18/08/2012
às 18:00 \ Livros & Filmes“Newsroom”, a nova série da HBO, mostra a imprensa não como é — mas como deveria ser. Mesmo assim, é muito boa
Artigo de Isabela Boscov, publicado na edição de VEJA que está saindo hoje das bancas
IDEALISTA TEIMOSO
Em “The West Wing”, Aaron Sorkin tentou consertar o governo. Em “The Newsroom”, seu alvo é o jornalismo
Foi à base de uma postura evasiva que Will McAvoy (Jeff Daniels) se tornou o segundo âncora de maior audiência da TV a cabo. Mas, em um debate com estudantes de jornalismo, ele afinal mostra os dentes que sempre escondeu. “Na sua opinião, o que faz dos Estados Unidos a maior nação do planeta?”, pergunta uma aluna. “Oportunidade”, “diversidade”, “liberdade”, respondem monotonamente os outros debatedores. Will tenta sair pela tangente, mas por fim contesta: “E quem diz que é isso que somos?”, replica, enfileirando uma enxurrada de estatísticas negativas.
A plateia de inocentes está consternada, e Will está libertado: falou das coisas como as coisas são. E, por sua vez, Aaron Sorkin, o criador de The Newsroom, em exibição pela HBO, já se plantou assim com os dois pés em um território que é em grande parte de sua invenção — o da América como ela deveria ser.
Durante os anos em que esteve à frente da série The West Wing, Sorkin conjurou uma Casa Branca em que o presidente e seus assessores erravam, sim, mas por serem humanos, nunca por serem venais — um ideal da governança norteada pela moralidade e pelo bem maior. Agora, emNewsroom, ele quer demonstrar à imprensa tudo o que ela poderia ser.
Nem todo mundo, claro, acha a América de Sorkin ideal ou quer viver nela – nem que seja pelo fato de seus personagens, sempre que abrem a boca, recitarem editoriais à velocidade de 100 palavras por minuto (a artilharia verbal de Sorkin foi um dos pontos altos também de A Rede Social, que lhe deu o Oscar de roteiro).
Há umas tantas contradições, ainda, das quais Sorkin passa ao largo. A mais vital delas é que o noticiário com que Will e sua produtora e ex-namorada Mackenzie (Emily Mortimer) querem informar de maneira responsável o telespectador tem de se desprender de ditames vulgares como audiência e receita publicitária – ao passo que, no mundo real, esses são os mecanismos com que os veículos garantem sua independência de associações com governos, lobbies e facções.
Outro ponto a mencionar é que não são os âncoras brandos como Will que hoje dominam a audiência americana – são os da variedade truculenta, como os da Fox News, que Sorkin, aliás, adora desancar em sua série.
Feitas essas ressalvas, contudo, Newsroom é ainda assim Aaron Sorkin no seu melhor: personagens carismáticos (Alison Pill é um achado como a novata da equipe), diálogos ultra-articulados e deliciosos – e, sim, a crença teimosa de seu criador de que o mundo em geral, e os Estados Unidos em particular, sempre poderiam ser melhores.
De uma coisa ele não pode se queixar: só em um país que dedica respeito devocional à liberdade de expressão ele poderia fazer as invectivas que faz, e dar nome aos bois como dá, com amparo da lei e paz de espírito.
Tags: A Rede Social, Aaron Sorkin, Alison Pill, Casa Branca, Emily Mortimer,Estados Unidos, HBO, Jeff Daniels, liberdade de imprensa, Oscar, The Newsroom, The West Wing
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