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quarta-feira, 3 de abril de 2013

"... o Cabo Horn é o fim do mundo" // Blog Viajologia

http://colunas.revistaepoca.globo.com/viajologia/

Dramático e amedrontador, o Cabo Horn é o fim do mundo

“A vista destas costas é suficiente para fazer um homem de terra ter pesadelos durante uma semana com naufrágios, perigos e morte”, escreveu o naturalista Charles Darwin em 1834 quando passou pelo Cabo Horn. Localizado na ponta de nosso continente, a quase 56º de latitude Sul, o Cabo Horn é um dos maiores desafios náuticos. Marinheiros, piratas, caçadores de baleias, missioneiros ou exploradores sempre sentiram um buraco no estômago ao passar de um oceano a outro. De 1616 até 1914 (quando da abertura do Canal de Panamá), esta era a rota obrigatória entre a Europa e a Costa Oeste dos Estados Unidos. Durante estes três séculos, calcula-se que mais de 800 embarcações perderam-se nas tormentas do Cabo Horn, levando a vida de cerca de 10 mil pessoas.
© Haroldo Castro | Patagonia, ChileNão há marinheiro que não respeite as águas e os ventos do Cabo Horn – à esquerda da foto.
Não foi uma expedição científica que descobriu a passagem de um oceano a outro, mas mercadores em busca de novas oportunidades. O francês Isaac Le Maire, um dos fundadores e acionista da famigerada Companhia Holandesa das Índias Ocidentais – e depois um forte inimigo da mesma instituição – organizou a expedição de dois barcos (Eendracht e Hoorn) que zarpou da Holanda, sob o comando de seu filho Jacob.Foi a intenção de boicotar a Companhia das Índias e quebrar seu monopólio nos caminhos interoceânicos que realmente motivou a descoberta da nova passagem.
Em janeiro de 1616, o feito foi realizado, a contragosto dos holandeses. Jacob Le Maire continuou rumo oeste e cruzou todo o Pacífico, até chegar na Indonésia. Lá, a poderosa Companhia das Índias o esperava não com salvas, mas com um mandato de prisão e de apreensão do barco. Jacob morreu na viagem de volta à Holanda, mas seu pai Isaac persistiu a luta contra a primeira megaempresa e corporação multinacional do planeta, que tinha poderes tão amplos como os de um governo.
O cabo foi batizado com o nome de um dos barcos de Le Maire, Hoorn, incendiado durante a viagem, o mesmo de uma cidade holandesa. A tradução em espanhol, Hornos, que significa “fornos”, é incorreta.
No mapa do GPS do navio Via Australis, a rota que circunda o Cabo Horn, encontro entre o Atlântico e o Pacífico.
Quase quatro séculos depois de seu descobrimento, a natureza é a mesma. O clima continua inclemente, assustando qualquer indivíduo que ouse chegar a este fim do mundo. Afinal, o Cabo Horn é o mais austral de todos os cabos que tentam se aproximar da Antártica.
