Coluna- Marcos Troyjo Folha de S.Paulo
26/09/2014 - 17h03
(A convivência do passado com a modernidade)
Quando um latino-americano volta da Coreia do Sul, traz consigo admiração e inveja pelo "Milagre do Rio Han". Assim ficou conhecida a extraordinária trajetória de desenvolvimento do país nos últimos 60 anos.
Em 1954, com renda per capita de US$ 70, a Coreia era a 101ª dentre 130 nações num estudo do Banco Mundial sobre riqueza.
Desprovida de recursos naturais, era mais pobre que a maioria dos países africanos.
MacArthur, primeiro comandante dos EUA na Guerra da Coreia (1950-53), enxergava horizonte sombrio: "A Coreia não tem futuro. Levará mais de um século para reconstruir-se". Nos anos 60, as principais exportações eram pescados e perucas.
Hoje, o PIB por habitante da Coreia do Sul é três vezes o brasileiro. O país é o quarto produtor mundial de patentes. Navega na melhor banda larga do mundo. A Samsung vende mais smartphones que a Apple.
Como operaram essa mágica?
Geralmente atribui-se o sucesso à prioridade educacional. De fato, a Coreia do Sul tem o melhor desempenho do mundo no exame Pisa. A parcela da população em idade universitária que frequenta o ensino superior é de 80%, a mais alta do planeta. Suas universidades, com disciplinas em inglês, estão repletas de estrangeiros. A ênfase na educação, contudo, deu-se junto a outros fatores. Sacrifício familiar em prol da geração seguinte. Política industrial interdependente dos mercados globais. Planejamento. Conglomerados multissetoriais ("Chaebols", como LG e Hyundai). Todos concorrem para o êxito. E nenhuma tem sido característica de economias latino-americanas. Até o nome de estruturas governamentais reflete preocupação com o amanhã. A pasta da Fazenda chama-se Ministério de Finanças e da Estratégia. A da inovação, Ciência, Tecnologia e Planejamento do Futuro. É mais que capricho de nomenclatura. A gestão da política econômica alinha-se aos objetivos maiores da economia política. Daí os 4,2% da riqueza anual direcionados a pesquisa & desenvolvimento, o que faz da Coreia do Sul o país que mais investe em inovação (o Brasil destina 1% do PIB).
Globalmente competitivos de automóveis a satélites, os sul-coreanos querem nova transformação –flexibilizar as estruturas rígidas dos Chaebols para infundir no país um empreendedorismo do tipo "start-up". Eles desejam um "Milagre 'Gangnam Style'" –alusão ao divertido vídeo do rapper Psy (mais assistido de todos os tempos no Youtube).
Buscam liderança em algo intangível, esteticamente apurado e de consumo global. Apontam para design, moda, computação em nuvem e também entretenimento. Enquanto latino-americanos embaralham-se num cartório exportador de commodities, os sul-coreanos trabalham pela ponta da economia criativa do século 21.