali a pouquinho e calaria a boca dos que "torcem contra" o governo? Alguém já conseguiu tirar uma caneca de água da transposição do Rio São Francisco? O que aconteceu com a conta de luz barata e com a lição de economia que a presidente Dilma Rousseff deu ao planeta em 2013? O Brasil, assegurou ela, acabava de provar que era possível, sim, crescer, distribuir renda, baratear a vida para os pobres e ter finanças sadias, tudo ao mesmo tempo, "em meio a um mundo cheio de dificuldades". Não só isso. Seu governo acabava de colocar o Brasil numa "situação privilegiada" perante a comunidade das nações, com "energia cada vez melhor e mais barata, mais que suficiente para o presente e o futuro". Os "pessimistas" tinham sido derrotados, informou Dilma.

E os juros? Na mesma ocasião, a presidente comunicou que "os juros estão caindo como nunca" — e hoje? Outra coisa: sabe-se da existência de algum posto onde seria possível comprar gasolina barata, feito de que o governo tanto se orgulhava até o encerramento da eleição presidencial de 2014? O Brasil entrou, afinal, na Opep, como Lula previa diante da nossa transformação em potência na produção de petróleo? Aliás, por falar" nisso, quando foi a última festa para comemorar mais uma descoberta do "pré-sal", com Lula e Dilma fazendo aquelas marcas pretas de óleo nos uniformes cor de laranja com que eram fantasiados? Procuram-se notícias, também, do real forte — tão forte que iria dispensar o dólar nas transações internacionais do Brasil, pelas altas análises do Itamaraty. Seria interessante saber onde foi parar o investment grade que as grandes agências mundiais de avaliação de risco deram ao Brasil pouco tempo atrás — prova definitiva, segundo o governo, de que o mundo capitalista enfim se curvava diante da gestão econômica de Lula, Dilma, PT e de suas "políticas sociais". O mesmo se pode perguntar em relação ao "gostinho" declarado pelo ex-presidente em ver o Primeiro Mundo em "crise" e o Brasil correndo para o abraço.

Onde está "o pleno emprego"? Onde está a "Pátria Educadora"? Onde está o maior programa de distribuição de renda já visto na história da humanidade?
Nada disso se encontra disponível no presente momento. Carrinho novo? A indústria automobilística acaba de ter, em 2015, o pior desempenho em quase trinta anos — isso mesmo, desde 1987, nas remotas profundezas do governo José Sarney. As companhias de aviação estão de joelhos; se estão perdendo até os passageiros ricos, imagine-se os pobres.

A energia barata virou uma piada: as contas de luz subiram 50% em 2015, e vão subir de novo neste ano. Os juros andam perto de 15% — um paraíso mundial para os "rentistas" com os quais a esquerda brasileira tanto se horroriza nos discursos e a quem tanto favorece na vida real. No assunto petróleo, o que se tem, acima de tudo, é uma Petrobras que o governo quebrou, por ladroagem e incompetência, e hoje não tem dinheiro para investir nada; na verdade, ela jamais deveu tanto. O real perdeu 50% do seu valor no ano passado, e voltou, após mais de vinte anos, à sua condição de moeda bananeira. O governo presidiu uma recessão de 3,5% em 2015 — isso em cima de crescimento zero em 2014 — e prepara-se para socar na economia outro recuo neste ano, de 2,5% ou mais. Há 10 milhões de desempregados neste país, no corrente mês de janeiro. O último IDH, uma das medidas mundiais mais respeitadas para avaliar o bem-estar dos países, deixou o Brasil em 75º lugar—e quem pode achar que está bem, em qualquer coisa, se fica no 75º lugar? O investment grade sumiu: como o Senhor, na Bíblia, a Moody"s, a S&P e a Fitch dão, a Moody"s, a S&P e a Fitch tiram.

É este o país que resultou, na prática, dos treze anos de Lula, Dilma e PT. Ninguém no governo tem a menor ideia de como sair disso — nem poderia ter, quando o seu único objetivo, hoje em dia, é ficar de bem com o senador Renan Calheiros e traficar no Congresso um jeito para escapar do impeachment. Daí só se pode esperar que as coisas continuem piorando, piorando, piorando — até que chega um dia em que continuam a piorar.
Reações: 

segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

"Um Brasil em desmanche" ... J. R Guzzo // Veja //

04/01/2016
 às 20:04 \ Opinião

J. R. Guzzo: Um Brasil em desmanche

Publicado na edição impressa de VEJA
2015 foi o ano em que o Brasil Velho teve finalmente um duelo para valer com o século XXI. Todos estão cansados de saber que país é este. É o Brasil que desde a sua independência, 200 anos atrás, está aí para proteger, servir e enriquecer a minoria dos que dão ordens nos governos, os seus amigos e os que pagam para estar de bem com os que mandam.  É o Brasil da corrupção como método de governo e objetivo da vida pública ─ um condomínio gerido por gangues políticas cujo único propósito é controlar a máquina do Estado. Não há ideias nesse Brasil; só há interesses. O primeiro mandamento do político “competente”, ou “do ramo”, é aplicar as melhores técnicas para enganar um eleitorado em grande parte ignorante, pobre, indiferente a seus direitos e desinteressado de questões públicas. Aqui, os donos das decisões tratam como um absurdo o princípio pelo qual a lei deve ser igual para todos. Estão convencidos de que o fato de ganhar eleições, em geral através da prática de estelionato aberto em suas campanhas milionárias, lhes dá o direito de fazer o que bem entendem com o aparelho da administração pública. O Brasil Velho, em suma, é o Brasil em guerra permanente com o progresso, a mudança e o bem-estar da maioria.
Em 2015, o Brasil Velho perdeu. Não vai desaparecer assim de uma hora para outra, é claro, porque nada que resiste há dois séculos desaparece de uma hora para outra. Mas as coisas não serão mais como têm sido até hoje na vida pública brasileira; o futuro do Brasil Velho acabou. Ele é representado hoje, de corpo, alma e mente, pelo ex-presidente Lula, pelo Partido dos Trabalhadores e por essa trágica Dilma Rousseff com seu governo em decomposição ─ junto com os amigos, os magnatas que se tornaram companheiros e as quadrilhas que vivem de assaltar o Erário. Lula e todos os intendentes que estão em seu redor não perceberam o temporal que vinha se formando havia anos e desabou sobre eles em 2015 ─ escândalo após escândalo, fracasso após fracasso, flagrante após flagrante de mentira, fraude e incompetência para governar. Acharam que seu problema estava nos outros: na “mídia” que publica notícias de corrupção, nos “pessimistas” que registram o naufrágio econômico do país, na “oposição”, na Justiça que investiga a roubalheira, nos que simplesmente discordam. Com sua casa caindo, jamais pensaram que pudessem ter errado em alguma coisa.
Imaginaram-se ameaçados por um “golpe”. Convenceram a si próprios de que as maiores manifestações de rua que o Brasil já viveu eram um capricho das “elites”, coisa de “terraço gourmet”, e outras assombrosas bobagens do mesmo tipo. Comandaram, diretamente ou através da sua usina de propaganda nos meios de comunicação, uma campanha a favor da corrupção como jamais se viu por aqui e provavelmente em nenhum outro lugar do planeta. Trataram como vítimas empreiteiros de obras que são réus confessos no pagamento de propinas, e festejaram como heróis (“guerreiros do povo brasileiro”) criminosos condenados por corrupção. Continuaram acreditando, com fé religiosa, no Brasil dos privilégios, onde a polícia não prende e a Justiça não condena. Meteram-se numa operação desesperada para salvar o couro de um presidente da Câmara dos Deputados que 80% dos brasileiros querem ver deposto e cassado; tudo o que conseguiram, no fim das contas, foi o exato oposto do que pretendiam ─ um processo de impeachment no lombo da presidente da República. Mais que um crime, o Brasil Velho cometeu um erro. Não entendeu até agora qual foi o confronto real de 2015: o que pôs uma porção decisiva da sociedade brasileira contra as forças aqui descritas ─ o coletivo que se chama “oligarquia” e que foi absorvido, habitado e comandado por Lula e pelo PT em seus treze anos no governo. Esse lado não podia continuar ganhando sempre.
É o que mostram os fatos. Muitos dos seus chefes, que até outro dia estavam aí dando ordens, nomeando gente para empregos públicos e armando negócios de bilhões com dinheiro público, vivem hoje apavorados com a possibilidade real de ir para a cadeia a bordo de um camburão da Polícia Federal. Há um senador preso, sem data para sair ─ e ele é simplesmente o líder do governo no Senado. Estão no xadrez ou acabaram de sair o presidente da empreiteira de obras públicas número 1 do Brasil, o presidente da empreiteira número 2 e um banqueiro descrito até outro dia como estrela em ascensão irresistível na alta finança brasileira ─ especialmente aquela que vive em concubinato com o governo. Estão na mesma situação ex-deputados, ex-diretores da Petrobras, um ex-ministro de Estado, um vi­ce-almirante da armada, o último tesoureiro do PT, executivos “top de linha” e por aí vamos. Não existe nessa turma toda um único preto ou pobre ─ é só elite, e dentro dela há uma alarmante coleção de cidadãos que faz anos convivem em intimidade com o ex-presidente Lula, sua família e sua vizinhança. Só na Operação Lava Jato, a maior ofensiva contra a corrupção jamais feita neste país, mais de 100 suspeitos já foram presos, mais de trinta foram condenados, alguns várias vezes, num total de penas que somam quase 700 anos de prisão, e mais de vinte continuam na cadeia. Outros esperam suas sentenças usando o equipamento-símbolo destes dias de desmanche do Brasil Velho ─ a tornozeleira eletrônica que os impede de fugir.
