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sexta-feira, 24 de abril de 2015

"A vida dura de um Estado balsâmico ou Dilma sobrevive como um fósforo frio"... / Fernando Gabeira / coluna de Augusto Nunes


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24/04/2015
 às 11:24 \ Opinião

Fernando Gabeira: 

‘Um governo para esquecer'

Publicado no Estadão
FERNANDO GABEIRA
Recebi dois livros interessantes: Submissão, de Michael Houellebecq, eOrdem Mundial, de Henry Kissinger. Aproveito uns dias de resfriado para lê-los, mas só vou comentá-los adiante. Não sei se o resfriado turvou minhas expectativas, mas vejo o mundo caindo ao redor: empresas fechando, gente perdendo emprego e, como se não bastasse, estúpidos feriados.
Mas será que estar envolvido numa situação tão pantanosa me obriga a fazer as mesmas perguntas, tratar dos mesmos personagens, dona Dilma e seus dois amigos, Joaquim e Temer?
Nas últimas semanas deixei de perguntar apenas sobre o ajuste econômico, que nos promete uma retomada do crescimento. Começou enriquecendo os partidos e apertando as pessoas. Disso já suspeitava. Cheguei a indagar se não era possível superar o voo da galinha, achar um caminho seguro e sustentável. Constatei que lá fora também se faz a mesma pergunta, não a respeito do Brasil, mas do próprio capitalismo. O sistema tem um futuro, deságua em outra via de expansão?
Quanto à minha expectativa de um crescimento equilibrado, encontrei respostas desconcertantes. Como a do economista australiano Steve Keen, para quem o equilíbrio é uma ilusão e a economia tende a viver num desequilíbrio constante, sem jamais afundar.
Existem muitas previsões sobre o que vai acontecer mais adiante. A de Jeremy Rifkin pelo menos me agrada mais porque é a que mais se aproxima das minhas toscas expectativas. E de uma ponta de otimismo que nunca me deixa, mesmo no resfriado. Rifkin fala da internet dos objetos, da produção descentralizada de energia alternativa, das impressoras 3D e dos cursos online. Tudo pode fazer de cada um de nós um proconsumidor. Da produção em massa haveria um trânsito para a produção das massas, descentralizada e cooperativa.
Aqui acompanhei, por exemplo, a prisão de Vaccari, o tesoureiro do PT. Cheguei à conclusão de que foi motivada pela decisão do partido de mantê-lo no cargo. Quando foi depor na CPI, todas as acusações já estavam postas, incluídas as que revelam nexo entre propinas e doações. O despacho do juiz Sergio Moro fala em quebrar a continuidade dos crimes, evitando que o acusado mantenha uma posição em que, desde o caso da cooperativa dos bancários (Bancoop), desvia dinheiro para os cofres do partido.
Bastava ao PT afastá-lo enquanto durassem as investigações. Falou mais alto a fraternidade partidária. Tanto que os intérpretes oficiais diziam com orgulho que o partido não abandonaria Vaccari na estrada.
Citado por Kissinger, o cardeal Richelieu, comparando a sorte da pessoa com a de uma entidade política secular, afirma que o homem é imortal, sua salvação está no outro mundo. Já o Estado não dispõe de imortalidade, sua salvação se dá aqui ou nunca.
A maior interrogação ao ver o mundo desabando é esta: como chegaremos a 2018, com um governo exaurido, crise aguda e um abismo entre as aspirações populares e o sistema político?
A primeira pergunta é esta: com ou sem Dilma? O ministro José Eduardo Cardozo diz que a oposição é obcecada pelo impeachment. Disse isso ao defendê-la das pedaladas fiscais. Com a maioria dos eleitores desejando que Dilma se afaste, sempre haverá um motivo. Hoje é pedalada, amanhã é pênalti e depois de amanhã, escanteio, lateral, impedimento – enfim, é uma constante no jogo.
Os 12 anos de governo do PT foram marcados por uma extensa ocupação partidária da máquina pública. O Estado foi visto não só como o grande empregador, mas também como o espaço onde os talentos individuais iriam florescer.
Ao lado disso se construiu também a expectativa de que grande parte dos problemas dependia da interferência estatal. Da Bolsa Família aos empréstimos do BNDES, do patrocínio às artes à salvação do Haiti, da construção de uma imprensa “alternativa” ao soerguimento econômico de Cuba – tudo conduzido pelo Estado.
Com a ruína desse modelo, a oposição popular ao governo tem a corrupção como alvo, mas revela também uma profunda desconfiança do papel econômico do Estado, a ponto de alguns analistas a verem como réplica do movimento Tea Party, uma ala radical do Partido Republicano nos EUA. Se olhamos um pouco mais longe, para o colapso do socialismo, vamos encontrar algo mais parecido com a realidade nacional. Foi muito bem expresso por um ministro húngaro na aurora da reconstrução pela via capitalista: no passado havia uns fanáticos que diziam que o Estado resolve tudo, agora aparecem outros dizendo que o mercado resolve tudo.
Além da corrupção, sobrevive ainda uma expectativa num Estado bálsamo, que cura todas as dores, resolve todos os problemas, traz de volta as pessoas amadas. É compreensível que surja uma resistência apontando para um Estado mínimo e que as esperanças se reagrupem em torno do mercado.
O que resultará disso tudo ainda é muito nebuloso. Tenho consciência de escrever sentado numa cadeira ejetável. Mas, e daí? Quando você mostra que a experiência do governo petista se esgotou, muitos protestam. Com que ideias vão dinamizar a nova fase? Com que grana vão inventar um novo ciclo de bondades balsâmicas?
Se Dilma sobrevive como um fósforo frio, isso é só um problema imediato. É hora de começar a desvendar o futuro. Não tenho dúvida de que todos os exageros, os erros patéticos, a arrogância, a desmesura, tudo será cobrado até que se restabeleça um certo equilíbrio
Viveremos o teatro fúnebre de um governo que não é mais governo, de uma esquerda oficial petrificada, de jornalistas de estimação analisando minúsculos movimentos mentais de um poder lobotomizado. Como diz um personagem de Beckett, acabou, acabamos. Resta ao governo sonhar com um domingo ideal em que, finalmente, voltadas para suas atividades normais, as pessoas o esqueçam. Imagino a discreta festa palaciana: mais um domingo, ninguém se lembrou de nós, viva!

