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sábado, 3 de março de 2018

Drummond na Folha de São Paulo entrevistado por Suzy, a cadelinha



AMOR AOS BICHOS

De tão amigo dos animais, poeta foi entrevistado por uma… cadela

DE SÃO PAULO
Escritor Carlos Drummond de Andrade sorri para a câmera de Fernando Sabino em cena do documentário "O Fazendeiro do Ar", de 1972
Como mostram os papéis que guardava entre os livros, Drummond era defensor dos animais. Ele teve um cachorro chamado Puck e um gato chamado Inácio.
Em 4 de outubro de 1970 –dia de São Francisco de Assis, padroeiro dos animais–, com a amiga Lya Cavalcanti, também adepta da causa, criou um veículo em defesa da bicharada, batizado de “A Voz dos que Não Falam”.
Na capa da primeira edição, guardada no IMS, Cavalcanti deixava uma oração: “Sr. São Francisco, abençoe o irmão poeta entre seus bichos mais queridos”.
Logo abaixo, Drummond publicava um poema, “Conversa com o Santo”, no qual fala das “[…] infinitas coleções de animais que sofrem em todos os lugares da terra/ e não podem dizer que sofrem, e por isto sofrem duas vezes…”.
O poeta concluía o poema assim: “Por isto, santinho nosso,/ você providencie urgente sua volta ao mundo/ para ver se dá jeito nestes seus alunos repetentes”.
Uma das curiosidades de“A Voz” é uma “entrevista” dada por Drummond ao jornalzinho, em 1973.
Já era uma época em que ele não estava disponível para ser entrevistado, e “A Voz” a anunciava com pompa -“Entrevista exclusiva com o autor que não dá entrevista nem para o ‘Pasquim’”.
Quer dizer, não eram bem uma entrevista de verdade, porque a entrevistadora era uma cadelinha chamada Suzy. Leia abaixo.
Que acha da campanha que andam movendo contra nós?
Em primeiro lugar, acho uma campanha com certa dose de covardia: o homem é infinitamente mais poderoso do que vocês. Em segundo lugar, acho injusta, porque vocês não podem ser culpados do mal que eventualmente façam ao homem, uma vez que este lhes nega a racionalidade. Em terceiro lugar chega, né?
Acha que o homem tem direito à exclusividade neste planeta?
Não. Do seu direito à coexistência com as outras espécies animais o que lhe advém é antes da responsabilidade pela sorte dos mais fracos e menos evoluídos. Que entende você por mundo cão? Entendo um mundo tornado cruel pelo homem e não pelos outros seres vivos.
Se você não fosse homem, que bicho gostaria de ser?
Eu não gostaria de ser bicho e ter de defender-me da agressividade dos não-bichos.
Acha que o homem merece o amor que lhe dedicamos?
Muitos merecem, justiça seja feita. Porém um número ainda maior é indiferente ou hostil a vocês.
Em caso negativo, que iriamos amar se não amássemos o homem (e a mulher, é claro)?
Quando o homem não merece amor, o melhor é ficar à maior distância possível deles, e cada bicho consolar-se com o seu semelhante.
Em caso afirmativo, que poderemos fazer para que ele retribua melhor o nosso amor?
Acho que não há receitas para a retribuição de amor. Quem é capaz de amar, quem nasceu para amar, não espera ser amado para começar a amar: dá logo uma de amoroso. A iniciativa não pode partir de vocês.
Gostamos muito da sua poesia, achamos você um sujeito muito bacana e muito compreensivo, e por isso gostaríamos de nomeá-lo nosso filósofo oficial. Você aceita?
Obrigado. Mas o melhor é vocês dispensarem a filosofia e continuarem simplesmente integrados na natureza -coisas que nós, supostamente superiores, raramente sabemos fazer.
Menina, com cachorro, observa atentamente a escultura de Carlos Drummond de Andrade, no Rio (Ana Carolina Fernandes/Folhapress)

terça-feira, 15 de julho de 2014

A goleada dos 7X1 vai ser um "mantra" para as instituições brasileiras....


