Exagero ou realismo? Retrato da violência durante Jogos divide mídia e opiniões nas redes
- Há 39 minutos
O Rio de Janeiro é uma cidade violenta: um roubo a cada cinco minutos e 1,5 mil homicídios/ano é a média recente.
Também é sede de um evento grandioso, com 10,5 mil atletas de 206 países, 42 modalidades, 1 bilhão de espectadores pelo mundo - e que ocorre pela primeira vez na América do Sul.
Como era previsível em uma competição desse porte, espalhada por 32 pontos na cidade, a narrativa esportiva vem se misturando à crônica policial.
Mas enfatizar a violência que circunda os Jogos é histeria da mídia ou simplesmente realismo? É síndrome de vira-lata do brasileiro, esnobismo gringo ou espírito prático?
O debate repercutiu na mídia internacional e nas redes sociais nos últimos dias, alimentado por casos como o do ataque de traficantes a policiais da Olimpíada que entraram por engano numa comunidade do Complexo da Maré.
"Tiroteios em favelas e janelas de ônibus de mídia quebradas: mais violência irrompe durante a Olimpíada do Rio", foi o título de texto do jornal americanoWashington Post.
O texto assinado pelo correpondente no Rio, Dom Phillips, e pelo chefe do escritório do jornal no México, Joshua Partlow, considera que os incidentes recentes "levantaram novas preocupações sobre segurança" na competição.
Paranoia carioca?
Por outro lado, com os Jogos chegando ao final da primeira semana, houve quem resolvesse a equação "experiência real + percepção de violência" de forma diferente.
"O Rio é o lugar perigoso mais seguro que você irá visitar. Nada parece remotamente ameaçador ao andar pelas ruas aqui - até você circular com alguém do Rio", escreveu David Segal, do New York Times, em texto publicado na edição impressa do jornal nesta quinta-feira.
Em tom bem-humorado, o jornalista descreve o que considera um exagero dos cariocas em relação à segurança.
"Você irá saber (ao conversar com um local) que está cercado por uma variedade terrível de perigos, incluindo ladrões com facas. A praia de Copacabana parece um paraíso de roupas minimalistas. Mas aí te contam sobre os jovens bandidos que de vez em quando tomam a areia e roubam tudo o que não está escondido ou enterrado."
A conclusão de Segal sobre segurança no Rio: "Quanto menos você conversar com cariocas, mas irá gostar desse lugar."
Histeria da mídia?
Publicações em redes sociais ecoaram argumento semelhante, ao criticar o que consideram exposição excessiva da violência carioca.
"Americanos estão preocupados com a violência no Rio, embora 19 pessoas tenham sido baleadas em Chicago hoje e vejo pouca cobertura sobre isso", foi um tuíte do ShowerThoughts, um canal do Reddit, comunidade de fóruns onde usuários votam no conteúdo.
"Fatos idênticos quanto acontecem em outras cidades brasileiras não tem a mesma repercussão (...) O Rio é a cidade mais visada, mais vigiada pela mídia", escreveu um usuário brasileiro no Facebook.
Quem inaugurou o divã da mídia nesta Olimpíada foi Teddy Greenstein, repórter doChicago Tribune, numa reportagem intitulada "Quando o assunto é a segurança nos Jogos do Rio, a histeria da mídia foi o verdadeiro crime".
Em texto publicado na segunda-feira e que circulou amplamente nas redes sociais, Greenstein criticou reportagens que preveriam um apocalipse de criminalidade durante a competição.
Seu alvo principal era uma reportagem do jornal britânico The Telegraph, que há uma semana informou que os Jogos do Rio "estavam no caminho para serem os de maior criminalidade" da história.
"Histórias como essa deram o tom da narrativa. Amedrontaram fãs olímpicos em relação a vir (ao Rio), levando a assentos vazios nas arenas", escreveu Greenstein, em crítica ao suposto alarmismo do relato.
O repórter cita Casey Patterson, atleta americano do vôlei de praia, e a experiência pessoal de caminhar por Copacabana à noite após abandonar um táxi em meio a um congestionamento.
"Enquanto andava atrás de outro táxi, Copa tinha uma vibração parecida com o Upper East Side de Nova York à noite. Não é o lugar mais seguro do mundo, mas dificilmente é ameaçador."
"Sim, há crime no Rio. Esta é uma cidade de 6,3 milhões de habitantes onde, infelizmente, desemprego alto e extrema pobreza existem. (...) Mas chega de histórias em busca de cliques que pintam esse lugar como uma espécie de apocalipse urbano", concluiu.
Mas para muitos brasileiros que se manifestaram sobre o assunto em redes sociais, qualquer tentativa de minimizar episódios de violência é "dourar a pílula" da realidade do Rio e do Brasil.
"É furo de bala perdida na sala de imprensa, ônibus olímpico baleado, piscina verde, torcida vaiando adversários a troco de nada, delegação chinesa no meio de tiroteio e ainda dizem que esta Olimpíada está sendo um sucesso", escreveu Priscila da Silveira Santos em comentário na página da BBC Brasil.
Violência na pele
Do mesmo modo como repórteres que se sentiram seguros no Rio fizeram relatos nesse sentido, quem vivenciou alguma situação de perigo procurou destacar a insegurança.
"Um atentado aos Jogos, a ninguém mais", escreveu o repórter do jornal argentino La Nación Gastón Saiz, em texto em primeira pessoa sobre o ataque na terça-feira ao ônibus que fazia o trajeto entre o centro olímpico de Deodoro e um setor de imprensa.
Saiz descreve como um policial (e a versão oficial) apontou que o veículo foi atingido por uma pedra, embora essa não tenha sido a impressão do repórter. "Pareceram dois impactos de bala de baixo calibre, de acordo com os orifícios observados nas janelas."
No relato do diário americano Wall Street Journal, autoridades estão "lutando" para conter crimes violentos no Rio apesar da maior mobilização de segurança na história da cidade
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