Pizzolato está de volta ao Brasil e deve ser escalado para o time da Papuda...// o Globo //


24/04/2015 14h03 - Atualizado em 24/04/2015 14h54

Itália autoriza extradição de Pizzolato

Pizzolato foi condenado no processo do mensalão. 
Há um ano e meio ele fugiu do Brasil e foi preso na Itália.


Ilze Scamparini

Roma, Itália

O governo italiano autorizou a extradição do ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Ele foi condenado a 12 anos e sete meses de prisão no processo do mensalão.
A decisão do ministro da Justiça da Itália, Andrea Orlando, de extraditar Henrique Pizzolato foi assinada hoje e, antes que fosse comunicada ao governo brasileiro, através da embaixada em Roma, a notícia vazou por policiais da Interpol que informaram a polícia brasileira.

É uma decisão considerada histórica pela diplomacia brasileira, porque Henrique Pizzolato é também cidadão italiano e é a primeira vez que a Itália extradita um cidadão nacional para o Brasil.

As garantias apresentadas pelo governo brasileiro, de que Pizzolato será tratado com o respeito ao código de direitos humanos foram fundamentais. Ele terá também direito à assistência de consulado italiano no Brasil.

A notícia oficial ao embaixador Ricardo Neiva Tavares chegou pelo Ministério das Relações Exteriores da Itália.

Pizzolato está preso na cadeia de Modena desde fevereiro. O Brasil tem 20 dias para levar Pizzolato de volta. Representantes da Polícia Federal brasileira irão à Itália para organizar a viagem e escoltá-lo.  Se o Brasil perder esse prazo, o que já aconteceu com outros países, o extraditado torna-se então um homem livre.
Destino no Brasil
No Brasil, o destino de Henrique Pizzolato será a penitenciária da Papuda, em Brasília. A extradição põe fim a um longo período de negociações, num processo que começou há um ano e meio.

