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segunda-feira, 2 de julho de 2012

A distância entre a intenção e o fato, Everardo Maciel // Blog de Ricardo Noblat


Enviado por Everardo Maciel - 
2.7.2012
 | 17h03m
POLÍTICA

A distância entre a intenção e o fato, por Everardo Maciel


Verso primoroso da música “Fado Tropical” (“é que há distância entre intenção e gesto”), de Ruy Guerra e Chico Buarque de Holanda, o desencontro entre intenções e fatos está no cotidiano da política, por ser ela um solo fértil para a construção de expectativas, frequentemente, frustradas, por demagogia ou incompetência. Dois episódios recentes exemplificam esse entendimento.
Nada mais republicano que a transparência na vida pública. Em seu nome, prosperaram, entre outras iniciativas, a Lei nº 12. 527, de 18 de novembro de 2011, que assegura o acesso a informações tuteladas pelos poderes públicos, dando concretude a diversas normas constitucionais. Não há como se contrapor a tal providencial lei. Minhas inquietações se voltam para sua execução.
O primeiro ato decorrente da lei foi a publicação dos salários dos servidores. O que, realmente, se pretende com essa medida? Constranger os servidores? Não seria uma violação do direito à intimidade, estabelecido no inciso X do art. 5º da Constituição, norma qualificada como cláusula pétrea? Essas pessoas não ficariam vulneráveis a atos de chantagem, de sequestro ou de outras práticas criminosas?
Essas informações já são do conhecimento da administração pública. É dela a obrigação de corrigir distorções, quando existentes. O fisco detém instrumentos para apurar evoluções patrimoniais a descoberto. Em outra seara, a polícia, sem reprováveis exibicionismos e vazamentos criminosos, tem condições de investigar práticas de corrupção, que envolvam servidores públicos.
Os servidores já se submetem à ridícula obrigação de encaminhar dados fiscais para órgãos que não têm vocação ou competência técnica para examiná-los. É um espetáculo inútil de promiscuidade fiscal, do qual não se conhece resultado efetivo no pretenso combate à corrupção.
No templo de Apolo, em Delfos, os gregos, traduzindo o equilíbrio apolíneo da alma helênica, proclamavam: nada em excesso. Não pode a transparência ser pretexto para desrespeito a direitos individuais.
A divulgação dos salários dos servidores, na verdade, é uma via para dissimular a indisposição para propor uma lei geral do serviço público, que contemple regras transparentes de remuneração e promoção, valorize o mérito e a eficiência, elimine as inúmeras assimetrias e privilégios de tratamento, e desarme as guerras corporativas.
Pode, por exemplo, um Ministro de Estado ser remunerado pela via oblíqua da participação em conselhos de administração de empresas públicas e sociedades de economia mista? A função exercida não exige dedicação exclusiva? Não há um enorme potencial de conflitos de interesse entre o exercício de suas funções e as atividades das empresas?