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domingo, 27 de novembro de 2016

Brasília em transe / Zuenir Ventura

Brasília em transe

Pense em um deputado, senador, ministro, ex-ministro, presidente, ex-presidente, e ele pode estar nessa ‘blacklist’. A sensação é de que quase ninguém está a salvo
Crise política (Foto: Arquivo Google)
Zuenir Ventura, O Globo
Está no seu DNA, é crônico. Brasília não consegue viver sem crise. Mal se livra de uma, surge outra. O alívio às vezes é temporário, como aconteceu esta semana, quando parecia superado o episódio que envolveu o ministro Geddel Vieira, responsável pela renúncia de seu colega da Cultura, que o acusou de pressioná-lo para atender a interesses escusos.
Apesar da grave denúncia, Geddel continuou merecendo a confiança do presidente e ainda recebeu um manifesto de apoio de líderes da base aliada no Congresso. Um final feliz, até que se tornou público o depoimento de Marcelo Calero à PF acusando o presidente Temer e o ministro Eliseu Padilha de o terem pressionado e “enquadrado” em favor do amigo e auxiliar de confiança.
Para piorar, desconfiado de que Calero tenha gravado a conversa, o presidente teria pedido a Geddel sua saída, o que acabou acontecendo ontem. Na carta de demissão, ele afirma que tomou a decisão “diante da dimensão das interpretações dadas e do sofrimento dos meus familiares”. Antes de conhecer o desfecho, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, se precipitara: “Esse Calero enlouqueceu”.
Agora, a melhor maneira de saber quem de fato enlouqueceu é descobrir o que contém a suposta gravação. Por algum tempo, o governo e a classe política puderam dormir mais tranquilos ao saber que ficou suspensa até segunda-feira a assinatura do acordo de colaboração dos 76 executivos da Odebrecht com a Operação Lava-Jato.
Chamada de “mãe de todas as delações” ou de “operação do fim do mundo”, essa delação citaria mais de cem políticos como tendo recebido algum agrado em forma de propina da “mãe de todas as empreiteiras”. Pense em um deputado, senador, ministro, ex-ministro, presidente, expresidente, e ele pode estar nessa blacklist.
A sensação é de que ninguém, ou quase ninguém, está a salvo. Daí a mobilização dessa espécie de frente ampla parlamentar para combater os que combatem a corrupção, comandada no Senado por seu presidente, Renan Calheiros (12 inquéritos no STF), e pelo líder do governo, Romero Jucá (oito inquéritos no STF), o tal que já defendeu um “pacto para estancar a sangria”.
A ofensiva se esconde atrás de vários disfarces, como a emenda que, na prática, segundo o procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima, visa a “anistiar a corrupção”, atingindo diretamente a Lava-Jato. Ele afirma que essas e outras iniciativas têm como objetivo criar um “salvo-conduto geral para corruptos de todo o país”.
Em poucas palavras, o alvo dessa escandalosa articulação tem um símbolo de quatro letras: Moro. Um atentado ao seu trabalho pode deixar não apenas Brasília, mas o Brasil em transe
Zuenir Ventura é jornalista

sábado, 26 de novembro de 2016

Charge do Paixão no blog de Josias de Souza

Charge do Paixão 



– Charge do Paixão, via Gazeta do Povo

A realidade do Brasil é intranquilizante, !


J.R. Guzzo: A justiça negada

Uma juíza vendeu sentença a um traficante. Outra manteve presa ilegalmente uma menina de 15 anos, que foi brutalmente torturada pelos demais presos. Que punição receberam?