Quem seria capaz de imaginar que coisas assim iriam acontecer um dia? Também não dava para prever que o maior líder político do país acabaria perdendo a sua situação de imunidade perante a lei, como ocorreu com doutores e excelências que hoje fazem parte da população carcerária nacional. Lula, neste momento, é ao mesmo tempo candidato a presidente e candidato ao presídio. Não está sendo ameaçado por suas ações políticas; seu problema, caso a Justiça decida que há indícios bem fundamentados de sua participação em algum delito, é que terá de se submeter a um processo penal, como todos os demais cidadãos brasileiros. É uma novidade, igualmente, o fato de não bastar mais mandar no governo, nem utilizar sua máquina e seus cofres, para se safar da vida real. A ocupante da cadeira teoricamente mais poderosa da República está hoje reduzida a um pano de estopa como pessoa pública, arrastada daqui para lá por deputados, senadores e todo um mundo de aproveitadores que têm o poder real de decidir se ela fica no cargo ou é deposta. Dilma conseguiu decair ao nível de desmoralização de um Fernando Collor. A maior realização do seu governo será escapar de um processo de impeachment humilhante, e que já começa muito mal.
O regime velho, ao afundar pelos quatro lados em 2015, deixou à vista de todos o embuste sem limites que foi a sua marca principal durante a fase Lula-Dilma-PT. Há, com certeza, discordâncias sérias quanto a essa observação. Para muitos, a corrupção frenética dos últimos treze anos é imbatível na disputa pelo título de pior pecado da era lulista: quando se roubou mais do Tesouro Nacional? Outros tantos acham que o desastre número 1 é a sua incompetência sobrenatural para governar o país no dia a dia das coisas práticas: o que dizer de um governo que chegou ao fim do ano ameaçado de não ter dinheiro para pagar suas contas de luz? Todas essas escolhas são corretas, mas talvez nada tenha mostrado tão bem a alma do Brasil atrasado, decadente e maligno que o PT liderou de 2003 para cá quanto a escolha da trapaça, pura e direta, como lei suprema da ação política e administrativa do governo. O Brasil de hoje é o Brasil do trem-bala, da transposição das águas do São Francisco e da entrada na Opep, entre outras miragens. Aqui o cidadão chega à classe média ganhando um salário mínimo por mês. Os governos que juraram “defender a Petrobras” provaram ser os seus piores inimigos; a empresa está em ruínas, quem investiu em suas ações tem hoje um mico miserável, e só por conta do petrolão, segundo a última perícia criminal, ela foi roubada em mais de 40 bilhões de reais. O “momento mágico” da economia que Lula garantiu ter criado é o que se vê aí: 9 milhões de desempregados, inflação de 10%, juros de agiotagem, o caixa do governo na porta da vara de falências. É um manifesto contra quem não é rico.
A mãe de todas as trapaças é o “resgate de 40 milhões” de brasileiros da pobreza, ou sabe-se lá quantos. Dezenas de países apresentam resultados melhores que os do Brasil no combate à miséria ─ com a vantagem de não terem caído, como aqui, numa recessão de 3,5% em 2015, e talvez outro tanto em 2016, o que tira dos pobres tudo aquilo que os governos Lula-Dilma disseram ter dado. Que progresso social é esse que faz com que as coisas andem para trás? O fato é que não transferiram “renda” nenhuma ─ apenas distribuíram dinheiro que não tinham e tomaram emprestado a juros extorsivos. O resultado é essa dívida pública monstro que hoje caminha para os 3 trilhões de reais e rende bilhões para a elite da elite, os “rentistas” com sobra no bolso para emprestar ao governo. Foram remunerados com cerca de 500 bilhões de reais em juros pagos pelo Tesouro em 2015 ─ mais que o total de gastos com o Bolsa Família desde a sua criação. A aritmética é essa. Ela indica que Lula e Dilma fazem há treze anos seguidos o mais agressivo governo em favor da minoria já visto neste país; disfarçam isso com falatório de palanque, mas seu grande programa, na verdade, foi o “Concentra Brasil”.
Ambos tentam tudo, agora, para salvar o que podem da sua opção por 200 anos de atraso. Mas estão tocando a Marcha Fúnebre. Não haverá uma nova Dilma. E não haverá outro Lula depois desse.

