Usain Bolt: O que treinadores, colegas e rivais acham do homem mais rápido do mundo
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A única vez que Usain Bolt foi lento na vida foi quando o jamaicano chegou ao mundo, dez dias após a data prevista.
Sua mãe, Jennifer, diz que sabia que o filho era especial desde que ele tinha três semanas de vida - uma opinião muito comum entre pais, mas que no caso dela se confirmou. Ela viu seu filho se tornar o homem mais rápido da Terra.
Usain Bolt está tentando uma tripla vitória no Rio. Já conseguiu os 100m, no último domingo. Agora ele também tentará os 200m e o 4x100m, nos Jogos que o atleta, de 29 anos, diz que serão seus últimos.
O "raio" percorreu um longo caminho desde que começou a correr em Trelawney, na Jamaica, e chorava quando perdia uma corrida.
"Ele não gosta de perder", disse o pai, Wellesley, à BBC Sport.
Com sete ouros olímpicos, 11 títulos mundiais e diversos recordes, parece não ter havido muito tempo para lágrimas em sua carreira.
"Ele tinha uns cinco anos quando percebemos que estava disputando com os colegas de turma e sempre ganhava", diz Jennifer. "Ele ficava sempre em primeiro. Percebemos que seria um grande atleta."
Na escola
Mais tarde, já no ensino médio, Bolt tinha mais interesse em jogar críquete do que treinar na pista de atletismo. Estava "tão apaixonado" pelo esporte que "não queria fazer nenhuma outra coisa".
Mas uma professora de educação física, Lorna Thorpe, o aconselhou a focar no atletismo, já que ele "tinha uma mina de ouro nas pernas".
E o campeão, hoje, agradece muito o conselho da professora.
"Ela é como uma segunda mãe para mim", diz.
"Quando eu estava no ensino médio ela cuidava de mim, garantindo que tudo estava ok, sempre focada. Ela teve um papel muito importante."
Mas a diretora à época, Lorna Jackson, conta que teve que dar conselhos a Bolt em outra área: mulheres.
Ela contou ao jornal britânico Sunday Telegraph que Bolt era muito próximo de uma garota que o ajudava nas redações.
"Mas aí disseram que ele tinha uma namorada em uma escola vizinha. Falei para ela: não escreva mais nada para ele!", brinca.
Ela também ensinou espanhol ao atleta porque sabia que ele "viajaria muito e precisaria de espanhol".
Aos 15 anos, Bolt virou "o assunto" no mundo do atletismo ao correr os 200m no Mundial júnior na Jamaica, em 2002, contra homens quatro anos mais velhos.
Ele venceu e virou o medalhista júnior mais novo da história. Também ganhou o prêmio de "estrela em ascensão" da Associação Internacional de Federações de Atletismo.
Faculdades americanas correram para oferecer bolsas de estudos para Bolt - e agentes esportivos lhe ofereceram contratos.
O irlandês Ricky Simms era um jovem agente que havia acabado de assumir uma das grandes empresas esportivas do mundo. Ele conseguiu assinar com o jamaicano.
"Após o ensino médio, atletas jamaicanos constumam ir para a universidade nos Estados Unidos e passam quatro anos lá antes de virarem profissionais", explica Simms. "Mas ele decidiu virar profissional em 2003."
Mas o início da vida profissional de Bolt não foi tão fácil - o adolescente às vezes ficava tão nervoso antes de corridas que chorava.
"Quando conversamos, ele parou de chorar e disse: 'Vou fazer o melhor que puder'", contou a mãe, Jennifer, à rede americana CNN, sobre o campeonato júnior de 2002.
Inspiração
O futuro parecia favorecer Justin Gatlin quando o velocista americano, que já tinha sido suspenso por doping, ganhou os 100m aos 22 anos em 2004 e o adolescente Usain Bolt foi eliminado nas classificatórias dos 200m.
Mas eis que, nos Jogos de 2008, em Pequim, Gatlin estava no meio de uma suspensão de quatro anos por doping e Bolt havia se firmado em cena, destruindo o tempo que o americano havia feito em Atenas e ganhando suas três primeiras medalhas de ouro.
Gatlin ficou com o bronze quando Bolt defendeu seu título nos 100m em Londres 2012, e no Mundial do ano passado a rivalidade deles foi renovada quando o jamaicano venceu o americano por 0,01 segundo.
"Ele (Bolt) provou que, quando está por baixo, consegue dar a volta por cima, e quando está em cima, ele está no topo", Gatlin disse à NBC. "É o tipo de pessoa que te faz querer seguir. Ele me deu uma visão de onde preciso estar".
As mães deles se conheceram no Mundial em Pequim e agora são amigas. Apesar da rivalidade nas pistas, os filhos também gostam da companhia um do outro.
"A gente relaxa e se diverte fora das pistas, mas quando pisamos ali, queremos vencer", afirma Gatlin.
O mentor
Os colegas jamaicanos de Bolt não são nem de forma alguma lentos. Entre 2005 e 2008, Asafa Powell quebrou o recorde mundial duas vezes. Já o ex-campeão mundial Yohan Blake ganhou a prata tanto nos 100m quanto nos 200m em Londres em 2012 (e ficou em quarto na competição de domingo no Rio).