Por: Victor Irajá  

Publicado na edição impressa de VEJA
O caso da juíza Olga Regina de Souza Santiago, do Tribunal de Justiça da Bahia, é de dar medo em qualquer brasileiro que imagina estar sob a proteção da lei. A juíza é a personagem central de uma história de negação absoluta da justiça — não se trata de injustiça, exatamente, mas de recusa do Estado em submeter um de seus agentes às leis que valem para o resto da população, prática que costuma ser encontrada apenas nos países mais totalitários do mundo. O que houve? Houve que a doutora Olga, em pleno exercício de sua função, recebeu dinheiro de um traficante de drogas colombiano como pagamento de propina para deixá-lo fora da cadeia — mas não foi, nem será, punida por isso. A juíza vinha sendo investigada desde o distante 2007; agora, após quase dez anos de “processo disciplinar” e com base em todas as provas possíveis, de gravações de conversas a comprovantes de transferência bancária, o Conselho Nacional de Justiça declarou, enfim, que ela é culpada de corrupção passiva e outros crimes — e como única punição para isso deve se aposentar, com vencimentos integrais. O apavorante é que não houve nenhum favor especial para a doutora Olga, longe disso; apenas se aplicou o que a Justiça brasileira, desde 2005, considera ser a lei. É ou não para assustar?
Vamos falar as coisas como elas são: uma criança de 7 anos, ao ouvir uma história como essa, sabe que o final está errado. Como a Justiça pode decidir que alguém cometeu um crime e, exatamente ao mesmo tempo, não mandar para a cadeia quem praticou o crime? Por mais respeito que se tenha pelos argumentos que tentam explicar tecnicamente a situação, sobretudo quando apresentados pelos maiores cérebros jurídicos do país, está acima da moral comum entender que possa haver algo correto na recusa de aplicar as leis criminais a um cidadão pelo simples fato de que ele é um juiz de direito. Pois foi precisamente isso que aconteceu. Qualquer outra pessoa, tendo feito o que a juíza Olga fez, seria condenada a até doze anos de prisão, pena agravada de um terço, pelo artigo 317 do Código Penal brasileiro; mas o máximo de castigo que se aplica a ela é que, sendo criminosa, deixe de ser juíza ao mesmo tempo. E mais: continuará recebendo o salário inteiro, pelo resto da vida (no seu caso, não se sabe exatamente qual será o custo disso para o contribuinte, que não cometeu crime algum, mas pouco não vai ser; já podem ir contando com uns 40 000 reais por mês, pelo menos). O pior de tudo é que não se trata de uma exceção; essa é a regra, e, se a regra é essa, está claro que o aparelho da Justiça brasileira parou de funcionar como um sistema lógico. Não pode existir lógica quando o CNJ, o órgão de controle mais elevado do Poder Judiciário, aceita tomar decisões dementes. O resto, para 99% dos seres humanos normais, é pura tapeação — de novo, com todo o respeito.
Quantos magistrados brasileiros estariam dispostos a admitir que existe alguma coisa insuportavelmente errada num sistema em que acontecem fatos como esse? O que temos aqui é uma tragédia permanente. Quase um mês antes da decisão sobre Olga Santiago, o mesmo CNJ resolveu que outra juíza, Clarice Maria de Andrade, do Pará, deve ficar dois anos afastada das funções por ter se recusado a atender, também em 2007, a um pedido para retirar de uma cela do interior do estado, onde estava presa ilegalmente, uma adolescente com 15 anos de idade. Durante mais de vinte dias, a menina foi brutalmente torturada pelos demais presos, até, enfim, ser retirada dali — e, por causa disso, a juíza Clarice recebeu a aposentadoria compulsória em 2010. Achou que era uma injustiça. Recorreu da decisão, foi desculpada pelo Supremo Tribunal Federal e agora recebe do CNJ a determinação de ficar afastada por dois anos — ou seja, nem aposentada ela acabou sendo. Mas ainda assim não está bom: a doutora Clarice vai recorrer da decisão, pois não aceita nem mesmo esse curto afastamento do cargo. A Associação dos Magistrados Brasileiros manifestou-se publicamente a seu favor. É essa a realidade. Simplesmente não há, para os juízes, sentença contrária, pois mesmo quando são condenados a decisão, na prática, é a favor — e ainda assim eles recorrem. O balanço final é um horror. De 2005 para cá, o CNJ examinou 100 casos de magistrados e todo tipo de acusação: corrupção, principalmente, sob a forma de venda de sentenças, mas também homicídio qualificado, extorsão, peculato, abuso sexual, e por aí afora. Cerca de 30% dos casos acabaram em absolvição; nos restantes, a punição mais grave foi a aposentadoria compulsória ou, então, a aplicação de penas como “disponibilidade do cargo”, “censura”, ou “advertência”. Há um ou outro caso, raríssimo, de prisão, quando o processo corre fora do nível administrativo — e isso é tudo. O contribuinte gasta dezenas de milhões com essas aposentadorias. Não há um cálculo exato de quanto, mas é caro — em nenhum estado brasileiro a média salarial dos magistrados é inferior a 30 000 reais por mês, e nos estados que pagam mais ela passa dos 50 000 mensais. É só fazer as contas.
É aí, nos ganhos dos juízes — além de procuradores e promotores de Justiça —, que está outra aberração em estado integral. A Justiça brasileira gasta cerca de 80 bilhões de reais por ano, 90% dos quais vão direto para a folha de pagamento, que, pelas últimas contas oficiais, sustenta mais de 450 000 funcionários. A qualidade do serviço que presta é bem conhecida por todos. O gasto, porém, é um dos maiores do planeta. Cada um dos 17 500 juízes brasileiros custa em média 46 000 reais por mês, ou mais de meio milhão por ano — em que outra atividade o custo médio do trabalho chega a alturas parecidas? Para os desembargadores à frente de tribunais de Justiça, essa média passa dos 60 000 por mês, e ainda assim estamos longe do pior. É comum, nas Justiças estaduais e na federal, salários mensais de 100 000, ou mais — o senador Renan Calheiros, que quer examinar melhor o assunto, cita muito o valor de 170 000, e há casos comprovados de 200 000 ou mais. Como pode dar certo uma coisa dessas? Nossos juízes, que se dizem cada vez mais preocupados com a justiça social, parecem não perceber que estão sendo beneficiados por uma das situações de concentração de renda mais espetaculares do mundo — resultado da distribuição pura, simples e direta de dinheiro público a uma categoria de funcionários do Estado. Faz sentido, numa sociedade como a do Brasil?
Não faz, mas é proibido tocar no assunto. Quando se lembram casos como os das juízas Olga ou Clarice, a reação imediata dos defensores do sistema é perguntar: “Mas por que tocar nessas histórias justo agora? O que há por trás disso? A quem interessa o assunto?”. Da mesma maneira, criticar as “dez medidas anticorrupção” tor­nou-se uma blasfêmia. Espalha-se a ideia de que ações como a de Renan em relação aos salários, e as de outros políticos que pensam numa lei de responsabilidades com sanções mais severas para o abuso de autoridade, não valem nada, porque são feitas com más intenções; o que eles propõem pode até ser correto, mas seus objetivos finais são suspeitos. É tudo uma conspiração para “abafar a Lava-Jato”. É culpa de Lula e da esquerda. É culpa do governo e da direita, e por aí se vai. Mas o fato é que dois mais dois são quatro — e, se o senador diz que são quatro, paciência; a conta não passa a ser cinco só porque é ele quem está dizendo que são quatro. Não é essa a realidade que os militantes do Judiciário intocável aceitam; querem tudo exatamente como está. O resultado é, e continuará sendo, a situação aqui descrita.

