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domingo, 15 de outubro de 2017

"Os catadores de lixo ideológico " / Guilherme Fiuza

domingo, outubro 15, 2017

Os catadores de lixo ideológico 

- GUILHERME FIUZA

REVISTA ÉPOCA

O maior eleitor de Bolsonaro é Jean Wyllys, e o maior eleitor de Jean Wyllys é Bolsonaro

O Brasil está em perigo. A polêmica sobre o peladão do MAM vai bem, dando oportunidade a toda essa gente sofrida que batalha de sol a sol por um slogan progressista, mas surgiu o alerta: há sinais de que estão começando a desconfiar do debate – ou, mais precisamente, dos debatedores. Isso é grave.

O sobressalto deixou todo o pelotão da narrativa em alerta. Para o caso de acontecer o pior – isto é, a maioria distraída descobrir que a polêmica só serve aos polemistas de plantão – já há alternativas em estudo. Criar um evangelho trans pode ser uma boa. Descobrir algum brucutu que defenda a virgindade antes do casamento seria melhor ainda. Já pensaram? Toda a MPB de mãos dadas contra o celibato das solteiras? Viva a revolução!

Como se sabe, o maior eleitor de Bolsonaro é Jean Wyllys, e o maior eleitor de Jean Wyllys, coincidentemente, é Bolsonaro. Foram feitos um para o outro, e serão felizes para sempre em sua guerra particular cenográfica. Assim vão se formando as parcerias mais profícuas da vida moderna. Para cada Crivella há um Caetano, num sistema perfeito de retroalimentação demagógica que nos deixa boquiabertos com a exuberância e a simetria da criação. Um bocejo retórico de um multiplica imediatamente o rebanho do outro, tornando-os assim seres unidos para a eternidade pela gratidão mútua. Aleluia.
Há diversos outros casais perfeitos na natureza, como o militante do PSOL e o policial boçal, que rezam diariamente a Nossa Senhora das Causas Idiotas pela oportunidade de se encontrarem na rua. Esse amor lacrimogêneo rende audiências incríveis e faz bem a todo mundo que não tem mais o que fazer.

Por uma coincidência antropofágica, a rapaziada da vanguarda de museu é toda de viúvas petistas. Normal. Não pense que é fácil você chegar ao paraíso fantasiado de algoz da burguesia e te tirarem de lá porque seu guru esfolou o povo. Claro que tudo isso foi um golpe da elite invejosa, mas dói. Como defender ladrão não é propriamente um ato revolucionário (embora muitos ainda insistam que seja), você passa a precisar urgentemente de um esquete novo, algo que te permita chegar em casa e se orgulhar de ter chocado a burguesia, abraçado a seu ursinho de pelúcia.

No princípio era o Fome Zero para chocar a elite branca. Após mais de década de rapinagem soterrando o slogan esperto, surge o plano genial: ficar pelado para chocar a elite branca. É claro que a essa altura, no ano da graça de 2017, com tudo o que a TV já mostrou, tudo o que a internet já escancarou, tudo o que já foi exposto inteiro e do avesso para crianças, velhos, meninos, meninas, burgueses, favelados, crentes e ateus, ficar pelado não choca mais ninguém. Droga. Desde a Xuxa e o rebolado na boquinha da garrafa a erotização infantil já está aí, comendo solta, e até já foi temperada, e até a criançada já teve de aprender a escolher e filtrar o grau de sensualidade com que quer conviver. Absolutamente nada de novo no front. Então vamos convidar crianças para ir ao museu tocar num homem nu e ver o que acontece. Deu certo.

A vanguarda do anteontem ia ficar brincando sozinha de chocar ninguém, mas foi salva. A imagem circulou com aquele poder das redes antissociais de transformar o nada em tudo, tipo “menos a Luíza que está no Canadá”, e num instante estava montada a ficção científica sobre arte moderna e pedofilia, ou vice-versa, só importando ver quem grita mais e quem prevalece sobre quem – num universo onde só o que prevalece é o cultivo e a multiplicação dos mesmos e cegos rebanhos. Jair e Jean, amor eterno.

