Postagem em destaque

Uma crônica que tem perdão, indulto, desafio, crítica, poder...

Mostrando postagens com marcador CláudiA Collucci. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador CláudiA Collucci. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Governo sem protocolos gera conflito de gestão... / Cláudia Collucci

cláudia collucci

 

03/10/2013 - 13h11

Demissão na ANS é ponta do iceberg chamado conflito de interesses

PUBLICIDADE

Ouvir o texto
A demissão do diretor da ANS Elano Figueiredo é só a ponta do polêmico iceberg chamado conflito de interesses.
A sua derrocada se deu pelo fato de ele ter omitido em seu currículo enviado ao governo e ao Senado ter sido representante jurídico de uma operadora de saúde (Hapvida).
Elano trabalhou com carteira assinada para a Hapvida por quase dois anos, entre outubro de 2008 a junho de 2010. Mas no currículo encaminhado ao governo, Figueiredo informou apenas que, nesse período, trabalhou como advogado. Ele alega que a omissão se deu por questões de sigilo profissional.
Um levantamento do Idec (Instituto Nacional de Defesa do Consumidor) mostrou que a Hapvida foi a quarta operadora que mais negou cobertura aos seus usuários em 2012. Mas o instituto não relativizou o número de usuários da operadora, que é a terceira maior do Brasil em beneficiários, com o de reclamações.
De acordo com a ANS, que relativiza os números, a operadora está em 20º lugar no índice de reclamações entre as cem maiores.
Enquanto esteve advogando para a Hapvida (e depois para a Unimed), as ações impetradas por Elano buscavam reverter punições aplicadas à empresa por se negar a pagar o tratamento de segurados.
Mas esse tipo de expediente não é exclusivo de Elano. Vários diretores que já passaram pela ANS tiveram altos cargos nas operadoras de saúde e, depois de deixarem a agência, voltaram para o setor privado, um movimento que já foi apelidado de "porta giratória".
A ANS, órgão do governo responsável por fiscalizar os planos de saúde e mantido por recursos públicos, leva até 12 anos para analisar processos em que operadoras de planos de saúde são acusadas de irregularidades contra seus clientes.
A agência diz que segue um processo legal para a aplicação de penalidades contra as operadoras e que não há impedimento que proíba que seus diretores venham ou retornem ao mercado de planos de saúde. Argumentam que tais pessoas "entendem do setor".
A saída de Elano é bom momento para discutir a questão dos conflito de interesses não só na ANS, mas também em outras agências regulatórias do país.
Um outro exemplo instigante: uma antiga gerente da área de propaganda de medicamentos da Anvisa agora é alta executiva da Interfarma (associação que representa as multinacionais farmacêuticas no Brasil).
O discurso dela, antes anti-indústria, agora está totalmente afinado com o dos laboratórios. Sabe de cor e salteado a retórica contrária e os próprios planos que a Anvisa tinha para o setor.
Não há nada de ilegal nisso, é claro, mas rende bons questionamentos no campo da bioética. Não é hora de o governo federal prestar mais atenção nessas relações conflituosas entre os seus funcionários e o setor que deveriam fiscalizar?
Avener Prado/Folhapress
Cláudia Collucci é repórter especial da Folha, especializada na área da saúde. Mestre em história da ciência pela PUC-SP e pós graduanda em gestão de saúde pela FGV-SP, foi bolsista da University of Michigan (2010) e da Georgetown University (2011), onde pesquisou sobre conflitos de interesse e o impacto das novas tecnologias em saúde. É autora dos livros "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de "Experimentos e Experimentações". Escreve às quartas, no site.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Uma usuária do SUS... // Mais do mesmo


cláudia collucci

 

09/01/2013 - 03h00

A cegueira e o SUS


Há dois anos, Zilda sentiu que estava perdendo a visão do olho esquerdo. Viúva, sequelada de poliomielite e usuária do SUS, procurou a unidade de saúde do bairro onde mora, em Ribeirão Preto (SP), e foi encaminhada para um serviço de oftalmologia ligado a uma universidade.
Lá fizeram alguns exames preliminares e diagnosticaram (erradamente) que ela tinha uma lesão na retina. Disseram que a encaminhariam para o HC. Um ano se passou e nada de surgir a tal vaga. A visão só piorava.
Há seis meses, Zilda conseguiu se consultar com uma oftalmo particular, que cobrou um terço do valor normal da consulta.
A médica a examinou, descartou a possibilidade de lesão ou infecção na retina. Logo deduziu que pudesse ser algo que estivesse comprimindo o nervo óptico. Orientou-a procurar um neurologista. No HC, a mesma resposta: tinha que esperar uma vaga.
Na última semana, graças a um contato de um parente, Zilda conseguiu ingressar num serviço de oftalmologia de São Paulo, ligado a uma universidade. Em quatro dias, fez tomografia, ressonância magnética e uma angiografia digital, que revelaram um aneurisma gigante no cérebro, de quase 3 cm. É ele que está comprimindo o nervo óptico e cegando, lentamente, Zilda.
Aneurismas cerebrais, em geral, são silenciosos. Quando rompem, causam hemorragias que podem matar ou deixar sequelas graves.
Os médicos estudam agora qual o melhor procedimento para o caso de Zilda, classificado como grave. Todos os procedimentos envolvem riscos, que se tornam maiores no caso de um aneurisma dessas proporções.
Zilda se pergunta: e se eu tivesse descoberto antes, o risco seria menor? Talvez. O triste é saber que o caso de Zilda não é único. O triste é saber que existem hoje milhares de pessoas em filas de espera dos serviços de saúde sem saber quando serão atendidas. E o que é pior: se haverá tempo hábil para esse atendimento.
Zilda conseguiu ingressar em um serviço de referência no país porque teve QI, quem indicou. Mas quantos brasileiros têm a mesma sorte?
Avener Prado/Folhapress
Cláudia Collucci é repórter especial da Folha, especializada na área da saúde. Mestre em história da ciência pela PUC-SP e pós graduanda em gestão de saúde pela FGV-SP, foi bolsista da University of Michigan (2010) e da Georgetown University (2011), onde pesquisou sobre conflitos de interesse e o impacto das novas tecnologias em saúde. É autora dos livros "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de "Experimentos e Experimentações". Escreve às quartas, no site.