Delatores ameaçados ! É pouco ou quer mais...? / Revista IstoÈ

Delatores ameaçados

As pressões para que testemunhas desmintam seus depoimentos incluem ameaças de morte sob a mira de revólveres e promessas de incendiar moradias com a família em casa
Germano Oliveira, Istoé
Entrevista da advogada Beatriz Catta Preta ao Jornal Nacional (Foto: Reprodução / TV Globo)
Beatriz Catta Preta (Foto: Reprodução / TV Globo)
A advogada Beatriz Catta Preta abre a porta de casa localizada na rua Hungria, bairro Jardim Europa, São Paulo, e se depara com o doleiro Lúcio Bolonha Funaro no sofá da sala brincando com seus dois filhos. Ela estremece. Funaro saca uma arma, aponta para sua cabeça e desfia um rosário de ameaças. Para não realizá-las, impõe a Catta Pretta uma condição: que convença seu cliente, o empresário Julio Camargo, ex-consultor da Toyo Setal, a não sustentar denúncias contra seu aliado, o então presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha. Em negociação de delação premiada, no início de 2015, Camargo havia se comprometido a dizer aos investigadores da Lava Jato que Cunha recebeu US$ 5 milhões de propinas na venda de navios-sondas da Samsung para a Petrobras em 2008.

