O PT e o dinheiro dos outros
Os gestores dos fundos são indicados pelo governo, acionista majoritário das estatais, e a maioria deles é entregue ao PT
Definitivamente, estamos num país estranho. Somos governados por um partido de trabalhadores, e o Congresso acaba de aprovar o primeiro item de um ajuste fiscal que restringe alguns direitos dos trabalhadores.
Mais estranho ainda: os aliados sindicais do partido que está no poder ocuparam as galerias do Congresso e fizeram chover sobre as cabeças dos deputados notas falsas com a efígie do fundador e guru do partido, o ex-sindicalista Lula, e da atual presidente, Dilma Roussef. As notas falsas eram chamadas de PTrodólares.
Mas as coisas estranhas não pararam por aí: a primeira medida do ajuste fiscal só foi aprovada porque 16 dos deputados da dita oposição- 8 do DEM, 7 do PSB e 1 do Solidariedade- votaram a favor dela. Mais estranho ainda: da base aliada, 9 deputados do PT fugiram do plenário e 1 votou contra; do PMDB, 13 votaram contra; no PDT, que tem o ministério do Trabalho, os 19 deputados votaram contra; no PP, 18 votaram contra; e no PTB, 12 votaram contra.
Ou seja: o governo só conseguiu aprovar a medida que restringe o acesso ao seguro desemprego e ao abono salarial graças a 16 votos da oposição. Ganhou por 252 a 227. Se dependesse apenas de sua base e se os votos oposicionistas tivessem ficado na oposição, teria perdido por 243 a 236.E o PDMB ainda se vangloriou de ter obrigado o PT “a descer do muro” para conseguir aprovar a medida.
Isso quer dizer que os liberais e os socialistas se juntaram aos peemedebistas e aos petistas para votar contra direitos dos trabalhadores ? Um total consenso, que é bem o retrato da vã filosofia da política partidária no Brasil. Se não fosse assim, disse
Rodrigo Maia, uma das lideranças do DEM que votaram a favor do governo, “o país quebraria no dia seguinte”. Enfim, um patriota ou um traidor?
Haverá, assim, uma espécie de divórcio conceitual entre os trabalhadores reais e o partido que pretende representá-los?
O caso dos fundos de pensão das estatais é um exemplo escandaloso desse divórcio. A maioria deles, vítimas de gestões temerárias, apresentam pesados déficits que ameaçam a aposentadoria complementar para a qual os trabalhadores contribuem mensalmente.
Os gestores dos fundos são indicados pelo governo, acionista majoritário das estatais, e a maioria deles é entregue ao PT. Os fundos estão sujeitos à fiscalização da Superintendência Nacional da Previdência Complementar, que normalmente toma conhecimento dos erros de gestão quando estes já se tornaram escandalosamente irreparáveis.
Foi o que aconteceu com o fundo dos funcionários dos Correios, o Postalis, que acusou um rombo de 5,6 bilhões de reais. Para cobrir esse buraco, os trabalhadores terão que sofrer descontos adicionais no salário durante um prazo de 15 a 20 anos.
Não é tarefa fácil para um fundo de investimentos, com tantas opções no mercado, conseguir perder dinheiro. Só mesmo com uma gestão desastrosamente incompetente, mal intencionada, ou amarrada a motivações políticas inconfessáveis. Algum gestor de fundos, no uso pleno de faculdades mentais, investiria em títulos de bancos liquidados, como Cruzeiro do Sul ou BVA, ou em compra de títulos lastreados na dívida da Argentina (notória caloteira) ou da Venezuela?
A oposição está tentando instalar um CPI dos Fundos de Pensão no Congresso. Se conseguir, mais uma vez o PT será chamado a sentar no banco dos réus para explicar como e por que maltrata o dinheiro alheio- e no caso, especificamente, o dinheiro dos trabalhadores.