Mas hoje os instrumentos de navegação mudaram muito o cenário e as previsões meteorológicas avisam se a parada no Cabo Horn é possível ou não. Hoje, por sorte, as ondas na baía onde os botes infláveis atracam não estão violentas. Podemos baixar. Isso não significa que seja um passeio prazeroso: o céu está encoberto, o vento gelado sopra sem trégua e uma garoa molha da cabeça aos pés. Mas o orgulho de viajólogo – conhecer um ponto do planeta tão importante – fala mais alto.
O desembarque tem sua dose de perigo. O bote deve aproveitar o movimento da onda para chegar até a rampa. Os passageiros devem sair sem hesitação e sem perder o equilíbrio. Os marinheiros estão atentos, principalmente aos casais mais idosos.
Subo as escadas que serpenteiam a falésia. A garoa transforma-se em chuva. Protejo ainda mais meu equipamento fotográfico. Chego no topo da ilha, uma espécie de platô ondulado. Por estar em lugar tão inóspito, espanto-me com os campos verdes. A constante umidade ajuda a manter a natureza viva, mesmo se em um lugar tão frio.
O solo molhado é delicado e sigo um caminho feito de tábuas, construído para preservar o ecossistema frágil. A algumas centenas de metros, vejo a pequena base naval chilena, junto com o farol. Aqui vive um oficial da marinha com sua família durante um ano.
© Haroldo Castro | Patagonia, ChileO farol, a 57 metros acima do mar, serve como referência para os barcos que cruzam o Cabo Horn. É o farol mais austral do mundo.
Se existe uma razão para estar neste rincão tão afastado do planeta é conhecer o monumento criado pela seção chilena da Confraria dos Capitães do Cabo Horn, os chamados Cap Horniers. As 10 placas de aço que formam a figura de um albatroz-gigante, ave do oceano austral, homenageiam todos os marinheiros, de todas as nacionalidades, que perderam suas vidas na região.
Inaugurado em 1992, o monumento demandou uma logística particular: as 120 toneladas de material foram transportadas por dois navios da marinha chilena e a estrutura de aço foi desenhada para aguentar rajadas de vento de até 200km/h.
© Haroldo Castro | Patagonia, ChileO monumento da Confraria dos Capitães do Cabo Horn celebra todos que circunavegaram o ponto mais austral do continente americano.
© Haroldo Castro | Patagonia, ChileO espaço vazio entre as duas esculturas cria a figura de um albatroz-gigante, ave cujas asas pode ter mais de 3 m de envergadura.
Na escadaria que leva ao monumento criado pelo artista chileno José Balcells Eyquem, encontro uma placa de mármore com um poema da escritora Sara Vial. Em poucas palavras, a poetisa de Valparaíso revela o simbolismo do albatroz do Cabo Horn:
Sou o albatroz que te espera no fim do mundo.
Sou a alma esquecida dos marinheiros mortos que cruzaram o Cabo Horn desde todos os mares da terra.
Mas eles não morreram nas furiosas ondas,
Hoje voam em minhas asas até a eternidade,
Na última fenda dos ventos antárticos.
© Haroldo Castro | Patagonia, Chile
Poema de Sara Vial sobre o albatroz do fim do mundo.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Orquídeas invadem Ipanema no Rio