Funaro, que já havia sido defendido por Catta Preta no episódio do mensalão, tinha acesso à residência da advogada, mas àquela altura já era uma espécie de capanga de Cunha. A ameaça surtiu efeito. Num primeiro momento, sob a orientação de Catta Preta, Camargo livrou a cara do deputado. Só em maio deste ano, Camargo decidiu revelar os subornos recebidos por Cunha e forneceu os detalhes mais sórdidos do pagamento de propina em contas na Suíça. Iniciava-se ali o processo de perda do mandato de Cunha e da conseqüente prisão pela Lava Jato.
As criminosas ameaças de Funaro a Catta Preta, até então uma jurista responsável por defender dezenas de delatores da Lava Jato, levaram a advogada a abandonar os clientes e a praticamente encerrar a profissão. Mas desnudou uma faceta obscura do mundo das delações premiadas.
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Beatriz Catta Preta (Foto: Reprodução / TV Globo)

" Sairíamos da crise para o caos. E caberia indagar: o que vem depois do caos? Eu não tenho resposta para essa pergunta." / Percival Puggina

GOVERNO TEMER, ESTABILIDADE EM AREIA MOVEDIÇA

por Percival Puggina. Artigo publicado em 
 Nunca tive maior entusiasmo com a pessoa de Michel Temer. Suas boas credenciais de mestre de Direito Constitucional juntavam-se, como contrapeso, às de vice de Dilma Rousseff e presidente do PMDB. Dado que parte expressiva da bancada do partido que presidia estava enrolada nas patifarias do governo petista, parecia pouco provável que ele exercesse os dois postos mergulhado nas trevas da insapiência. No entanto, Temer era o substituto legítimo, constitucional, de uma presidente que exercera o governo do fim do mundo. Com mão de ferro, Dilma conduzira a nação a um prejuízo de um trilhão de reais, que hoje falta em todos os orçamentos. Levara milhões ao desemprego, dera à irresponsabilidade fiscal status de benfeitoria e plantara, afanosamente, as sementes da recessão. Já estava a presidente sobre o telhado quando o TCU a flagrou em crime de responsabilidade, proporcionando as razões técnicas para o processo de impeachment. Um governo com Temer era, então, a consequência constitucional e a alternativa possível. Mas... e se esse governo também se desestabilizar?
 Sairíamos da crise para o caos. E caberia indagar: o que vem depois do caos? Eu não tenho resposta para essa pergunta. Nem disponho daquela obstinação que, historicamente, permite à esquerda jogar ao mar as montanhas que a realidade e os fatos proporcionam. Eles continuam confiando em Maduro, em Fidel e Raúl, e chamando bandidos de heróis. Por não saber o que vem depois do caos e por não querer cenário venezuelano em meu país, leio a realidade institucional brasileira destes dias conforme a descrevo em sequência. Eu a classifico segundo os quatro grandes temas abordados a seguir.
1º - A Frente Parlamentar do Crime
 Constitui a mais numerosa dentre as bancadas e blocos em operação no Congresso Nacional. É suprapartidária, formada pela banda podre do PT, PMDB, PP, PSDB e de outras legendas menores criadas nos últimos anos. Cuida exclusivamente dos interesses de seus membros e, de modo muito especial, nestes dias, de livrar o próprio couro. Estava na base do governo Dilma e, em boa parte, mudou-se para o governo Temer. Pelo número de membros, como veremos adiante, é indispensável à formação da maioria sem a qual o governo não aprova suas diretrizes e suas políticas de gestão. A bancada petista só faz discurso e jogo de cena contra as articulações que visam a obstar a Lava Jato e as 10 Medidas contra a corrupção porque os muitos lambuzados que habitam a base do governo Temer estão cuidando disso por ela.
2º - A situação do governo 
 Agora, a nação precisa de estabilidade política e o governo de pelo menos 342 votos firmes em sua base de apoio. A base tem, em tese, 412 votos, mas 56 já não votaram a PEC 241. Se considerarmos que a oposição tem 101 votos, que 56 governistas não são fiéis, salta aos olhos que o governo não pode perder os votos que tem na Frente Parlamentar do Crime. Eis aí, gigantesca e escandalosa, a tragédia moral que acometeu nossas instituições. Não se governa sem os bandidos! Felizmente, a área financeira do governo ganhou grande autonomia e está em boas mãos.
3º - A atitude do STF perante a existência e a longa vida da Frente Parlamentar do Crime
 Boa parte desse laborioso colegiado político do crime tem existência antiga e já estaria contado na população carcerária do país se o STF atribuísse a devida importância aos deveres que lhe correspondem perante o saneamento moral de seus vizinhos na Praça dos Três Poderes. É incalculável o custo político e financeiro da longa dormição dos processos lá na última trincheira da impunidade. Como vimos acima, o atual problema não existiria, ou ao menos não teria as proporções que está adquirindo se a bancada do crime tivesse sido enfrentada com agilidade antes, ou se o for agora.
4º - A urgente reforma institucional
 Entre os muitos motivos que levam a desejar uma reforma institucional para adoção do parlamentarismo, se incluem certos objetivos que esse sistema viabiliza: a) separar a chefia de Estado da chefia de governo, de modo que só as funções de governo sejam partidárias; b) despartidarizar a administração e a gestão das estatais; c) permitir a rápida e não traumática substituição dos governos que percam a confiança social e o apoio político.
Nada disso, porém, vai apresentar os resultados desejados enquanto o contingente de criminosos com protagonismo na cena política se mantiver nas atuais proporções e sendo, em função disso, parte expressiva do poder de decisão e das bases de apoio. A assustadora criminalidade das ruas chegou ao Congresso Nacional. Ou vice-versa.
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"Temer, refém de si mesmo" / Ruy Fabiano