Embora com Bolt eles tenham mais chances de ganhar o ouro no revezamento 4x100m, eles sabem que o "raio" abocanha todas as medalhas individuais.
Ele foi o primeiro atleta a ganhar ouros tanto nos 100m quanto nos 200m e já tem sete títulos mundiais desde 2009, perdendo apenas os 100m de 2011 quando foi desclassificado por queimar a largada.
Então será que os companheiros de equipe dele se sentem ameaçados ou frustrados por não conseguirem ganhar?
"É bom para o esporte ter ele, já que ele é o número 1 do mundo e recordista", disse Powell, que não vai correr no Rio. "Somos amigos desde antes dos recordes mundiais e das Olimpíadas. Nada mudou, ele só ficou bem mais famoso."
E quando Powell terminou em um decepcionante sétimo lugar no Mundial do ano passado, Bolt mandou uma mensagem de apoio.
"Força, irmão. As pessoas não entendem esse caminho e o sacrifício que fazemos", tuitou.
Enquanto Blake, três anos mais novo que Bolt, entrava em cena, o futuro campeão olímpico já agia como mentor de seu prodígio adolescente.
Bolt assistia enquanto Blake ganhava uma corrida juvenil na Jamaica em 2008, dizendo ao jovem recém-chegado ao grupo para não se desgastar muito, porque "ele ainda tinha uma grande carreira pela frente".
Blake disse à Newsweek que ficou surpreso por Bolt saber quem ele era. "Eu fiquei muito feliz (com seus conselhos)".
O piadista
Glen Mills foi técnico-chefe da equipe nacional da Jamaica por 22 anos. Ele treinou atletas que conquistaram mais de 100 campeonatos mundias e medalhas olimpícas - número favorecido pelas conquistas de Bolt.
Após a decepção na estreia olímpica em Atenas, Bolt recorreu a Mills e seus mais de 40 anos de experiência.
"Ele é uma atleta abençoado", disse Mills ao Speed Endurance. "Quando comecei a trabalhar com ele, uma das coisas que se destacavam era sua técnica, muito ruim. Ele corria fora do centro de equilíbrio. Isso trazia uma força negativa que afetava outras áreas".
"Começamos a gravar os treinos, para ver em câmera lenta o que ele fazia. Eu desenhava diagramas com as posições que ele deveria atingir", contou.
A determinação de Bolt para melhorar acabou transformando-o em uma estrela global, e ele fez tudo isso com um sorriso no rosto.
"Ele trabalha muito duro", disse Mills ao jornal britânico Evening Standard. "Ele mistura isso com sua personalidade jovial. Mas as pessoas precisam saber que ele leva treinos e corridas muito a sério", afirmou.
E como é competir com Bolt?
"Ficamos pasmos com o que tinha acontecido", disse Darvis Pattons, 8º em Pequim, à Sports Illustrated sobre a noite em que Bolt ganhou seu primeiro ouro olímpico e bateu o recorde mundial no caminho.
"A forma (como foi a corrida). Ele correu 9,6 (segundos). E comemorando."
Marc Burns, de Trinidad e Tobago, acrescentou: "Eu estava me preparando para cruzar a linha de chegada quando ouço esse barulho e vejo Bolt já do outro lado, celebrando."
O futuro do homem mais rápido do mundo
A família Bolt ainda mora em Trelawney, onde o pai dele ainda trabalha na lojinha local. O filho mais famoso da localidade sempre é bem recebido quando volta.
Seu melhor amigo, Nugent Walker, diz que Bolt "nunca esqueceu de onde ele vem". A fundação do ídolo oferece ônibus e computadores para sua ex-escola e pagou pela reconstrução de um centro de saúde próximo.
"A Jamaica deu muita base para ele", acrescenta. "Os pais dele passaram valores importantes: respeitar as pessoas, cuidar delas. Ele é muito gentil - até gentil demais, alguns diriam."
"Acho que ele não percebe muito que é uma estrela. Certa vez, na França, fomos para um lobby (de hotel) e havia muita gente esperando do lado de fora. Ele perguntou para o porteiro: 'Quem eles estão esperando?'. O porteiro respondeu: 'Você'".
A mãe dele, Jennifer, diz que ele passa bastante tempo com a família quando não está correndo, mas que a aposentadoria pode trazer uma situação diferente.
"Ele vai poder ir e vir o quando quiser", diz Jennifer. "As pessoas sempre querem estar perto dele, não para machucá-lo, mas para estar perto."
Ela diz que ele ainda é aquele mesmo menino que ganhou o campeonato júnior em 2002 - e que ainda escuta seus pais.
Mas Wellesley, que assume o crédito pelos passos de dança do filho, diz que com o sucesso ele virou "mais um entertainer".
A mãe gostaria que ele virasse um embaixador do esporte.
"Ele traz diversão para o esporte", diz. "Sem ele, quem vai assumir esse papel? Vai ficar chato."
E sobre mais um membro na família Bolt? Seus pais dizem que estão confiantes de que serão avós logo, mas Bolt se mantém discreto sobre a identidade da mulher que namora há dois anos.
"É por isso que ele quer se aposentar cedo", diz o pai. "Ele quer fazer uma família."
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