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

"Com Dilma à frente, o Brasil segue em queda livre. E rápida" ... J R Guzzo




23/10/2015
 às 15:11 \ Opinião

J. R. Guzzo: Com Dilma à frente, o Brasil segue em queda livre. E rápida

Publicado na revista EXAME
J. R. GUZZO
Eis aí o Brasil, mais de três anos antes do dia previsto para o tão esperado encerramento do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, empenhado num vigoroso sprint ladeira abaixo. A corrida já começou faz tempo, como todo mundo sabe, e ainda tem muito chão pela frente até a linha da chegada, mas provavelmente está num dos seus melhores momentos ─ ganhou aquele impulso natural e crescente que a força da gravidade, esta velha conhecida de todos nós, impõe às coisas que estão caindo. Se subiu tem de descer, anotava Raul Seixas em suas observações gerais sobre o funcionamento da vida, e é isso, precisamente, o que está acontecendo neste 2015 que entra em sua reta final.
Com uma particularidade: o presente governo, reeleito um ano atrás, começou a cair antes mesmo de concluir a subida. Teria chegado ao fundo do poço? Ninguém é louco para se arriscar com palpites assim, não nesta revista; não dá para saber a profundidade exata do poço, e a Redação está formalmente instruída a não se meter com equações que só têm a incógnita. O certo, pelo registro dos fatos, é que a economia e a politica estão em pleno acordo para se manter em queda ampla, livre e rápida. Esperar qualquer outra coisa é perda de tempo.
A mensagem que o governo Lula-Dilma-PT está passando aos cidadãos brasileiros, junto com o Congresso Nacional, o Supremo Tribunal Federal, os partidos e quem mais consegue mandar em alguma coisa neste país, é a seguinte: “Não esperem nada daqui. Não vamos ajudar ninguém em coisa nenhuma. Governar, então, nem pensar. Estamos cuidando exclusivamente de nós mesmos. O Brasil que vá para o diabo que o carregue. Virem-se”. A presidente da República não governa, pois não trabalha – dedica 100% do tempo à atividade de não ser deposta, mesmo porque a última coisa de que precisa é tornar-se uma ex-presidente e, portanto uma cidadã igual aos demais brasileiros, nestes momentos de trovoada que se formam a partir da legislação penal.
O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha – que virou de fevereiro para cá o grande inimigo do governo e do PT, depois de passar a carreira toda na mais perfeita paz com ambos, e talvez esteja a caminho de tornar-se um grande amigo de novo – concentra todos os seus esforços em salvar o próprio couro. O PT só pensa em grudar-se em seus empregos, acesso a verbas públicas e oportunidades de negócio com a máquina do Estado. Lula está plenamente empenhado em safar-se da maré enchente de denúncias contra dois filhos, um sobrinho, uma nora e sua própria atuação como lobista de empreiteiras. Os líderes da oposição têm como prioridade eliminar-se uns aos outros. Os tribunais de justiça querem mandar na vida política. A única proposta concreta que o governo tem para oferecer à população é criar de novo o imposto do cheque. Os ministros, sem exceção, dizem que é impossível lidar com um único problema urgente porque não têm dinheiro – e o pior é que não têm mesmo. Enfim: põe ladeira abaixo nisso.
Todos os personagens responsáveis por esse angu têm em comum, entre si mesmos, a perfeita convicção de que não são responsáveis por absolutamente nada, o que torna inútil qualquer tentativa de apresentar-lhes os fatos – é como dar um espelho a um cego. Dilma quebrou o Brasil com uma inépcia jamais atingida antes dela, mas acha que não tem nada a ver com nenhum dos desastres que criou; diz que “a sociedade” tem de resolver os problemas e, enquanto isso, revela-se desapontada com as dificuldades que existem para estocar o vento. Lula declara que receber dinheiro de empresas comprovadamente culpadas de atos de corrupção é um atividade “patriótica”, e da qual tem “orgulho”. A solução que ele e seu partido têm para a crise politica é comprar aliados através da privatização do aparelho do Estado; para a crise econômica recomendam dobrar os erros já testados por Dilma nos últimos cinco anos.
É tempo de murici, como dizia o coronel Tamarindo em sua retirada na Guerra de Canudos. Cada um que cuide de si.