Junte-se tal fenômeno antifenomenal com a tal polêmica de laboratório em torno da “criança viada” e tem-se a ressurreição dos revolucionários lutando contra a censura! Na proa da nave fantasma, a turma daquele movimento obscuro que batalhou pela censura prévia a biografias não autorizadas por razões pecuniárias, que ninguém é de ferro. São os catadores de lixo ideológico: meu reino por um general fardado que me permita tirar do armário a fantasia de oprimido rebelde.

Todo poder advém do queixume e em seu nome deve ser exercido, enquanto os otários não sacarem a malandragem. Cazuza avisou: somos um museu de grandes novidades. Entre e veja, de graça, que o Brasil hipócrita está nu.

A morte da jararaca...

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/elio-gaspari-morte-da-jararaca-nao-e-fava-contada/

Elio Gaspari: 

A morte da jararaca não é fava contada

Postado em 15 de outubro de 2017 às 12:14 pm
Da Folha:
Em julho passado, Lula foi condenado a nove anos de prisão pelo juiz Sergio Moro. Para que ele fique inelegível, a sentença precisa ser confirmada pela 8ª Turma do Tribunal Regional Federal 4, de Porto Alegre, composta por três desembargadores. Se Lula for condenado por unanimidade, ficará inelegível, com poucas chances de ser salvo nos tribunais superiores.
Se o resultado ficar num 2×1, a inelegibilidade estará adiada, dependendo de confirmação pela Seção Criminal do TRF-4, composta por seis desembargadores federais, três dos quais da 8ª Câmara.
Cabeça de juiz não permite prognósticos seguros, mas quem conhece o TRF-4 levanta duas dúvidas. Na primeira, a condenação pode ser anulada. Na segunda, a confirmação da sentença pode demorar, permitindo o registro da candidatura.
A morte da jararaca ainda não é fava contada.

sábado, 14 de outubro de 2017

"Os indivíduos valem pelos seus atos, não pelas suas palavras""

joão pereira coutinho
Escritor português, é doutor em ciência política.
Escreve às terças e às sextas.