Artigos

Enviado por Ricardo Noblat - 
15.7.2014
 | 16h15m
POLÍTICA

O legado dos 7 x 1

Gil Castello Branco, O Globo

O talento de Carlos Drummond de Andrade vai além da capacidade de transformar palavras em arte. Na semana passada, atordoado com os 7 x 1, reli a crônica “Perder, ganhar, viver”, publicada há 32 anos, na derrota do Brasil para a Itália, no Mundial de 1982.
No texto, o poeta retratou a frustração que tomou conta do país, comparável à que nos envolveu agora, nas goleadas impostas por Alemanha e Holanda.
A respeito da reação dos políticos, Drummond escreve: “...Vi a decepção controlada do presidente, que se preparava, como torcedor número um do país, para viver o seu grande momento de euforia pessoal e nacional, depois de curtir tantas desilusões de governo; vi os candidatos do partido da situação aturdidos por um malogro que lhes roubava um trunfo poderoso para a campanha eleitoral; vi as oposições divididas, unificadas na mesma perplexidade diante da catástrofe que levará talvez o povo a se desencantar de tudo, inclusive das eleições...” Nada tão atual.
Horas depois do maior atropelo da seleção brasileira em cem anos, os políticos entraram em campo e jogaram para a arquibancada. A presidente da República deu entrevista à CNN sobre a necessidade de renovação do futebol brasileiro e concluiu que “o Brasil não pode mais continuar exportando jogador”, sem explicar como irá aprisionar as jovens revelações ou repatriar Neymar, Thiago Silva, David Luiz e outros.
Pelo que imagino, será mais difícil do que congelar as tarifas de energia ou o preço da gasolina. O jornalista Franklin Martins, responsável por um dos blogs da campanha de Dilma, jogou no colo da CBF, de José Maria Marin e Ricardo Teixeira, a conta do vexame, mas exagerou na dose a ponto de a “chefa” reclamar do tom.
O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, defendeu “intervenção indireta”, mal explicada. O mais curioso é que essas propostas só agora tenham vindo à tona, apesar de o Ministério do Esporte existir desde 2003, inclusive tendo na sua estrutura, a partir de 2009, a Secretaria Especial de Futebol e Defesa dos Direitos do Torcedor.
Mudar as leis, porém, depende do Congresso Nacional e, nesse sentido, o projeto de lei original que lá se encontra é do deputado Vicente Cândido (PT/SP), por coincidência vice-presidente da Federação Paulista de Futebol para a região metropolitana e o ABCD.
No bojo, muito mais sobre a anistia das dívidas fiscais bilionárias dos times de futebol do que sobre a responsabilização dos dirigentes e entidades esportivas. Cá entre nós, o surto de oportunismo por parte das autoridades governamentais teve como única finalidade descolar as derrotas contundentes da seleção do projeto de reeleição da candidata-presidente. Afinal, as mazelas do futebol brasileiro e a patota que o comanda são conhecidas há muitos anos.
Em 2001, a CPI da CBF-Nike, presidida justamente pelo então deputado Aldo Rebelo, desvendou esse esquema de grandes negócios que enriquece cartolas à custa da penúria dos clubes, transforma jogadores em mercadoria e destrói a seleção. No livro que escreveram sobre a CPI, os deputados Aldo e Silvio Torres entraram de sola na cúpula do futebol brasileiro:
“...São milhões de dólares que rolam em contratos obscuros e desaparecem. Quanto maiores os contratos, mais endividados ficam a CBF, as federações e os clubes, enquanto fortunas privadas formam-se rapidamente, administradas em paraísos fiscais de onde brotam mansões, iates, e se alimenta o poder de cooptação e de corrupção.”
Apesar dessas constatações, o que se viu nos últimos 13 anos foi mais do mesmo. Como as mudanças dependem do Congresso Nacional, que neste ano praticamente já encerrou as suas atividades em função das eleições, essa tal “reformulação do futebol brasileiro”, decorrente do “legado dos 7 x 1”, ficará para o próximo governo.
O importante, neste momento, é mudarmos o disco. Pior do que a seleção de Felipão é a conjuntura da economia. O crescimento econômico em 2014 será de 1%, se tanto. A inflação acumulada em 12 meses estourou o teto da meta de 6,5%, mesmo com os preços administrados represados.
O déficit em conta-corrente (diferença entre importações e exportações de bens e serviços) acumulado até maio já alcança 4,3% do PIB. Sem as “mágicas contábeis”, o superávit primário (necessário para o pagamento dos juros da dívida pública) é nulo. Ao que parece, está na hora de realizarmos “a eleição das eleições”.
Desta forma, volto a Carlos Drummond de Andrade: “Foi-se a Copa? Não faz mal. Adeus chutes e sistemas. A gente pode, afinal, cuidar dos nossos problemas.”

