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quinta-feira, 3 de maio de 2012

Buracos negros humanos - ÉPOCA | Ivan Martins

IVAN MARTINS - 02/05/2012 09h26 - Atualizado em 02/05/2012 09h26
TAMANHO DO TEXTO

Buracos negros humanos

Como essas personalidades atormentadas fascinam, atraem e destroem

IVAN MARTINS





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IVAN MARTINS É editor-executivo de ÉPOCA (Foto: ÉPOCA)
Costumo me lembrar dela de duas maneiras. Em uma, é a mulher intensa, cheia de vida, que a cada dia se apaixonava por uma nova ideia que iria revolucionar a sua vida. Na outra, é uma garota ansiosa, desamparada, sempre correndo atrás de algo que não existia. Nas duas versões é um ser humano fascinante. Em ambas, uma companhia intolerável.
Dias atrás, ao me lembrar dessa pessoa concreta e real, me ocorreu a imagem de um buraco negro – aquele ponto no espaço em que as forças do universo se manifestam de forma extrema e misteriosa. 
Em sua sedutora confusão, ela era capaz de atrair as pessoas, roubar a luz que elas emitiam e, de forma inocente e inevitável, esmagá-las. Assim como se imagina que os buracos negros podem levar a outras dimensões, ela também arrastava as pessoas ao seu redor a um território de angústia e perplexidade, aquele em que ela mesma vivia o tempo todo. Era, a despeito da sua doçura essencial, da sua enorme carência, uma personalidade destrutiva, incapaz de obter ou oferecer paz. Um mistério insolúvel para si mesma. Uma alma atormentada. Um buraco negro emocional.
Talvez vocês já tenham se envolvido com gente assim. 
É impossível ignorá-las e parece impossível salvá-las de si mesmas. Movidos por nossos melhores sentimentos, ou pelo mero desejo, somos arrastados a um turbilhão que não é o nosso e rapidamente percebemos que é impossível contê-lo ou sobreviver em seu interior. Quando você descobre que o outro é um rio sem margem, o instinto de sobrevivência recomenda fugir. Quem fica tem histórias difíceis para contar.
A convivência com esses extremos ensina algumas coisas, porém. A mais importante delas é a importância essencial da sanidade. Os seres humanos diferem de incontáveis maneiras e suas neuroses se multiplicam na mesma proporção. Mas há, dentro de cada um de nós, uma espécie de termômetro que mede a loucura do outro. Se ela passar do limite aceitável pela tribo, ou por nós mesmos, algo dentro de nós berra e recua. Muitos tivemos essa experiência. 
Você está conhecendo a pessoa, gosta do que vê e do que ouve, mas, de repente, ela diz ou faz algo totalmente fora de contexto, incompreensível e, por isso mesmo, assustador. Pode ser uma explosão de violência, uma mudança radical de humor ou uma conversa sem pé nem cabeça, que você tenta seguir e não consegue. O resultado é o mesmo: aparece um nó no estômago e a atração vira pó. Temos vontade de sair correndo.
Mas esses são casos extremos.
Em geral, antes de descobrir o pântano mental do outro já estamos enredados. Aí fica mais difícil perceber e escapar da confusão. Aliás, podemos estar apaixonados pelo tumulto. Achamos aquilo tudo fascinante, atraente, único. Pensamos: que pessoa original achei para mim. Leva tempo para entender que ela talvez seja original demais para o seu próprio bem. Custa se desvencilhar de algo assim.
Por isso eu penso nos buracos negros, em como eles arrastam para si tudo ao redor, como são fundamentalmente incompreensíveis e fascinantes, como representam perigo. Eles lembram as personalidades atormentadas. Assim como os buracos negros, é melhor vê-las de longe, no tempo e no espaço, à distância segura de um telescópio. Talvez assim seja possível decifrá-la. Assim é possível sobreviver ao seu fascínio. 
 (Ivan Martins escreve às quartas-feiras)