Os indivíduos valem pelos seus atos, não pelas suas palavras

Yann Coatsaliou - 23.mai.2017/AFP
O produtor Harvey Weinstein no 70º Festival de Cannes, na França
O produtor Harvey Weinstein no 70º Festival de Cannes, na França
NOVA YORK - É um conselho elementar: os indivíduos valem pelos seus atos, não pelas suas palavras. Qualquer um é capaz de uma retórica competente. E seria possível escolher dois ou três discursos políticos de grandes criminosos da história –discursos sobre a liberdade, a igualdade, a fraternidade– sem revelar o essencial sobre as suas condutas miseráveis.
Mas os atos, sobretudo quando praticados anonimamente, são a verdadeira revelação de caráter.
Um caso exemplar é o de Harvey Weinstein. Cheguei a Nova York alguns dias atrás. Pensava eu que as notícias seriam Donald Trump de manhã à noite. Erro. Trump desapareceu dos radares e a mídia só fala de Weinstein.
Apresentações: Harvey Weinstein é um dos mais conhecidos e reconhecidos produtores de cinema atuais. Sem falar do resto: democrata "convicto" e um ilustre apoiante e doador do Partido Democrata.
Problema: Weinstein terá cometido uma série de assédios sexuais contra atrizes e outro pessoal que trabalhava para a sua produtora –a poderosa Miramax. Angelina Jolie ou Mira Sorvino estão na longa lista das alegadas vítimas. Sabemos que Weinstein celebrou 8 acordos extrajudiciais para esconder os crimes. Há também acusações de violação– três, para sermos exatos.
E a "The New Yorker", dois dias atrás, liberou uma gravação onde Weinstein mostra os seus dotes "predatórios" com uma modelo italiana.
Perante isso, que fez o nosso Harvey? Escreveu uma carta para o "The New York Times", jornal que iniciou as denúncias, e que deveria ser estudada como uma obra-prima da hipocrisia progressista.
Para começar, Harvey Weinstein afirma que lamenta os seus comportamentos; mas atira com as culpas para a contra-cultura das décadas de 1960 e 1970, onde se formou e deformou. Os assédios, no fundo, não foram dele; foram dos "hippies" que lhe ensinaram o mantra "faça amor, não guerra", mesmo que esse amor envolva uma certa dose de ameaças e brutalidades.
Mas o momento esplendoroso da carta acontece quando o produtor promete, perante as massas "liberais", que reforçará o seu combate à National Rifle Association –e que doará 5 milhões de dólares para apoiar mulheres diretoras.
O "The Wall Street Journal", em editorial, resumiu com propriedade o raciocínio que existe na cabeça de Weinstein: "Se eu relembrar ao ilustre público que apoio as causas certas, serei perdoado pelos meus pecadilhos. Donald Trump não tem salvação quando agarra as mulheres pela genitália; mas eu, combatendo a cultura das armas e batalhando pela igualdade dos sexos, terei a absolvição dos otários."
Infelizmente para Weinstein, os otários não parecem disponíveis para semelhante bondade. Mesmo os otários –como Matt Damon, por exemplo– acusados de terem protegido o produtor no passado. Como? Pressionando jornalistas para não publicarem as denúncias.
Confesso: não sei se as acusações são verdadeiras ou falsas. E, aqui entre nós, não tenho uma curiosidade mórbida pelo assunto. Deixemos para a justiça o que é da justiça.
Mas também confesso que existe alguma ironia quando vemos um moralista devorado em público pela fúria de outros moralistas. 

"“Resta aos juízes prender ladrão de galinha”

13/10/2017

“Resta aos juízes prender ladrão de galinha”

POR FREDERICO VASCONCELOS
O texto abaixo foi enviado a amigos pelo juiz federal Roberto Wanderley Nogueira, do Recife:***
Magistrado há 35 longos e bem vividos anos, forjado na dor de uma experiência profissional sem nódoas ou grandes desacertos, temente a Deus Todo Poderoso, reconhecido comumente pelos pequeninos, minha jurisprudência sempre foi preferencialmente aquela que eu mesmo produzo à luz da Constituição Federal e das leis.
Jamais me deixei impressionar pela jurisprudência de Tribunais constituídos politicamente, na alcova da vida de tanta gente que simplesmente não presta. Há exceções, é claro, mas elas não chegam a sequer perturbar o sistema de injustiças e desigualdades prevalecentes entre nós.
No entanto, o Supremo Tribunal Federal, para cujo acesso basta a boa vontade da autoridade de plantão no Palácio do Planalto e uma sabatina pró-forma no Senado Federal, é a cúpula do sistema do qual fazemos parte, todos nós, magistrados. Isso é trágico, porque muito frequentemente temos de dar lição aos nossos superiores por meio de nossos veredictos, simplesmente apontando as contradições desse sistema que eles encabeçam, não raro sem mérito e/ou competência algumas, conquanto eleitos pelas conveniências da política de momento, também frequentemente associadas ao clientelismo de Estado.
É o que devemos fazer, esperando as bordoadas próprias da espécie de um ambiente concorrencial e emulativo que opõe colegas contra colegas no pano de fundo das nossas próprias carreiras.
O carreirismo, aliás, é um fenômeno estimulado pelo sistema político para nos fazer definhar como categoria social. Quem for independente não sobe. Quem abrir mão de sua própria vocação na verticalidade da estrutura funcional da Organização Judiciária a que pertence, outros nem isso, caso dos incluídos no sistema pelo “quinto constitucional” e das composições do próprio STF, ficam disponíveis para evoluir, menos neste último caso, pois as investiduras são para cargos isolados (sem perspectiva de progressão).
Eis o dilema histórico, existencial e corporativo da magistratura nacional, sobre o qual a iniqüidade faz a festa, sentindo-se segura em face da atmosfera de impunidade que sobrepaira aos poderosos. Mas, sobra implacabilidade aos “ladrões de galinha”, cujo aprisionamento é praticamente o único poder que resta de fato aos juízes do Brasil.
E viva o carnaval!