http://colunas.revistaepoca.globo.com/viajologia/2013/01/30/orquideas-ipanema/

Orquídeas embelezam o Quadrilátero do Charme de Ipanema

O Rio de Janeiro é a cidade mais fotogênica do país e Ipanema é um dos bairros mais descolados e elegantes da Cidade Maravilhosa. Sua gente é sorridente e descontraída, sua natureza – oceano, praia, lagoa e vista dos morros e das pedras – é privilegiada e seus lugares de passatempo – bares e restaurantes – são dos mais badalados. Nos meses de verão, um dos charmes de Ipanema são asorquídeas multicoloridas presas nas árvores que sombreiam as ruas.
© Haroldo Castro | Rio de janeiroEm frente ao 289 da rua Alberto de Campos, já perto da Epitácio Pessoa, uma árvore congrega dezenas de plantas epífitas, com belos exemplares de Phalaenopsis, a orquídea-borboleta, em primeiro plano.
© Haroldo Castro | Rio de janeiroNa rua Barão de Jaguaripe, quase esquina com Maria Quitéria, um cacho de Oncidium, a orquídea-chuva-de-ouro, surpreende o pedestre com sua delicadeza.
Em 2006, um conjunto de quarteirões no coração de Ipanema foi batizado como Quadrilátero do Charme. Uma evolução orgânica da Associação de Amigos da Rua Garcia d’Ávila, criada pelo joalheiro Antonio Bernardo, o quadrilátero passou a abranger a área entre as ruas Aníbal de Mendonça e Joana Angélica e as avenidas Epitácio Pessoa (na Lagoa) e a Vieira Souto (na orla). São 22 quarteirões onde se concentram hotéis, restaurantes, galerias de arte, lojas de grife, joalherias, livrarias, cabelereiros, cursos de idiomas e o comércio chique do bairro. A Prefeitura do Rio oficializou o espaço como um dos 20 Polos do Rio.
“Em 2004, quando eu soube que o Shopping Leblon chegaria ao Jardim de Alá, fiquei preocupado com o futuro do comércio de rua de Ipanema. Precisávamos nos organizar para não sermos devorados pela megaestrutura do shopping”, diz Bruno Pereira, diretor da associação comercial Quadrilátero do Charme. Demorou um pouco, mas os donos das lojas de luxo entenderam o desafio. “Hoje o Quadrilátero é composto por cerca de 70 empresas.”
Bruno fala sobre a evolução do Quadrilátero do Charme nos últimos sete anos. Uma das iniciativas que mais deu certo foi um plantio de orquídeas nas principais ruas do bairro. “Em 2007, vivíamos um momento sombrio no Rio, com roubos e assassinatos até mesmo em Ipanema. Precisávamos fazer alguma coisa para melhorar nossa imagem”, afirma Bruno.
Inspirado em exemplos de orquídeas amarradas em troncos de árvores que voltaram a florescer, ele convidou moradores para plantar – ou melhor, prender nas árvores – centenas de orquídeas. “Eu parecia um maluco, andando pela Aníbal, Garcia, Maria Quitéria e Joana Angélica, contando árvores. No final, listei 350 troncos que poderiam receber seis plantas cada”, diz Bruno.  “Festejamos a entrada da primavera, no domingo 23 de setembro de 2007, amarrando 2.100 orquídeas, ainda sem flor, nas árvores.”
Esta primeira iniciativa ocorreu há mais de cinco anos. De lá para cá, muita coisa mudou. Das 2.100 orquídeas plantadas, mais da metade desapareceu. Quando as plantas começaram a florescer, vários quarteirões foram depenados, como o da Praça N. S. da Paz, onde existe uma feira livre. “Perdemos muitas plantas. Aconteceram alguns roubos e as orquídeas colocadas perto da praia morreram, certamente por causa da maresia”, diz Bruno. “Mas os moradores adoraram a novidade e, daquele momento em diante, as orquídeas passaram a fazer parte do cenário do bairro.”
Em bolsas de juta ou em potes cortados pela metade, as orquídeas rapidamente se fixam nos troncos, graças às suas raízes em forma de tentáculos.
Pouco a pouco, os troncos das árvores foram ganhando mais e mais potinhos de orquídeas. Os porteiros dos edifícios passaram a ter um importante papel. “Os moradores recebem orquídeas como presente, mas quando a flor murcha, eles jogam fora o vaso, para não ocupar espaço dentro de casa. Comecei a prender na árvore da entrada do meu prédio todas as orquídeas recebidas”, afirma Manoel Freitas de Brito, zelador de um edifício na Henrique Dumont.
“Hoje, somente neste pé, tenho oito espécies diferentes.” Manoel explica que, geralmente, as plantas florescem apenas uma vez ao ano, mas há exceções. “Estas brancas dão sempre uma segunda floração”, diz Manoel mostrando uma orquídea-borboleta. Mas tenho uma solitária amarela que aparece apenas a cada dois anos.”
© Haroldo Castro | Rio de janeiroManoel Freitas de Brito, zelador há 31 anos no mesmo prédio, considera que tem dedo verde. “Tudo que planto, pega; até mesmo à meia quadra da praia”, afirma.
A iniciativa das orquídeas embelezando as ruas do bairro deu certo pois gerou uma união harmoniosa entre os principais atores. Comerciantes, moradores e zeladores dos prédios compartilham a mesma meta que o bairro se torne um lugar cheio de charme. Residente na rua Redentor, Bia Lopes pede a seu jardineiro que, depois de expostas na sua loja, as orquídeas sejam sempre colocadas na árvore em frente ao prédio onde ela mora e trabalha. Em poucos anos, ela a transformou em uma árvore de Natal tropical! Um exemplo a seguir!
© Haroldo Castro | Rio de janeiroA árvore de Bia Lopes na rua Redentor está coberta por mais de 50 pés de orquídeas brancas do gênero Phalaenopsis.
© Haroldo Castro | Rio de janeiroUma orquídea do gênero Phalaenopsis replantada em uma árvore na rua Redentor. A Phalaenopsis é originária do sudeste asiático.