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sábado, 10 de dezembro de 2011

Revista Época - A internet faz mal ao cérebro? - notícias em Ideias

ALBERTO CAIRO, PETER MOON E LETÍCIA SORG
Revista Época - A internet faz mal ao cérebro? - notícias em Ideias

"Um grupo cada vez maior de pesquisadores acha que estamos nos tornando mais distraídos – e mais burros – por causa do uso excessivo dos aparelhos digitais."


"O escritor americano Nicholas Carr sentiu que algo estranho ocorria com ele há uns cinco anos. Leitor insaciável, percebeu que já não era capaz de se concentrar na leitura como antes. Na verdade, sua ansiedade disparava diante de qualquer tarefa que exigisse concentração – seus olhos procuravam a tela do computador ou do celular. O impulso de espiar na internet era quase incontrolável, diz ele. “Sentia que estava forçando meu cérebro a voltar para o texto”, afirma. “A leitura profunda, antes tão natural para mim, tinha se transformado numa luta.” Tal afirmação abre o livro The shallows – What the internet is doing to our brains (Os superficiais – O que a internet está fazendo com nossos cérebros, ainda sem tradução no Brasil)..."


"“Em vez de mentes juvenis inquietas e repletas de conhecimento, o que vemos nas escolas é uma cultura anti-intelectual e consumista, mergulhada em infantilidades e alheia à realidade adulta”, afirma Mark Bauerlein, autor de The dumbest generation (A geração mais estúpida). No livro, ele antecipa uma nova Idade das Trevas, quando os indivíduos que hoje são crianças e adolescentes chegarem à maturidade..."

"A Associação Americana de Psicologia define multitarefa como “a tendência a fazer mais de um trabalho que precise de atenção ao mesmo tempo, como falar ao telefone e escrever uma mensagem eletrônica”. Ela diz que esse hábito promovido pelas novas tecnologias tornou-se um problema. Sério. O motivo é simples: nossa capacidade de atenção é limitada. Quanto mais ela é fracionada, menos funciona. É um problema que tem origem na evolução da espécie. Fazemos bem uma coisa de cada vez e, mesmo assim, com grau limitado de concentração. Apesar disso, estamos nos dividindo cada vez mais...."

"Existe o temor, entre os pesquisadores, de que a insistência em comportamentos digitais obsessivos possa causar danos ou alterações neurológicos. Num estudo publicado pela revista eletrônica PlusONE, em junho deste ano, cientistas chineses analisaram a atividade cerebral de 18 adolescentes que passavam mais de dez horas por dia jogando na internet. Eles descobriram que regiões cerebrais encarregadas do autocontrole e da capacidade de concentração numa única tarefa e de evitar distrações apresentavam um tamanho menor que a média. Os jovens mostravam também desempenho pior de memória..."

"O psicólogo Steven Pinker, autor de livros fundamentais sobre o funcionamento da mente humana, insiste que o cérebro não é uma massa de argila inteiramente moldável. “A experiência não redesenha nossas capacidades básicas de processamento de informação”, diz Pinker. As pessoas podem se educar para ler mais rápido na internet, mas os resultados serão limitados pela estrutura do cérebro e dos neurônios. Chega um ponto em que as mudanças cessam, por mais impulsos que venham do mundo exterior – da tecnologia ou de qualquer outra área...."

"A professora Andréa Jotta, pesquisadora do Núcleo de Pesquisa de Psicologia em Informática da PUC de São Paulo, duvida até mesmo que haja mudanças reais na cognição humana por causa dos computadores. “As pessoas não perderam a capacidade de se concentrar. O que vemos aqui é um excesso de foco no mundo digital”, diz ela. Há quem entre tão fundo no mundo virtual que se esquece do real a sua volta..."

"Há até um grupo que defende uma ideia à primeira vista delirante: a conexão de bilhões de pessoas à internet permitirá a emergência, no futuro, de uma espécie de inteligência em rede, capaz de transcender o potencial de cada um de seus nós. O jornalista e escritor Kevin Kelly, um dos fundadores da futurista revista Wired, acredita que a tecnologia segue as regras da evolução natural e evolui em simbiose com o ser humano. No futuro, ele enxerga uma fusão total do ser humano com as máquinas, até que uns sejam indistintos dos outros. Kelly chama o aglomerado de tecnologias físicas (ferramentas) e conceituais (ideias) de “Technium”. Não é preciso partilhar essa visão fantasiosa para entender o lado positivo da conexão humana por meio da internet...."

"O biólogo Hebert Bruno Campos, de Campina Grande.....
A proximidade da Chapada do Araripe, um dos mais ricos sítios de fósseis do país, fez com que Hebert, desde os 7 anos, tivesse certeza do que seria quando crescesse: paleontólogo. Sonhar era fácil. Realizar o sonho, difícil. Ainda mais vivendo tão longe dos grandes centros do Sul e do Sudeste. Mais complicado ainda quando se sabe que Hebert é superdotado e tem grande dificuldade de estabelecer relacionamentos sociais. “Descobri a internet aos 14 anos. Minhas primeiras amizades foram feitas via internet”, diz ele. “Minha adolescência foi vivida na frente do computador.” 

"Se a exposição constante a telas de televisão, computadores e celulares fosse capaz de emburrecer seus usuários, seria razoável uma queda planetária no quociente intelectual (Q.I.) nos últimos dez, 20 ou 30 anos. Mas aconteceu o contrário. Depois de 60 anos de TV e de mais de duas décadas de uso cotidiano da internet, o Q.I. não para de crescer. Se um adolescente médio de hoje viajasse para o passado e fizesse o teste de Q.I. em 1950, conseguiria um resultado de 120, considerado elevado. Segundo cálculos de Pinker, um cidadão comum de hoje tem Q.I. maior do que 98% das pessoas em 1910. Se um cidadão de 1910 fizesse o teste hoje, seu Q.I. medido pelos padrões atuais seria 70 – tão baixo que estaria próximo do retardamento. É verdade, porém, que o Q.I. mede um tipo específico de inteligência (lógico-racional) e não pode ser usado, sozinho, para avaliar se a humanidade está emburrecendo ou não..."

"Em retrospecto, pode-se dizer que a difusão de conhecimento é invariavelmente um fenômeno positivo. Com a internet, é evidente que a humanidade ganhou nesse quesito. A dúvida diz respeito àquilo que perdemos. Algo que um dia poderá parecer tão ridículo quanto as palavras de Sócrates sobre a escrita – ou tão essencial quanto o resto de suas ideias...."