Natureza bem tratada devolve benefícios à cidade

Natureza em foco no planejamento urbano de três metrópoles brasileiras http://p.dw.com/p/2jNW1

MEIO AMBIENTE

Natureza em foco no planejamento urbano de três metrópoles brasileiras

Com ajuda de projeto internacional financiado pelo governo alemão, Campinas, Belo Horizonte e Londrina pretendem evitar crises hídricas, alimentar a população sem agredir o meio ambiente e otimizar uso do solo.
Vista aérea de Belo Horizonte
Belo Horizonte: Interact-Bio pretende fortalecer biodiversidade e ecossistemas essenciais para assegurar serviços urbanos
O Brasil tem a maior biodiversidade do planeta, com pelo menos 20% das espécies existentes e 30% das florestas tropicais do mundo. Mas na hora de integrar políticas de conservação e sustentabilidade ao planejamento urbano, o país está longe de ser exemplo. Um novo projeto liderado pela associação internacional Iclei - Governos Locais pela Sustentabilidade e financiando pela Alemanha busca reverter essa lógica e colocar a natureza em foco em três regiões metropolitanas brasileiras.
Campinas (SP), Belo Horizonte (MG) e Londrina (PR) foram escolhidas para participar do projeto, chamado Interact-Bio e que deve trazer investimentos, ações estratégicas para o meio ambiente, trocas de experiências e capacitações técnicas para as regiões. Com isso, a meta é não simplesmente preservar a natureza, mas também resolver problemas urbanos bem específicos com ajuda dos recursos naturais.
O projeto, com duração de quatro anos, conta com investimento de 6 milhões de euros, provenientes do Ministério Federal Alemão do Meio Ambiente, Proteção da Natureza, Construção e Segurança Nuclear (BMUB). Além do Brasil, a iniciativa será simultaneamente realizada em três regiões da Índia e três da Tanzânia, outros países conhecidos por sua biodiversidade.
Crise hídrica
Campinas, escolhida como região modelo no Brasil, foi palco da crise hídrica que atingiu o Sudeste em 2014, com impactos econômicos e de fornecimento para a população, que teve que recorrer ao chamado volume morto dos reservatórios. Causada principalmente pela escassez de chuvas, a situação também foi agravada por componentes locais.
Um levantamento da SOS Mata Atlântica constatou na época que apenas 21,5% das áreas do Sistema Cantareira continham cobertura vegetal. A falta de vegetação causou erosão e assoreamento, que reduzem a capacidade do sistema de armazenar água, complicando ainda mais o problema, segundo o secretário municipal do Verde, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Campinas, Rogério Menezes.
A cidade está agora trabalhando para religar fragmentos de áreas verdes em seu território por corredores ecológicos, recuperando áreas de preservação permanente, de nascentes e matas ciliares. O Plano Municipal do Verde de Campinas prevê, até 2026, recuperar 280 quilômetros de corredores ecológicos e 1.590 hectares de Áreas de Preservação Permanente (APPs).
Para ajudar a resolver problemas maiores, como o da gestão hídrica, Campinas quer que todos os municípios da região também insiram a biodiversidade no planejamento regional de longo prazo quando realizarem seus planos diretores. O Interact-Bio vai ajudar a articular essa interação.
"Aqui a gente sabe de quantas mudas precisamos, que áreas são essas, se são públicas ou privadas. E pedimos compensações ambientais de empresas na aprovação de novos empreendimentos. Mas não é só Campinas que precisa fazer isso, são 20 cidades na região–, afirma Menezes. "Hoje há uma articulação de planejamento muito frágil dentro das regiões metropolitanas. Os municípios cresceram e foram emendando um no outro."
Segurança alimentar 
No caso de Belo Horizonte, o Interact-Bio contribuirá com a busca de soluções para a segurança alimentar da população. O fornecimento de alimentos na capital de Minas Gerais depende de municípios ao redor, onde o tecido urbano está avançando sobre áreas destinadas à agricultura, que por sua vez avançam sobre áreas naturais.
 
