sexta-feira, setembro 11, 2015
"Brasilien Land der Zukunft"
De volta ao eterno país do futuro -
MÁRCIO GARCIA
VALOR ECONÔMICO - 11/09
Não foi surpresa, ainda que tenha vindo antes do que se esperava. Aqueles que vinham alertando para os crescentes erros de política econômica dos governos do PT, desde a substituição de Palocci por Mantega, em 2006, podem experimentar o consolo de ter alertado para o desastre iminente. Mas isso, é claro, é o regozijo do desesperado passageiro que tivesse avisado que o Titanic estava em rota de colisão com o iceberg.
O importante, agora, é o que fazer para que o país supere a crise e volte a crescer. Infelizmente, as perspectivas continuam muito sombrias. As entrevistas das principais autoridades após o rebaixamento pela S&P mostram uma cacofonia preocupante.
O ministro da Fazenda, no Jornal da Globo, enfatizou reiteradamente a necessidade imperiosa de fazer escolhas que forcem os gastos públicos a caberem no PIB. Referiu-se, especificamente, à necessidade de passar da discussão infindável à ação imediata, com o Executivo apontando exatamente onde cortar os gastos públicos. Soou como um apelo de um médico que não consegue implementar o tratamento que julga fundamental para salvar o paciente.
O ministro do Planejamento, um dos mentores da malfadada Nova Matriz Econômica foi, por ironia do destino, porta-voz da reação oficial ao rebaixamento pela S&P. Tentou, naturalmente, minimizar o estrago. Recentemente, vem afirmando que o ajuste fiscal só pode ser feito com o país crescendo. Tal afirmativa é, na melhor das hipóteses, uma tautologia. A estagflação que ora vivemos é, em grande medida, fruto da enorme incerteza gerada pela política econômica equivocada e errática. Sem a percepção de que há um norte e que o governo vai persistir em obter o equilíbrio fiscal a despeito das conhecidas dificuldades, o investimento não vai se recuperar, o país não voltará a crescer, e a situação fiscal se agravará. O ministro do Planejamento prestaria grande serviço ao país se trocasse seu discurso dúbio por ações claras em prol do ajuste fiscal, sua responsabilidade primeira.
Já a presidente, em extensa entrevista ao Valor, perdeu mais uma grande oportunidade de mostrar que seu governo já não está sem rumo. Continua sem reconhecer minimamente os erros de seus governos. Elogia as políticas de desonerações casuísticas, sem redução correspondente dos gastos. Exalta o despejo de centenas de bilhões do Tesouro no BNDES, sem que a taxa de investimento tenha subido. Rotula tais medidas de contracíclicas, sem mencionar que tiveram seu auge justamente em 2010, quando a economia estava no vermelho, crescendo a 7,6%. Atribui o desastre atual à crise externa, cuja extensão e profundidade teria sido mal avaliada pelo governo, e à consequente queda nos preços de commodities. Afirma ter feito corte de gastos e reclama da rigidez orçamentária, como se fosse novidade. Evita os temas espinhosos, como o efeito do aumento real do salário mínimo sobre a previdência, como se fosse possível empurrá-los mais um pouco com a barriga. Definitivamente, não parece ter se dado conta da gravidade da crise econômica atual.
Sem descer aos detalhes que seu ministro da Fazenda diz serem fundamentais para amarrar o compromisso do governo com o ajuste fiscal, afirma genericamente que obterá um superávit primário de 0,7% do PIB em 2016. Espero estar errado, e que, de fato, os projetos com os cortes de despesas obrigatórias sejam enviados ao Congresso Nacional e que o governo invista seu depauperado capital político em aprová-los. Seria uma excelente surpresa.
Infelizmente, contudo, o cenário mais provável é mais do mesmo, com o governo titubeando entre opções mutuamente exclusivas, aumentando a incerteza e prolongando a recessão. Neste cenário, um dos riscos relevantes, a médio prazo, é a ameaça de acabarmos por voltar a recorrer ao financiamento inflacionário do déficit público, a terrível dominância fiscal que nos levou à hiperinflação.
Stefan Zweig ficaria certamente decepcionado em ver o Brasil, novamente, queimando mais uma possibilidade de deixar de ser um eterno país do futuro.
