Postagem em destaque

Uma crônica que tem perdão, indulto, desafio, crítica, poder...

Mostrando postagens com marcador uma usuária do SUS. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador uma usuária do SUS. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Uma usuária do SUS... // Mais do mesmo


cláudia collucci

 

09/01/2013 - 03h00

A cegueira e o SUS


Há dois anos, Zilda sentiu que estava perdendo a visão do olho esquerdo. Viúva, sequelada de poliomielite e usuária do SUS, procurou a unidade de saúde do bairro onde mora, em Ribeirão Preto (SP), e foi encaminhada para um serviço de oftalmologia ligado a uma universidade.
Lá fizeram alguns exames preliminares e diagnosticaram (erradamente) que ela tinha uma lesão na retina. Disseram que a encaminhariam para o HC. Um ano se passou e nada de surgir a tal vaga. A visão só piorava.
Há seis meses, Zilda conseguiu se consultar com uma oftalmo particular, que cobrou um terço do valor normal da consulta.
A médica a examinou, descartou a possibilidade de lesão ou infecção na retina. Logo deduziu que pudesse ser algo que estivesse comprimindo o nervo óptico. Orientou-a procurar um neurologista. No HC, a mesma resposta: tinha que esperar uma vaga.
Na última semana, graças a um contato de um parente, Zilda conseguiu ingressar num serviço de oftalmologia de São Paulo, ligado a uma universidade. Em quatro dias, fez tomografia, ressonância magnética e uma angiografia digital, que revelaram um aneurisma gigante no cérebro, de quase 3 cm. É ele que está comprimindo o nervo óptico e cegando, lentamente, Zilda.
Aneurismas cerebrais, em geral, são silenciosos. Quando rompem, causam hemorragias que podem matar ou deixar sequelas graves.
Os médicos estudam agora qual o melhor procedimento para o caso de Zilda, classificado como grave. Todos os procedimentos envolvem riscos, que se tornam maiores no caso de um aneurisma dessas proporções.
Zilda se pergunta: e se eu tivesse descoberto antes, o risco seria menor? Talvez. O triste é saber que o caso de Zilda não é único. O triste é saber que existem hoje milhares de pessoas em filas de espera dos serviços de saúde sem saber quando serão atendidas. E o que é pior: se haverá tempo hábil para esse atendimento.
Zilda conseguiu ingressar em um serviço de referência no país porque teve QI, quem indicou. Mas quantos brasileiros têm a mesma sorte?
Avener Prado/Folhapress
Cláudia Collucci é repórter especial da Folha, especializada na área da saúde. Mestre em história da ciência pela PUC-SP e pós graduanda em gestão de saúde pela FGV-SP, foi bolsista da University of Michigan (2010) e da Georgetown University (2011), onde pesquisou sobre conflitos de interesse e o impacto das novas tecnologias em saúde. É autora dos livros "Quero ser mãe" e "Por que a gravidez não vem?" e coautora de "Experimentos e Experimentações". Escreve às quartas, no site.