Assistir ao vídeo05:44

A importância da natureza no planejamento de cidades

"A gente precisa descobrir como dar conta de alimentar a população de uma maneira que não seja agressiva ao meio ambiente", diz a analista de políticas públicas da Secretaria de Meio Ambiente de Belo Horizonte e uma das coordenadoras do projeto na cidade, Ana Maria Caetano.
Uma das soluções para locais onde a natureza está ameaçada pode ser, por exemplo, um processo de urbanização planejada, com a implementação de hortas familiares e proteção de cursos d'água e matas. Outros problemas são como preservar a biodiversidade no espaço urbano e lidar com os efeitos das mudanças climáticas, que têm provocado o aumento de ondas de calor.
"O projeto vai alinhavar uma série de ideias e ações que já existem, cada uma na sua caixinha", englobando outras cidades na região como Betim, conta Ana Maria. A terceira metrópole brasileira escolhida pelo projeto, Londrina, planeja tratar de questões relativas ao uso do solo com o Interact-Bio.
Governos locais fortalecidos
De acordo com Sophia Picarelli, coordenadora do projeto no Iclei – associação que conecta mais de 1.500 governo de cidades e estados em mais de 100 países –, o objetivo é promover um olhar mais aguçado dos governos locais para o potencial da gestão local da biodiversidade. Com isso, a ideia é ajudar o Brasil a alcançar as Metas de Aichi para a Biodiversidade, adotadas por mais de 190 países em 2010. 
A conversa vai ser fomentada entre diferentes níveis de governo para que as metas globais sejam traduzidas para questões práticas. Em um momento em que o governo federal tem sido criticado por ambientalistas, a iniciativa representa uma oportunidade de explorar melhor o potencial dos governos locais.
"É onde ocorrem atribuições que esperamos que se mantenham quanto ao licenciamento ambiental, uso e ocupação do solo, medidas de fiscalização, monitoramento e a potencial conectividade de fragmentos de mata. Esse protagonismo deve receber cada vez mais força", afirma Picarelli.

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

" Estão batendo sua carteira", José Nêumanne


José Nêumanne: Estão batendo sua carteira

Congresso muda eleição e perdoa dívidas rápido como se furta e discreto como se foge