*Márcio Garcia, Ph.D. por Stanford, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio
Pela reação do governo após o rebaixamento do Brasil para grau especulativo, a crise deve se aprofundar
Não foi surpresa, ainda que tenha vindo antes do que se esperava. Aqueles que vinham alertando para os crescentes erros de política econômica dos governos do PT, desde a substituição de Palocci por Mantega, em 2006, podem experimentar o consolo de ter alertado para o desastre iminente. Mas isso, é claro, é o regozijo do desesperado passageiro que tivesse avisado que o Titanic estava em rota de colisão com o iceberg.
O importante, agora, é o que fazer para que o país supere a crise e volte a crescer. Infelizmente, as perspectivas continuam muito sombrias. As entrevistas das principais autoridades após o rebaixamento pela S&P mostram uma cacofonia preocupante.
O ministro da Fazenda, no Jornal da Globo, enfatizou reiteradamente a necessidade imperiosa de fazer escolhas que forcem os gastos públicos a caberem no PIB. Referiu-se, especificamente, à necessidade de passar da discussão infindável à ação imediata, com o Executivo apontando exatamente onde cortar os gastos públicos. Soou como um apelo de um médico que não consegue implementar o tratamento que julga fundamental para salvar o paciente.
O ministro do Planejamento, um dos mentores da malfadada Nova Matriz Econômica foi, por ironia do destino, porta-voz da reação oficial ao rebaixamento pela S&P. Tentou, naturalmente, minimizar o estrago. Recentemente, vem afirmando que o ajuste fiscal só pode ser feito com o país crescendo. Tal afirmativa é, na melhor das hipóteses, uma tautologia. A estagflação que ora vivemos é, em grande medida, fruto da enorme incerteza gerada pela política econômica equivocada e errática. Sem a percepção de que há um norte e que o governo vai persistir em obter o equilíbrio fiscal a despeito das conhecidas dificuldades, o investimento não vai se recuperar, o país não voltará a crescer, e a situação fiscal se agravará. O ministro do Planejamento prestaria grande serviço ao país se trocasse seu discurso dúbio por ações claras em prol do ajuste fiscal, sua responsabilidade primeira.
Já a presidente, em extensa entrevista ao Valor, perdeu mais uma grande oportunidade de mostrar que seu governo já não está sem rumo. Continua sem reconhecer minimamente os erros de seus governos. Elogia as políticas de desonerações casuísticas, sem redução correspondente dos gastos. Exalta o despejo de centenas de bilhões do Tesouro no BNDES, sem que a taxa de investimento tenha subido. Rotula tais medidas de contracíclicas, sem mencionar que tiveram seu auge justamente em 2010, quando a economia estava no vermelho, crescendo a 7,6%. Atribui o desastre atual à crise externa, cuja extensão e profundidade teria sido mal avaliada pelo governo, e à consequente queda nos preços de commodities. Afirma ter feito corte de gastos e reclama da rigidez orçamentária, como se fosse novidade. Evita os temas espinhosos, como o efeito do aumento real do salário mínimo sobre a previdência, como se fosse possível empurrá-los mais um pouco com a barriga. Definitivamente, não parece ter se dado conta da gravidade da crise econômica atual.
Sem descer aos detalhes que seu ministro da Fazenda diz serem fundamentais para amarrar o compromisso do governo com o ajuste fiscal, afirma genericamente que obterá um superávit primário de 0,7% do PIB em 2016. Espero estar errado, e que, de fato, os projetos com os cortes de despesas obrigatórias sejam enviados ao Congresso Nacional e que o governo invista seu depauperado capital político em aprová-los. Seria uma excelente surpresa.
Infelizmente, contudo, o cenário mais provável é mais do mesmo, com o governo titubeando entre opções mutuamente exclusivas, aumentando a incerteza e prolongando a recessão. Neste cenário, um dos riscos relevantes, a médio prazo, é a ameaça de acabarmos por voltar a recorrer ao financiamento inflacionário do déficit público, a terrível dominância fiscal que nos levou à hiperinflação.
Stefan Zweig ficaria certamente decepcionado em ver o Brasil, novamente, queimando mais uma possibilidade de deixar de ser um eterno país do futuro.
*Márcio Garcia, Ph.D. por Stanford, professor do Departamento de Economia da PUC-Rio
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