Gil Castello Branco é economista e fundador da organização não governamental Associação Contas Abertas

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Frases: Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade Roger Kitzis

Milagre?
"Quando nada acontece há um grande milagre acontecendo que não vemos" Guimarães Rosa

Moderno?
"É mais importante ser eterno do que ser moderno"
Carlos Drimmond de Andrade

Felicidade? 
"Felicidade é quando você se sente grato por qualquer coisa"  Roger Kitzis

terça-feira, 6 de março de 2012

Cuidado, por favor: viver, escrever e falar é muito perigoso....


02/03/2012
 às 11:25
Pelo mundoVida literária

Houaiss, Shakespeare e outros crimes

Envergonhado com a ação do procurador de Uberlândia contra o dicionário Houaiss, por suposto crime de racismo numa das acepções do verbete “cigano” (verbete que, por via das dúvidas, já foi tirado do ar na versão online do dicionário, tornando o caso ainda mais deprimente)? Console-se pensando no estado americano do Arizona, onde uma campanha de extremistas de direita do Tea Party contra os “estudos étnicos” na rede educacional acaba de botar na lista negra, entre outros autores, um tal de William Shakespeare.
*
O escritor Michel Laub esqueceu a reverência no banco do táxi, pegou a crônica A um jovem, de Carlos Drummond de Andrade – publicada no livro “A bolsa & a vida”, de 1962 – e editou os 31 conselhos literários que o poeta dá a um certo Alípio para transformá-los num decalogozinho mais ao gosto da era digital. O resultado contém alguns toques de atualidade perfurocortante:
Se sentir propensão para o ‘gang’ literário, instale-se no seio de uma geração e ataque. Não há polícia para esse gênero de atividade. O castigo são os companheiros e depois o tédio.
*
Jonathan Franzen está sendo – de novo – bombardeado por acusações
de misoginia, desta vez devido às observações no mínimo deselegantes que enfiou num ensaiosobre Edith Wharton para a “New Yorker”.
*
Quem a esta altura ainda não viu a surpreendente aula-espetáculo (abaixo) dada por Rubem Fonseca – escritor famoso por ser um recluso, mas só para consumo doméstico – no evento literário português Correntes d’Escritas, em Póvoa de Varzim? O vídeo divide opiniões. Há quem torça para o autor de “Feliz ano novo” estender ao território nacional aquele humor performático de professor de cursinho, em consideração aos nativos que o consagraram. Outros adorariam vê-lo de volta à velha reclusão, desta vez para não sair mais.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Hoje é dia D, de Carlos Drummond de Andrade


by Juliana Coutinho


Carlos Drummond de Andrade

(...) Pois de tudo fica um pouco.
Fica um pouco de teu queixo
no queixo de tua filha.
De teu áspero silêncio
um pouco ficou, um pouco
nos muros zangados,
nas folhas, mudas, que sobem.
Ficou um pouco de tudo
no pires de porcelana,
dragão partido, flor branca,
ficou um pouco
de ruga na vossa testa,
retrato.
(...) E de tudo fica um pouco.
Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.
(Resíduo)

"A minha vontade é forte, mas a minha disposição de obedecer-lhe é fraca."
Carlos Drummond de Andrade