Publicado no Blog do Nêumanne
De quarta-feira 4 a sexta-feira 6 de outubro de 2017. Anote em sua agenda com o próprio sangue esses três dias nos quais os congressistas — que se proclamam seus representantes na Câmara dos Deputados e no Senado da República — bateram sua carteira esvaziada pela crise e perdoaram as próprias dívidas à União. Tudo foi “rápido como se furta” e “discreto como se foge”. Houve tumulto, mas tudo saiu como manda o figurino do cinismo mais deslavado: Suas Excrescências insolentíssimas não precisaram sequer votar pessoalmente, comprometendo seus nomes nada limpos na falcatrua. A votação foi simbólica, ou seja, os líderes votaram pelas bancadas e o resto da manada escondeu-se debaixo da saia ampla e generosa da República, essa prostituta sem lingerie nem pudor.
Tudo começou com uma mentira. Sob a égide de um cartola mal afamado e sempre disposto a dar a própria cara para assumir o furto coletivo — Vicente (imagine!) Cândido —, proclamado relator de uma reforma política que, há algum tempo, seu grupo, o dito, mas sempre incapaz de honrar a própria denominação, Partido dos Trabalhadores (PT), vem pregando. A arenga foi usada na tentativa de aplacar o povo que se reuniu, empunhou faixas e bandeiras e protestou nas ruas das cidades brasileiras com população significativa, contra os governos delinquentes e o Estado complacente. O papo de Dilma Rousseff, a porta-voz do socialismo cínico, era convocar uma Constituinte exclusiva para fazer uma reforma política que abrigasse propostas caras a seus militantes e milicianos, como financiamento público de campanha e censura à imprensa rebelde e aos institutos de pesquisa que não fizessem o jogo dos que se dizem progressistas, mas são apenas pró eles mesmos.
Deposta madame, assumiu em seu lugar o vice, que não apenas foi eleito com ela, mas na prática a elegeu com os votos da máquina partidária fundada para derrubar a ditadura e, depois, afundada no lamaçal dos novos sócios; Estes, o PT e a cambada de ladrões que a ele se associaram na depena completa dos cofres da viúva, aplicaram o golpe da venda do bonde. Sob o pretexto, avalizado por Gilmar Mendes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), de que a proibição do financiamento de campanhas por empresas, que não votam, impede que seja pago o alto custo da democracia, assumiram a defesa do financiamento público para a farra privada. Ou seja: eles gastam e nós, os tontos da patuleia, pagamos.
Assim foi feito. Após intensas e acaloradas tentativas derrotadas de impor um saque de R$ 3,7 bilhões para garantir campanhas à tripa forra com champanhota, votações simbólicas garantiram a criação de um Fundo para Financiamento de Campanha, extirpando a falseta do uso abusivo e amoral da palavra Democracia na denominação. A toque de caixa, senadores e deputados aprovaram a punga. O mostrengo nasceu sem teto, mas com piso. E, segundo notícia desta semana publicada neste Estadão, com um rombo inicial de R$ 300 milhões. Olhe-se no espelho mais próximo e perceba quem vai tapar esse rombo.
No mesmo tríduo e sob a égide do mesmo bezerro de ouro, Senado e Câmara, revezando-se no furto, providenciaram escândalo de dimensões similares ao aprovarem um chamado Refis no qual tentaram perdoar as dívidas com o Fisco de parlamentares suspeitos de corrupção. A pressão popular impediu que se fizesse a ignomínia. Mas, como ninguém é de ferro, aproveitaram a iniciativa do governo esmoler no comando da União para perdoar sonegadores que não acrescentavam à denominação degradante a de corrupto, que, aliás, cada vez mais se beneficia da complacência de políticos antes tidos como dignos e juízes assumidos como chicaneiros.