Temer, refém de si mesmo

Temer (Foto: Marcos Alves)Michel Temer (Foto: Marcos Alves)
O presidente Michel Temer está na berlinda – não só ele, mas sobretudo a visão pragmática que concebeu para tornar seu curto mandato (que pode encurtar ainda mais) uma gestão de resultados. Concebeu uma equipe à imagem e semelhança do Congresso.
Se lá não há santos – e não há -, Temer entendeu que em seu entorno também não deve haver. É o que os fatos indicam.
Geddel Vieira Lima, mais um ministro que sai no rastro de denúncias de corrupção, é a cara da maioria do Congresso. E é ali que Temer pretende inspirar confiança, em troca de votos.
A lógica é simples: o governo precisa aprovar com urgência temas polêmicos, como a PEC do teto dos gastos públicos. Já a aprovou com folga na Câmara e deve aprová-la no Senado. Há ainda na fila as reformas previdenciária, tributária e trabalhista.
É improvável que as efetue, não ao menos na completude necessária. Mas se já obtiver uma meia-sola, terá feito muita coisa.
Para tanto, é o que se depreende de sua conduta, precisa cativar o colegiado parlamentar, transmitindo-lhe segurança, neste momento em que a Lava Jato está nos calcanhares da maioria. Se colocasse como líder no Congresso alguém de perfil diferenciado – isto é, de ficha limpa -, correria o risco de intimidar seus parceiros.
Isso explica a insistência com o senador Romero Jucá, demitido do ministério do Planejamento, mas reabilitado como líder do governo no Congresso. Em tese, se alguém não tem condições morais para ser ministro, não pode ser líder. Em tese.
Na prática, e dentro da visão pragmática que Temer concebeu, pode e deve, desde que tenha trânsito junto à maioria e competência para fisgar seu apoio. Quanto a isso, Jucá, Geddel, Elizeu Padilha, Moreira Franco, entre outros, são indiscutivelmente talentosos.
Tal opção mostra a essa plateia que o presidente é solidário às suas aflições, razão pela qual retardou ao máximo a saída de Geddel e tentou negociar com o ministro denunciante, Marcelo Calero, uma reconciliação discreta e harmoniosa.
Não deu certo – e por uma razão simples: Calero é de outra turma – Sérgio Cabral, Eduardo Paes, a esquerda fluminense. E cumpria outra missão: detonar Temer. Não era um aliado, mas um infiltrado, egresso da prefeitura carioca, íntima de Lula e Dilma.
A ocasião se apresentou e ele apertou o gatilho. Geddel supôs estar falando com um companheiro de viagem, mas se enganou – e demorou para perceber. Temer idem.
Calero saiu atirando, jogando para a plateia a quem Temer deu as costas: a opinião pública. Muniu-se de provas, chegando ao extremo de gravar uma audiência com o presidente, para detonar não apenas o ministro infrator, mas, sobretudo, o seu chefe.
Deu certo. Temer sai chamuscado do episódio e perde pontos até perante a parcela da população que torcia pelo êxito de seu mandato-tampão – não por ele, mas pela necessidade de o país alcançar alguma estabilidade até as próximas eleições.
Esse contingente hoje se reduziu. O PT vibrou com a performance de Calero e avisa que pedirá o impeachment de Temer, o que dá consistência à tese de que o ministro denunciante não agiu por impulso corretivo, mas também por pragmatismo.
É possível que, em meio a mais essa decepção – a que se soma a do comportamento tíbio do Planalto diante das tentativas parlamentares de se auto-anistiarem dos crimes de caixa dois e propinas -, o PT possa encontrar eco para além de sua hoje esquálida militância. A saída de Temer, avisam os movimentos de rua, constará das manifestações agendadas para o próximo dia 4.
Temer, ao que parece, não entendeu que a principal demanda da sociedade, mais que o próprio saneamento da economia, é a ética. Dispõe-se ao sacrifício, até porque é inevitável, mas não sob a batuta de quem lesou ou age em favor dos que lesaram o país.
O PT foi deposto por corrupção. Ter por sucessor o partido que a ele se associou ao longo de todo o processo de rapina ao erário, o PMDB, já estava difícil de deglutir. Cabia a esse partido, em tais circunstâncias, caprichar na conduta, como o fez, por exemplo, Itamar Franco, após o impeachment de Collor.
Itamar afastou do governo o seu principal colaborador, o então chefe da Casa Civil, Henrique Hargreaves, tão logo este foi denunciado, condicionando sua volta a que provasse sua inocência.
Hargreaves provou e voltou. Temer, em nenhum dos casos análogos, agiu com presteza; em nenhum fez profissão de fé na luta contra a corrupção. Em recente entrevista, chegou a considerar uma eventual prisão de Lula um desserviço ao país, pelo potencial de desestabilização que supõe sinalizar.
Com isso, mostrou que teme algo, que é refém dos que o precederam no cargo. Enfim, tornou-se refém de si mesmo.
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"Esta é uma crise que tem dono"... / José Casado

