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domingo, 23 de junho de 2013

Revoltados e atrasados /// Guilherme Fiuza


Revoltados e atrasados

(ÉPOCA – edição 787)

   O melhor diagnóstico até agora sobre as manifestações de rua veio do ministro Gilberto Carvalho, da Secretaria Geral da Presidência. Ele disse que as revoltas são estaduais e municipais. Não deixa de ser um alívio. Quem quiser ficar a salvo da confusão, já sabe: refugie-se no Brasil federal. Nada de ficar vagando pelo Brasil estadual e municipal, porque esse anda muito perigoso, cheio de gente insatisfeita e nervosa. No Brasil federal não, está tudo tranquilo.
   Por sorte, Dilma Rousseff também está no Brasil federal, portanto a salvo do tumulto. Desse lugar calmo, sem culpa, a presidente disse que o que os manifestantes querem é o que o governo quer. São praticamente almas gêmeas. “O meu governo está ouvindo essas vozes pela mudança. Está empenhado e comprometido com a transformação social”, informou Dilma. Disse que passeata é uma coisa normal, que ela mesma já fez muito. Parecia prestes a botar uma mochila nas costas e ir para a Avenida Paulista fazer a transformação social.
  E mostrou sua visão de estadista: “Essa mensagem direta das ruas contempla o valor intrínseco da democracia”. Às vezes a presidente exagera na erudição. Vai acabar deixando Luís de Camões encabulado. Ela já explicara que o combate à inflação “é um valor em si”, demonstrando conhecimento profundo sobre as coisas da vida e seus valores intrínsecos: “Essa mensagem direta das ruas é de repúdio à corrupção e ao uso indevido de dinheiro público”, acrescentou Dilma, praticamente uma porta-voz dos revoltosos contra tudo isso que aí está.
   Olhando para o circo, só há uma conclusão possível: os revoltosos – os do passe livre, os dos 20 centavos, os do Ocupem Wall Street sucursal brazuca, os do turismo cívico e os do civismo vândalo – merecem Dilma Rousseff. Repetindo: os revoltosos merecem Dilma Rousseff. Ou mais que isso: são cúmplices dela, pois estavam sentadinhos em casa enquanto a grande líder mulher brasileira perpetrava suas obras completas de explosão das finanças públicas – a céu aberto, para quem quisesse ver. Agora a inflação está doendo no bolso? Tarde demais, meus queridos justiceiros.
   Essa “presidenta” que vive lá na calmaria do Brasil federal com seus 40 ministérios (contando com o do marketing, de João Santana, o único essencial) presidiu, entre outras festas, a distribuição de dinheiro público para o milagre da multiplicação de estádios da Copa. Em São Paulo, numa jogada comandada por Lula e seus amigos empreiteiros (que ele representa no exterior), o histórico Morumbi foi mandado para escanteio. Em seu lugar surgiu o Itaquerão, novinho em folha, presente do ex-presidente ao seu clube do coração. Um mimo de 1 bilhão de reais. Sabem de onde vem esse dinheiro, bravos manifestantes?
   Exato: dos vossos bolsos. E onde estavam vocês quando nos esgoelávamos aqui da imprensa sobre essa gastança populista (protegida por índices lunáticos de aprovação da “presidenta”), avisando que a conta ia chegar? Vocês não lêem jornal?
   Onde estavam vocês quando a CPI do Cachoeira – com revelações da imprensa – estourou o esquema da Delta, a empreiteira campeã de obras superfaturadas do PAC? Vocês sabiam que mais esse ralo de dinheiro público do governo popular ficou impune, porque a CPI foi asfixiada por Dilma e sua turma? Por que vocês não saíram às ruas para gritar contra esse golpe?
   Onde estavam vocês quando a “faxineira” asfixiou a CPI do Dnit e a investigação do maior foco parasitário de um governo que – no seu primeiro ano! – teve que demitir sete ministros suspeitos? Vocês não desconfiaram de nada? Vocês não leram que o dinheiro de vocês estava escoando para ONGs de fachada em convênios fantasmas? Vocês não viram essa praga espalhada por vários ministérios do governo popular, apesar de a imprensa esfregar o escândalo na cara do Brasil? Vocês não notaram que a tecnologia do mensalão (privatização partidária do dinheiro público) nunca saiu de cena, de Dirceu a Rosemary?
   Vocês chegaram tarde, meus caros revolucionários. Quando o bolso dói é porque o estrago nas contas públicas já é grande. Bem, antes tarde do que nunca. Mas prestem atenção: entendam logo o que vocês estão fazendo nas ruas, senão suas passeatas em breve estarão no mesmo museu dos escândalos que vocês não viram.