O Refis é uma excrescência assumida como norma há vários governos e sob vários regimes nesta nossa República, que não respeita quem paga em dia nem incentiva quem se dispõe a honrar noturna e diuturnamente, como diria a Rainha do Não Sabe, Dilma Rousseff. Ou seja, a grande maioria da população brasileira, que não se humilha ao ser tratada como otária, só para não ter o desprazer de ser perseguida pelos publicanos de plantão em qualquer gestão ou indigestão. “Devo, não nego, não preciso pagar” — este é o lema sempre renovado da cambada que segue o rastro do deputado Newton Cardoso Júnior, que, ao palmilhar a trilha do pápi, o ex-governador Newtão Cardoso, reformula de vez o velho “deitado” que assegurava: “quem sai aos seus não degenera”. Para não comprometer a herança familiar, o bom Newtinho exercita o “quem sai aos seus não regenera”. Os degenerados ocupam o Éden dos que se endividam não pagando os impostos de praxe, porque sabem que sempre serão indultados.
O Refis é uma vergonha que se renova sempre que o Estado gasta demais, o que é uma rotina, e precisa socorrer-se de instrumentos como a repatriação de recursos exportados sem a devida autorização das autoridades monetárias, o que já constitui uma efeméride. Cada vez que isso acontece o governo faz uma campanha subliminar que pode ser traduzida como um alerta: “Não seja tolo, não pague imposto”. Mas à tradição desavergonhada implantada por seus antecessores, inclusive sua ex-parça dona Dilma, o dr. Michel Miguel, jurisconsulto renomado e especialista respeitável em Direito Constitucional, extrapolou ao permitir que os associados ao clube dos que se endividam porque passaram a ter poder de não pagar mesmo não se incomodem mais com a pecha de sonegadores. O dr. Meirelles inspirou o Refis para reduzir o rombo do déficit público do ano em R$ 12 bilhões, contentou-se com meros R$ 9 bilhões até descobrir, tadinho, que, se pegar R$ 4 milhões, deve dar graças a Deus e a Santo Expedito, o padroeiro das causas impossíveis. Newtinho, o rebento de quem pápi Newtão deve orgulhar-se muito, permitiu a radicalização do slogan sub-reptício dos sonegadores empoderados: “Só um completo idiota paga imposto. Sai dessa, imbecil!”
Mas, por incrível que pareça, o episódio do Congresso punguista ainda é mais grave, pois desmoraliza o Estado de Direito no que tem de mais sagrado: a soberania popular por meio do voto. As campanhas bilionárias — a última das quais teve as duas chapas concorrentes comprometidas e maculadas com o financiamento majoritariamente feito por dois tipos de crime, ambos abomináveis, a caixa 2 e a propina — interferem na sagrada vontade política do eleitor. Os democratas de verdade, aqueles que têm vergonha na cara, condição de brasilidade na Constituição de Capistrano de Abreu, o colega de seminário de padre Cícero Romão Batista, não procuram fórmulas de atender ao gasto excessivo de partidos e candidatos. Esforçam-se, ao contrário, para reduzir drasticamente os custos absurdos, abusivos e amorais do reino de marafonas dos marqueteiros políticos. O financiamento público é tão escuso — talvez até mais — do que a submissão dos palanques à propina e ao caixa 2. Pois transfere o custo pesado do furto e do marketing para o bolso de quem arca com todas as despesas do Estado estroina. O cidadão financia a farra dos candidatos nos quais não pretende votar e também a de quem sufragará. Em ambos os casos é um vilipêndio, que não merece misericórdia nem passiva aceitação.
O mais grave de tudo é que quem faz da Constituição uma Bíblia Sagrada não atenta para o óbvio: mudanças no sistema eleitoral não podem ser feitas por maiorias simples no Congresso. Nem sequer por maiorias de três quintos ou dois terços do total dos que só fingem representar o povo. Na verdade, só o próprio povo, em plebiscito, pode reformar graves assuntos como o sistema proporcional e os métodos de financiamento de campanha. Ao não dar um sinal de que vai exigir isso dos congressistas, com os quais vive arengando à toa por motivos insignificantes, o colegiado pleno do Supremo Tribunal Federal (STF) dá mostras inequívocas e permanentes de que não é um poder popular, mas discricionário. Ou seja, serve não aos cidadãos, aos quais não deve a indicação de cada membro, mas aos grupos que comandam o Executivo, cujo chefe indica, e do Legislativo, cuja casta sempre aprova cada um, transformando-se na única Corte do amém na história da democracia em qualquer canto do planeta em que ela funcione, seja bem, seja precariamente.