Henrique Pizzolato fugiu do Brasil em setembro de 2013, dois meses antes do Supremo Tribunal Federal (STF) expedir o mandado de prisão. O ex-diretor de marketing do Banco do Brasil foi condenado a 12 anos e sete meses pelos crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro no julgamento do mensalão do PT.
Ele fugiu para Itália usando um passaporte falso com o nome de um irmão morto. A decisão de desta sexta-feira (24) pôs fim a uma longa negociação entre os governos brasileiro e italiano.
Em outubro do ano passado, a corte de apelação de Bologna negou a extradição de Pizzolato alegando que o sistema prisional brasileiro não tinha condições garantir os direitos humanos.
O Brasil recorreu e em fevereiro deste ano, a corte de cassação de Roma autorizou a extradição. Faltava apenas a decisão política, que foi tomada nesta sexta-feira (24) pelo governo italiano.
Autoridades brasileiras afirmam que, quando extraditado, Pizzolato será levado para o complexo penitenciário da Papuda, em Brasília. Por questões de segurança, ele vai ficar na chamada "ala de vulneráveis", separado da massa carcerária, como aconteceu com os outros presos do julgamento do mensalão.
A equipe do JH conversou por telefone com a deputada brasileira no parlamento italiano, Renata Bueno, que acompanha o caso. Ela disse que Pizzolato já está à disposição da justiça brasileira e que agentes da Polícia Federal junto com a Interpol serão responsáveis por trazer Pizzolato de volta para o Brasil.
“É um que estava muito envolvido no caso de corrupção, que fugiu do Brasil tentando ficar impune e que não conseguiu. A Itália, o governo italiano reconhecendo isso devolve para que ele seja punido como todos os demais”, fala Renata Bueno.
O líder do PSDB na Câmara, deputado Carlos Sampaio, também elogiou a decisão do governo italiano.
“A justiça italiana contribuiu muito para que esse sentimento de impunidade que existia no caso dele fosse diminuído, para não dizer cessado, com a vinda dele para o Brasil para pagar pelos crimes que ele aqui cometeu", fala o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP).

Efeitos colaterais da crise de governança do PT ... / G1 // Rio Grande do Sul /



23/04/2015 22h47 - Atualizado em 23/04/2015 22h58

Sartori deve atrasar parcela da dívida com a União para pagar servidores 

Medida foi definida em reunião na noite desta quinta, no Palácio Piratini.
Governador foi à Brasília tentar recursos, mas voltou sem nada.


Do G1 RS
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Após se reunir em Brasília com o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e voltar sem recursos, o governador José Ivo Sartori deve anunciar na manhã desta sexta-feira (24) em entrevista coletiva que o governo do Estado vai atrasar o pagamento da parcela da dívida do Estado com a União para pagar em dia a folha de abril do funcionalismo público.

Segundo a Rádio Gaúcha, a decisão foi discutida em reunião na noite desta quarta (23) entre Sartori e os secretários do governo, no Palácio Piratini, após o retorno de governador da capital federal.

Sartori foi à Brasília solicitar o pagamento de repasses federais atrasados no valor de quase R$ 200 milhões. São R$ 150 milhões do Fundo de Incentivo às Exportações, atrasado desde janeiro, e outros R$ 48 milhões da Lei Kandir, que compensa as perdas dos estados exportadores com a isenção de ICMS. A União não depositou as parcelas dos primeiros quatro meses de 2015.

Joaquim Levy, no entanto, disse que o pedido seria examinado, mas que o governo não poderia atender ao pedido já que também se encontra em um momento delicado, trabalhando em medidas de ajuste fiscal. Após a reunião, o governador não confirmou se haverá ou não parcelamento de salários.

“O ministro também conhece a realidade financeira do Rio Grande, mas nós tínhamos que conversar, dialogar, até porque esses recursos não vieram até hoje para o estado e nós precisamos que eles viessem por que isso faz parte de todo o remanejamento que nós sempre fizemos para tentar saldar as questões da política salarial”, disse Sartori.