Esta é uma crise que tem dono

Na gênese do problema está um presidente avesso a conflitos, cujo maior problema são os amigos. Eles são muitos, especialmente no Congresso
José Casado, O Globo
O nome dele é Michel Temer. Ela não começou e nem deve terminar na demissão do sexto ministro, em seis meses. Sua origem está na aversão do presidente ao conflito. Aos 75 anos, Temer já viu quase tudo na política contemporânea: golpes, contragolpes, ditadura, eleições diretas, indiretas e dois impedimentos presidenciais.
Multidão (Foto: Arquivo Google)
Sobreviveu, preservando-se no limite da equidistância. A exceção foi no último impeachment. Com apoio de amigos como Geddel Vieira Lima, Eliseu Padilha, Moreira Franco e Eduardo Cunha, comandou o roteiro da cerimônia de adeus de Dilma Rousseff, tornando-se usufrutuário da cadeira presidencial.
Anteontem, ao revisar a nota oficial do governo sobre a demissão e o depoimento à polícia do ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, Temer fez questão de destacar uma frase: “O presidente buscou arbitrar conflitos entre os ministros e órgãos da Cultura.”
Nessa dúzia de palavras transparece algum apreço pela taramelaria, porque, no caso, não havia resquício de conflito de interesse público “entre os ministros e órgãos” a exigir arbitragem do presidente da República. Existia, sim, um confronto entre as prioridades pecuniárias de um incorporador imobiliário privado — ocasionalmente, com o botão de ministro da Secretaria de Governo na lapela — e as de um organismo federal que há 80 anos é responsável por uma política de Estado, a preservação do patrimônio cultural.
A demissão do ministro pode encerrar o episódio e o inquérito policial decorrente. Durante seis meses, o ex-deputado baiano, com o sorriso pleno das gordas bochechas que distendiam a vasta papada branca sobre o colarinho, predominou nas fotografias e nos bastidores do governo do “querido amigo”, como qualificou na carta ao presidente.
A despedida de Geddel, porém, não liquida a crise, porque o nome dela é Temer. Na gênese está um presidente avesso a conflitos, cujo maior problema são os amigos. Eles são muitos, especialmente no Congresso, onde alguns reivindicam seu discreto apoio em causa própria — como demonstram as opacas negociações conduzidas pelo presidente da Câmara sobre a anistia ao caixa dois, simultâneas às dirigidas pelo presidente do Senado sobre a permissão à repatriação de dinheiro de origem questionável pelos parentes de políticos.
O caso Geddel sugere que a Temer muito custará conservar os amigos, porque governa com eles — e o poder do “querido amigo” presidente nem sempre será suficiente para contentá-los.
José Casado é jornalista
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DE QUE LADO VOCÊ ESTÁ: POLÍCIA OU BANDIDO?