O Brasil está indeciso. Não sabe onde colocar a corda para enrolar no pescoço ...

sexta-feira, outubro 13, 2017

A direita se transforma no último refúgio dos canalhas - 

REINALDO AZEVEDO

FOLHA DE SP - 13/10

É conhecida a frase do inglês Samuel Johnson (1709-1784): "O patriotismo é o último refúgio de um canalha". Acabou distorcida. Referia-se a uma situação específica da política do seu tempo. Não hostilizava ou renegava os "patriotas", então uma corrente política. Criticava vigaristas que passaram a se abrigar sob tal manto, pervertendo ideias que considerava virtuosas. Nestes dias, o liberal brasileiro está obrigado a dizer: "A direita é o último refúgio de um canalha".


Nesta quarta (11), fiz o que não faço quase nunca. Acompanhei um tantinho, nas redes sociais, as reações de grupos organizados "de direita" à sessão do STF que decidia se medidas cautelares impostas pelo Judiciário a parlamentares devem ou não ser submetidas à respectiva Casa Legislativa. "As direitas" não estavam entendendo nada.

Os ditos direitistas, excetuando-se raras ilhas de compreensão, esmeravam-se em vomitar ignorâncias contra "todos os políticos". Sentem-se moralmente superiores a seus antípodas por atacar a política ela mesma, em toda a sua extensão. O mal dos adversários estaria na seletividade. Entendi. Os esquerdistas se orgulham de olhar no olho de suas vítimas antes de atirar. Justiça que enxerga! A direita de que falo atira antes de olhar. Justiça cega!

Vi antipetistas fanáticos, anticomunistas patológicos e convictos fascistoides de direita a aplaudir o voto de Luís Roberto Barroso. Junto com a esquerda. Aquele cheiro de sangue no ar. O que a etimologia ensina sobre "canalha"? Resposta: "cachorrada". É que o doutor lavou o seu relativismo constitucional com o linchamento do senador Aécio Neves, que não era nem citado naquela ADI. Seu voto ia apertando todos os "botões quentes" da polêmica, para empregar uma expressão que Umberto Eco cunhou muito antes de conhecermos o bueiro do capeta das redes sociais.

Sem vergonha na toga e da toga, o doutor começou atacando o foro especial, que não estava em julgamento. A direita salivava. Depois apelou à metáfora dos "peixes pequenos", sempre punidos, e dos "graúdos", sempre impunes. Mais baba. Poderia ser o "Sermão de Santo Antônio aos Peixes", de Padre Vieira. Era só o "Proselitismo Esquerdopata de Barroso aos Tolos". Aí resolveu condenar Aécio, que nem réu é ainda.

Dinheiro, ensinou, tem de passar pelo banco, ou a corrupção está comprovada. E, se é assim, pode-se rasgar a Constituição em nome da honestidade. É precisamente o que faz a esquerda mundo afora. Ele nem teve a delicadeza de dizer qual foi a contrapartida –ou promessa de– oferecida pelo senador a Joesley Batista, o que poderia caracterizar corrupção passiva. A cachorrada se afogava de prazer na gosma peçonhenta.

A ficha das "direitas" não caiu nem quando, negando a sua condição de "ativista judicial", Barroso afirmou ser contrário ao STF legislador e interventor, mas só nas matérias de natureza constitucional. E, mesmo nesse caso, deixou claro, dá-se o direito de legislar sobre "direitos de minoria" e "proteção às regras da democracia". Não por acaso, é o gênio da raça que resolveu fazer uma interpretação extensiva de um habeas corpus e, pimba!, decidiu "legalizar" o aborto até o terceiro mês de gestação. Não ficou claro se o assassinato do feto, que não pode correr nem se defender, é um "direito de minoria" ou uma "regra da democracia".

Por 6 a 5, depois das adaptações, decidiu o STF que a Justiça pode, sim, aplicar a parlamentares as medidas cautelares do Artigo 319 do Código de Processo Penal, mas tudo o que afeta o mandato deve ser submetido à Casa Legislativa a que pertence o punido por prevenção. Das aberrações, a menor. A confusão, agora, vai se estender a Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores.

A direita dos humores pegajosos, constatou minha mulher, ainda agora se afoga em secreções de puro rancor. Queria mais inconstitucionalidade. Que o Brasil sobreviva ao patriotismo dos canalhas!

Charge de Chico Caruso...

HUMOR

A charge de Chico Caruso

Charge (Foto: Chico Caruso)