No mês passado, o Piratini teve dificuldades para equilibrar as finanças e conseguir pagar os salários dos servidores em dia. Durante mais de um mês, representantes do Executivo deram entrevistas dizendo que os vencimentos poderiam ser parcelados. Diante da possibilidade, entidades e sindicatos entraram na Justiça para tentar garantir o pagamento, o que acabou acontecendo sem necessidade de intervenção judicial.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Notícias indecorosas que vem de Brasília... // coluna de Cláudio Humberto / Diário do Poder


23 DE ABRIL DE 2015




APÓS APROVAR O AFANO, PMDB JOGA PARA PLATEIA
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), criticou com a lei que triplicou o fundo partidário, mas nada fez para impedir a iniciativa do seu próprio partido. Foi Renan quem indicou o autor da proposta, senador Romero Jucá (PMDB-RR), que aliás lhe presta obediência, para ser o relator do Orçamento. A proposta original, já absurda, previa R$ 289,5 milhões, mas o fundo partidário terá R$ 867,5 milhões.
ÚLTIMO A SABER
Com fundo partidário de R$ 867,5 milhões, os políticos já adotaram o financiamento público de campanha sem avisar quem paga a conta.

DE FATO, UM ESCÁRNIO
O ex-presidente do STF Joaquim Barbosa continua sintonizado com a opinião pública: chamou de “escárnio” o valor do fundo partidário.

MATANDO A UNHA
Apesar de declarar-se contra o impeachment, deputados próximos a Eduardo Cunha duvidam que ele vá se empenhar para salvar Dilma.

MARCANDO SOB PRESSÃO
O presidente da Fiesp, Paulo Skaf, passou a quarta-feira percorrendo gabinetes em Brasília, pedindo a aprovação do projeto da terceirização.

CONTINUA MISTÉRIO DO ROUBO DE VIGAS DE 40T NO RIO
Dezessete meses depois, continua um mistério o furto de cinco vigas de 20 toneladas cada uma, no Rio, extraídas da demolição do Elevado da Perimetral, na zona portuária da cidade. O prefeito Eduardo Paes (PMDB) não se manifesta: “nada de novo”, diz a assessoria. A Polícia Civil garante que as buscas “continuam”. As vigas – avaliadas em R$ 14 milhões – mediam 40m de cumprimento e 60cm de espessura.

INACREDITÁVEL
O furto das vigas ocorreu em outubro de 2013, sem testemunhas até hoje. Não apareceu imagem de câmera de segurança, de celular, nada.

PREFEITURA LAVA AS MÃOS
As cinco vigas de 40 toneladas foram furtadas de um terreno cedido pela prefeitura do Rio, que, é claro, lavou as mãos.

A QUEM INTERESSAVA O FURTO?
As vigas furtadas no Rio são feitas de um aço especial capaz de resistir à corrosão por 400 anos, por isso valem ouro na construção civil.

DESARTICULOU GERAL
O governo “jogou a toalha”: estava desarticulado na CCJ da Câmara, na votação da admissibilidade da proposta que limita a 20 o número de ministérios. Ninguém do governo, do PT ou de qualquer partido aliado cabalou votos. Apesar disso, perdeu por pouco: 34x31.

SUS, NÃO
O ministro Armando Monteiro (Desenvolvimento) foi submetido ontem a cateterismo em São Paulo. Evitou o SUS: preferiu o admirado Hospital Sírio Libanês, como preferem dez em cada dez estrelas governistas.

CONFISCO
Deputados Chico Alencar (Psol) e Jandira Feghali (PCdoB) bateram boca na Câmara por causa do aumento do fundo partidário, que pulou para R$ 867,5 milhões. Ela adorou a tunga no bolso do cidadão.


ESQUERDA PUNHOS DE RENDA
“Bolivarianos” idolatram baixarias autoritárias tipo venezuelana, mas na escolha de embaixada para trabalhar, preferem a democrática Europa. O diplomata bolivariano Antonio Simões escolheu Madri, onde há cargo prometido à sua mulher. A Espanha ainda não digeriu sua indicação.

ESPELHO MEU
Esta coluna revelou em 2014 um aluguel painéis eletrônicos, pelo Detran-DF, que é caso de polícia. Além de subutilizados, custam R$ 4,4 milhões anuais. O Tribunal de Contas do DF constatou sobrepreço.