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Ato falho de Lula: tríplex é meu

"Os gigolôs do bem" / Rodrigo Constantino

quinta-feira, novembro 24, 2016

Os gigolôs do bem - 

RODRIGO CONSTANTINO

GAZETA DO POVO - PR - 24/11
O mundo é mesmo repleto de pessoas que acumulam verdadeiras fortunas e concentram absurdo poder apenas em cima de suas fraquezas declaradas

“A força mais enérgica não chega perto da energia com que alguns defendem suas fraquezas”, disse com sua fina ironia Karl Kraus. O mundo é mesmo repleto de pessoas que acumulam verdadeiras fortunas e concentram absurdo poder apenas em cima de suas fraquezas declaradas. Ou explorando a miséria alheia, claro, que se tornou um gigantesco e lucrativo negócio.

É aquilo que Guilherme Fiuza tem chamado, em suas colunas, de “império do oprimido”. E esse é justamente o título que deu ao seu novo livro, um romance que prova que a arte, muitas vezes, imita a vida. Trata-se de uma história fascinante de uma jovem bonita e rica que rompe o relacionamento com os pais assim que um partido de esquerda chega ao poder.

Ela decide que quer participar dessa revolução progressista. Numa idade em que é normal detonar os pais mesmo, Luana resolve radicalizar: abandona a vida de princesa e vai vagar pelo mundo, até parar numa ONG voltada para a assistência social. Lá se encanta com a ideologia socialista, e galga degraus até chegar ao topo do poder, no epicentro do novo governo.

"Bandidos gananciosos exploram o discurso altruísta para chegar ao poder e por lá permanecer "

Fiuza desenvolve essa história com maestria no ambiente da era lulopetista. Os ilustres personagens estão todos lá, facilmente identificáveis: Lula, Dirceu, Marcos Valério, Marcelo Freixo, Palocci, Márcio Thomas Bastos, JEC etc. A quadrilha chega ao poder com um discurso populista e encanta a população, com a ajuda inestimável dos artistas e “intelectuais” formadores de opinião, muitos sob recebimento de mesadas, como prostitutas.

Inúmeros fatos assombrosos dos últimos anos entram na narrativa, de uma forma muito criativa. Estão lá o mensalão, o petrolão, o assassinato de Celso Daniel, a casa das prostitutas em Brasília, os black blocs, o Mais Médicos, a tentativa de censurar a imprensa e muito mais. Tudo sob o controle indireto do Guia, o intocável, santificado pelas massas, identificado como o homem do povo que chegara para fazer justiça, acabar com a exploração centenária pelas elites.

Tudo balela, naturalmente. E Fiuza entra dentro da mente desses vilões, com a liberdade que só um livro de ficção permite, mostrando como o poder rapidamente sobe à cabeça ou, mais precisamente, como bandidos gananciosos exploram o discurso altruísta para chegar ao poder e por lá permanecer, ficando milionários no processo.

A forma pela qual uma jovem rica e mimada acaba sendo seduzida pelos “progressistas” também é retratada com perfeição. Sufocada pelas regras morais burguesas, pela hipocrisia que enxerga no mundo real quando suas fantasias infantis desmoronam, Luana era o alvo perfeito dos “gigolôs da bondade”, que conseguem colocá-la contra o próprio pai. O encanto pelo professor esquerdista descolado ajuda bastante.

“Governo de uma gente cada vez mais poderosa, rica e coitada. É o crime perfeito”, constata um dos personagens. Basta ver como mesmo depois de toda a podridão que veio à tona essa turma continua bancando a vítima para verificar como o fenômeno é impressionante. E foi um crime impune por muitos anos, com a conivência de muita gente, o silêncio cúmplice de vários, que surfavam na onda do mesmo populismo.
Fiuza dissecou o período mais nefasto da história de nossa democracia, e fez isso de uma forma muito divertida. O livro, com final surpreendente que não posso revelar, daria um baita filme, destino que outras obras do autor já tiveram. É leitura simplesmente imperdível, uma espécie de doce vingança de alguém que tentava alertar desde o início, quase sozinho, sobre o sonambulismo da população brasileira, vivendo sob o “império do oprimido” e aplaudindo a própria desgraça, reverenciando aquele que era seu maior algoz. E que, para revolta de muitos, continua solto, longe da prisão, seu destino merecido.

Rodrigo Constantino, economista e jornalista, é presidente do Conselho do Instituto Liberal.

Charge de Chico Caruso

A charge de Chico Caruso

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