Aos inimigos, a lei
O impeachment se arrasta como farsa jurídica, com depoimentos de peritos que são basicamente irrelevantes
Ignacio Cano, El País
Reza o ditado popular brasileiro que aos amigos devemos tudo e aos inimigos, a lei. Implicitamente, entende-se que não podemos aplicar aos amigos a mesma lei que reservamos aos inimigos ou, ao menos, não da mesma forma. A máxima é perfeita para entender o processo político que o Brasil vive hoje.
Na verdade, a despeito da sua imagem de dama cega e implacável, a justiça penal é sempre seletiva, pois a aplicação sistemática da lei a todos os supostos infratores seria materialmente impossível, pela falta de recursos, e extremamente inconveniente.
Se todos os indivíduos que cometeram alguma vez algum tipo de infração fossem simultaneamente processados e condenados, numa eficácia penal absoluta, a sociedade seria ingovernável.
Por isso, os operadores de justiça criminal costumam priorizar os casos seguindo um critério de oportunidade, dando preferência aos delitos mais graves. Mas, se a aplicação da lei é necessariamente seletiva, ela precisa ser isonômica para poder ser legítima, isto é, precisa ser aplicada a todos sob as mesmas condições. Caso contrário, a lei deixa de ser um limite comum para regular a conduta dos indivíduos e torna-se um instrumento da ação política.
Grupo a favor de Dilma no dia da votação do impeachment na Câmara (Foto: Mario Tama / Getty