O ‘FANTASMA’ DE KÁTIA
A ministra Kátia Abreu (Agricultura) jura que o “adido agrícola” que ela nomeou para a embaixada do Brasil em Moscou participa “ativamente” dos preparativos para assumir a boquinha. Mas na sua repartição, a superintendência federal de Agricultura na Bahia, jamais foi visto.

FICOU MUDO
O ministro Manoel Dias (Trabalho), que não precisa fazer muito esforço para demonstrar inutilidade da sua repartição, mantém silêncio constrangedor sobre o projeto da terceirização.

SILÊNCIO CÚMPLICE
O Ministério Turismo finge naturalidade diante da revelação da coluna sobre uma servidora graduada, Marcela Dieckmann Jeolas, que ganha R$ 22,4 mil por mês sem trabalhar, segundo colegas, há quase 1 ano.

PENSANDO BEM...
...Dilma, que já está no olho do furacão, preferiu não ver de perto, como deveria, a tragédia do tornado em Xanxerê (SC), inédito no Brasil.


Mujica >>> "Quem gosta de dinheiro tem que ser tirado da política" // BBC


Mujica: 'Quem gosta de dinheiro tem que ser tirado da política'

  • Há 1 hora
Credito: BBC
Ex-presidente disse que uruguaios "não são afeitos à corrupção" e que tráfico de influência é "doença" no Brasil
Prestes a completar 80 anos, o ex-presidente uruguaio José Mujica diz que a corrupção afeta "a todos" na América Latina, mas que "quem gosta muito de dinheiro deveria ser afastado da política".
Em entrevista exclusiva à BBC Mundo, Mujica comentou a corrupção em países como México e Brasil, e afirmou que a "vontade de ter bens materiais" não se relaciona bem com o serviço público.
"Sempre disse aos empresários: se eu souber que pediram alguma propina a vocês e vocês não me avisaram, teremos uma relação péssima. Com essa declaração, não havia abertura para que me oferecessem nada."
"Se misturamos a vontade de ter dinheiro com a política estamos fritos. Quem gosta muito de dinheiro tem que ser tirado da política. É preciso castigar essa pessoa porque ela gosta de dinheiro? Não. Ela tem que ir para o comércio, para a indústria, para onde se multiplica a riqueza", declarou.
Agora senador, Mujica diz que não descartaria voltar à Presidência, caso sua saúde permitisse. Dá a impressão, no entanto, de que não acredita na possibilidade.
"Se eu tivesse o grau de saúde que tenho hoje, não teria nenhum problema. Mas estou quase com 80 anos, não acho que tenho idade adequada de resistir ao vaivém de uma Presidência."
O ex-presidente falou à BBC sentado sob uma árvore diante de sua casa nos arredores de Montevidéu. O ambiente tranquilo e silencioso, que sempre disse valorizar, agora é interrompido ocasionalmente pela chegada de crianças e adolescentes à escola rural que ele inaugurou recentemente do outro lado da rua.
Ele falou sobre narcotráfico e opinou sobre governos de outros países latino-americanos. Entre elogios a sua cadela Manuela ("o integrante mais fiel do meu governo") e comparações entre o mate argentino e o uruguaio, Mujica disse ainda que não considera ocupar um cargo internacional.
"Acredite, para mim seria uma tortura. Não sou afeito ao protocolo, não sou a pessoa mais indicada. Acho que as causas políticas têm muito fôlego e que é preciso incorporar gente mais jovem que nós, que nos supere."

