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sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Guerra da civil da Síria contada por brasileira...!

http://www1.folha.uol.com.br/mundo/1149882-brasileira-conta-como-fugiu-de-aleppo-em-meio-a-guerra-civil.shtml

07/09/2012 - 05h45

Brasileira conta como fugiu de Aleppo em meio à guerra civil


ESTELITA HASS CARAZZAI
ENVIADA ESPECIAL A FOZ DO IGUAÇU

Onda de RevoltasA brasileira Priscila Eroud Ibrahim Bacha, 25, morava havia quatro anos em Aleppo, norte da Síria, quando estourou a guerra civil no país. Ela e o marido, o sírio Mohamed Eikmat Ibrahim Bacha, 36, além dos filhos Najla e Orfan, de sete e cinco anos, fugiram do país com a ajuda da embaixada brasileira, que conseguiu as passagens. Os quatro chegaram ao Brasil na semana passada.
*
Eu nasci em São Paulo e passei minha infância lá, depois vim para Foz. Noivei e casei aqui, com 16 anos. Meus dois filhos nasceram em Foz.
Depois de quatro anos, apareceu uma oportunidade de trabalho para o meu marido na Síria --e ele estava com muita saudade da família dele, que vive lá.
Fomos morar em Aleppo, no bairro Seif al-Dawla, um dos bairros que mais estão sendo atacados agora. A gente abriu duas lojas de internet; aqui chamam lan house.
Aleppo é uma cidade enorme [tem cerca de 3 milhões de habitantes]. Era lindo, era seguro.
Roberto Lemos/Folhapress
Priscila Eroud Ibrahim Bacha, 25, conta como era viver no meio da guerra
Priscila Eroud Ibrahim Bacha, 25, conta como era viver no meio da guerra
SORVETE
A gente saía para tomar um sorvete, sentava na avenida e ficava conversando até quatro, cinco horas da manhã.
No começo do ano as coisas começaram a piorar. Dava para escutar os tiros de longe, as bombas, os aviões. Mas tínhamos certeza que não chegaria até nós. É que Aleppo é grande. Continuávamos com a vida normal.
No dia 3 de agosto, uma sexta-feira, senti que tinha alguma coisa acontecendo lá fora. Eram umas 14h30 quando olhei pela janela. Achei que era passeata, que sempre tinha. Mas aquela passeata estava diferente: os rebeldes estavam atrás, com armas.
Naquela hora, eu percebi que eram rebeldes, pelas roupas que estavam vestindo. Porque eles não são sírios; a maioria é de fora. O comandante dava para ver que era tipo um paquistanês, até pela roupa. E pela cara: era a cara de uma pessoa ruim.
Eram umas oito pessoas. Depois, tomaram conta da escola, em frente à minha casa, e ficaram. Foram chegando pessoas ali, foi aumentando.
À noite, começaram os tiros. A gente estava sentado no sofá. Quando começaram a atirar, fomos todos para o chão. Sabe quando alguém pula na piscina? Assim que eu fui, para a piscina. Bati com tudo.
Eu não conseguia nem sair do lugar, de susto. Minha cunhada me puxou, puxamos meus filhos pela perna e fomos agachados para o corredor. Era muito barulho, começou a entrar tiro dentro de casa. A gente não conseguia nem falar.
PARA ONDE VAMOS?
Depois que passou, ficamos desesperados: para onde vamos agora? Liguei para minha mãe, no Brasil, e disse: "Pelo amor de Deus, me tira daqui. Chegaram, a guerra chegou". Ela fez contato com a embaixada, aí a embaixada começou a fazer contato comigo.
Não dormimos nem um minuto. Como vou dormir com aviões, bombas, tiroteio a noite toda, telefonemas?
No dia seguinte, fomos para a casa do tio do meu marido. Ele também mora em Aleppo, mas em outro bairro.
A gente teve que andar muito, não sei quantos quilômetros, até achar uma rua aberta. Carro não entra.
Os rebeldes entram, colocam uma bandeira preta em cada ponto, colocam armas, fecham todas as ruas e não pode mais chegar carro. Quem quer fugir pode, mas a pé. Está cheio de refugiado nas ruas.
FRONTEIRA
Ficamos uma semana no tio do meu marido, até que a embaixada brasileira pagou as passagens de avião, de Aleppo a Damasco. Depois, um carro da embaixada nos levou até a fronteira do Líbano.
Lá no Líbano não tem lugar para dormir. O que tem está cheio de sírios. Quem tem condição de ficar em hotel fica. Mas a maioria está em barraquinha.
Tem muito fogos de artifício lá, todo dia; eles adoram. E, todo dia, a minha filha corria porque achava que era bomba caindo.
A gente acha que as crianças não entendem, mas entendem melhor que nós. Choraram, sofreram... Meu filho emagreceu muito.
Trouxemos quatro malas. Só roupa. Ficaram a loja, os computadores, a casa, minhas lembranças, o dinheiro... Foi tudo.
Paramos na frente da televisão e começamos a ver Seif al-Dawla. O bairro onde a gente morava, tomava sorvete... É impressionante, destruíram tudo.
Eu falo para os jornalistas: não sou contra nem a favor. A única coisa que posso falar é que a gente estava tranquilo até que chegaram os rebeldes. Depois é que vieram os aviões do Bashar [Assad, ditador sírio].
Ficamos sabendo que a casa onde eu morava com meus sogros foi bombardeada. Explodiu tudo. Lustre de bronze, de 120 anos, derreteu. Os dois gatinhos do meu sogro viraram carvão.
O Brasil é o recomeço, nasci de novo. Eu fiquei quatro anos lá, fiz a vida lá, para nada. Vim aqui no zero. Síria, para mim, nunca mais.
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