'Doença' brasileira

"Algo doentio acontece na política brasileira", disse o ex-líder uruguaio sobre a cisão entre o governo de Dilma Rousseff, em seu segundo mandato, e o Congresso eleito em 2014. "O Brasil é um país gigantesco e cada Estado tem sua realidade, com partidos locais fortes. Conseguir a maioria parlamentar no Brasil é um macramé (técnica de tecelagem manual) onde pedem uma coisa aqui, outra ali."
Para Mujica, o tráfico de influência é "uma tradição" no país, já que os governos "têm que fazer o impossível para conseguir a maioria parlamentar de alguma maneira".
"Não digo que os fins justificam os meios, quem diz é Maquiavel. O que digo é que isso é uma doença que existe há muito tempo na política brasileira."
Ao mesmo tempo, ele afirma que o poder dos presidentes na democracia representativa é relativo e, por isso, demora para que uma vontade do poder Executivo torne-se realidade. "Não se deve confundir governar com mandar. Existe o papel da persuasão e do convencimento. Um presidente deve se cercar de gente útil e de gente boa."
Mujica diz ainda que é preciso considerar o papel dos agentes externos ao governo na corrupção. "Para que haja corruptos, também deve haver um agente corruptor. Não nos esqueçamos disso."
Quem gosta muito de dinheiro tem que estar na indústria, no comércio. Não na política."
José Mujica, ex-presidente do Uruguai
BBC Mundo

Vizinhos

Durante a entrevista, Mujica evitou fazer críticas frontais aos governos latino-americanos. Questionado sobre seu apoio à administração de Nicolás Maduro, na Venezuela, ele afirmou que "não gosta da existência de presos políticos" no país, mas se posicionou contra possíveis intervenções em meio à crise.
"A Venezuela tem problemas, sim. Mas não vai sair deles a pauladas. Não é apoio, são as evidências. Porque não se ganham 14 eleições sucessivas só usando a força."
Mujica chegou a chamar a presidente argentina Cristina Kirchner de "velha", mas, desta vez, também dedicou-lhe palavras mais suaves. "Não acho que seja uma presidenta maravilhosa, nem acho que seja uma bruxa. É uma mulher que teve de enfrentar todo o machismo arraigado em uma sociedade. Como muitos quiseram passar por cima dela, ela às vezes passa dos limites do outro lado."
Sobre o México, o ex-presidente voltou a afirmar que o tráfico de drogas é um problema maior no país por causa de sua proximidade com os Estados Unidos.
"Os Estados Unidos são o grande mercado consumidor das drogas e os que têm infinito poder aquisitivo e o México é o lugar de trânsito. Isso vem condicionando a vida deles e o México não teve a capacidade de resolver o problema da influência crescente do narcotráfico, não foi só esse governo."
"A combinação da ameaça e do dinheiro destroçou os poderes públicos, que não conseguiram enfrentar isso. Mas eu não estou criticando o México, acho que todos estamos expostos a isso hoje", afirmou, defendendo novamente a lei aprovada em seu governo, que tornou o Uruguai o primeiro país do mundo a regularizar a produção, a venda e o consumo de maconha.
"Curiosamente, eu que não sou neoliberal acho que a melhor fundamentação (para a lei) que encontrei é a de (Milton) Friedman (economista americano). Digo isso raramente, mas não tenho preconceito. Acho que é preciso roubar o mercado deles (dos narcotraficantes)."

Rolling Stones e baseado

José Mujica | Foto: Reuters
Mujica diz que sua cadela de estimação, Manuela, foi "integrante mais fiel" do governo
Centenas de perguntas foram enviadas para a entrevista com José Mujica, que foi transmitida ao vivo pela internet e acompanhada em seis idiomas pela BBC nas redes sociais. O ex-presidente teve que responder, por exemplo, sobre se já o convidaram a fumar maconha desde a descriminalização do consumo.
"Apareceu aqui um rapaz, não sei de que país, com um baseado, e me convidou para fumar. Eu não quis, mas eu também tenho meus vícios. De vez em quando fumo um cigarro comum. E quem vai dizer que o tabaco é saudável? O único vício bom é o amor, o resto são pragas. O problema está em quanto se consome e isso é um problema mental."
Algumas das perguntas mais frequentes eram sobre seu estilo de vida, ao que respondeu que "a humildade é uma filosofia que não pretende impor a ninguém".
"Não posso mudar a cultura do mundo em que vivemos, mas posso viver minha vida e dar minha opinião."
O ex-presidente também não se esquivou de questões mais difíceis – mesmo que fora do âmbito político – como a enviada por um participante argentino: Beatles, Pink Floyd ou Rolling Stones?
"Diga a ele que sou um analfabeto no tema, porque sou 'tangueiro' de alma. Mas feita essa ressalva, prefiro os Rolling Stones."

Louis Prima - Charleston - JazzAndBluesExperience